Marco Aurélio Cunha o provocador do Morumbi

São Paulo – Quando tinha 12 anos, na metade dos anos 60, Marco Aurélio Cunha não titubeava ao responder à pergunta ?O que você vai ser quando crescer??. ?Médico do São Paulo?, dizia. Pois o baixinho de 1,56 metro conseguiu mais.

Mesmo sem acertar um chute, virou uma espécie de ídolo pela forma como defende o clube. E, talvez o mais importante para os torcedores, como provoca os rivais – o gostinho é especial quando se trata de corintianos. Ah, sim, ele conseguiu ser médico do São Paulo. E superintendente de futebol. Hoje sonha com a presidência, atualmente ocupada por seu ex-sogro, Juvenal Juvêncio.

Marco Aurélio acredita ter assumido o papel de porta-voz de um clube perseguido. ?Comecei defendendo jogadores que eram chamados de pipoqueiros. Gente como Lugano e Luís Fabiano, um absurdo! A torcida não podia desmoralizar nossos jogadores?, diz. Mas o que ele considera seu grande teste como escudeiro tricolor ocorreu no triste dia 27 de outubro de 2004. No segundo tempo do jogo São Paulo x São Caetano, o zagueiro Serginho, do time adversário, cai no gramado, vítima de parada cardiorrespiratória; morre uma hora depois, no hospital. ?Havia dúvidas, suspeitas de negligência, e eu, como médico do clube, tomei a frente. Mostrei que o São Paulo não tinha culpa e que não havia nada de errado com as ambulâncias do Morumbi. Isso me deu força junto aos torcedores, que aumentou quando passei a defender o clube da imprensa?, diz.

Esse ?defender da imprensa?, para Marco Aurélio, faz sentido: ele vê parcialidade no jornalismo esportivo. ?A crônica é corintiana. A gente se cansa de ganhar deles e os jornais não falam da nossa vitória, mas da derrota deles. Isso me deixava louco. E nossos dirigentes sempre tiveram um estilo olímpico, de não responder.? Hoje, Marco Aurélio se diz satisfeito ao ver que seu estilo fez seguidores. ?Fico feliz quando vejo o ex-presidente Marcelo Portugal Gouvêa bem mais solto na televisão, também brincando com os corintianos?, afirma.

Há quem veja no seu jeito bocudo um paralelo com Antonio Roque Citadini, ex-vice presidente do Corinthians. Ambos têm em comum o fato de assumirem a torcida contra rivais. ?A semelhança, se existir, pára por aí. Eu entendo de futebol e o Citadini não entende nada. É só ver os jogadores que ele contratou para o Corinthians. Ele fala mal da MSI, mas também contratou cada bonde?, diz Marco Aurélio, que recebe pronta resposta do corintiano. ?Nem sei do que ele está falando. Quando eu era dirigente do Corinthians, a gente ganhava do São Paulo cedo, à tarde e à noite. O Marco Aurélio é como Salieri, o grande pianista do mundo até o surgimento de Mozart. Ele viveu a vida inteira com inveja de Mozart, e foi infeliz?, afirma Citadini.

Além das comparações com Citadini, uma crítica que tira do sério o são-paulino é a de que ele dispensa tratamento paternalista aos jogadores. Marco Aurélio não nega que gosta de apoiar os atletas, mas garante que há cobranças. ?Um filho de família rica vai à escola de medicina, estuda seis anos e é cobrado quando está próximo dos 30 anos. Já um jogador de futebol, que não tem a mesma formação e estrutura familiar, passa a receber cobranças fortíssimas com 20, 21 anos. É um exagero que pode acabar com a carreira?, explica.

Para exemplificar as cobranças, Cunha cita dois casos. Um de sucesso e outro nem tanto. O primeiro é o de Souza, a quem o dirigente disse que era hora de parar de comprar tênis e carro para investir em algo sólido. ?Não quero te ver na entrada do CT pedindo camisa do São Paulo para vender, como acontece com muito jogador bom que não cuida da vida e fica mal de dinheiro? teria sido mais ou menos a frase de Marco Aurélio para o atleta. Há três meses, Souza comprou um apartamento para a mãe, em Maceió. Já o caso em que o dirigente fracassou ocorreu com o atacante Rico, em Porto Alegre. ?O São Paulo tinha emprestado o Rico ao Grêmio. Ele não aproveitou a chance e foi parar nos aspirantes. Eu estava passeando e o encontrei à noite, em um restaurante, quando ele devia estar concentrado. Fui à mesa dele, dei um abraço e falei que havia desistido dele. Ele entendeu o recado?.

Pode-se discutir se são justas ou não as críticas que fazem a Marco Aurélio Cunha, por falar e aparecer demais. Mas uma coisa é certa: dificilmente alguém poderá, um dia, acusá-lo de dissimulação.

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