Londres
– Aúltima temporada não rendeu um único troféu na Inglaterra ou na Europa. Mas o Manchester United pôde se dar ao luxo de não perder o sono. Apesar de ter visto o rival Arsenal fazer a dobradinha Premier League/Copa da Inglaterra e de ter caído nas semifinais da Liga dos Campeões, o clube mais rico do mundo olhou os adversários de cima no quesito financeiro: lucrou US$ 53,3 milhões na temporada 2001/2002, valor 48% maior do que o registrado em 2000/2001, quando o Manchester foi campeão inglês pela última vez.Tudo isso num momento em que, com raras exceções, os clubes na Europa e no mundo esqueceram o significado da palavra lucro e passam por um período de austeridade forçada ou de cortes nos gastos. O que o Manchester tem e os outros não vai além do fato de a Premier League ser um campeonato com o valor dos direitos de transmissão de TV chegando à estratosfera. Trata-se de um caso crônico de eficiência e teimosia por parte de um clube bastante habituado às tempestades.
A história começou em 1878, quando o clube foi fundado sob o nome de Newton Heath como uma opção de passatempo para os funcionários de uma ferrovia. Em 1902, a equipe só não faliu graças à intervenção do magnata da cerveja John Henry Davies, que impôs um novo nome: Manchester United.
Mesmo com dinheiro o clube não se transformou numa potência: bancou o ioiô entre a primeira e a segunda divisões. O clube só voltaria a ver um troféu de expressão em 1948, quando ganhou a Copa da Inglaterra.
Em crise, o clube teve de investir ainda mais nas divisões de base e em jogadores desconhecidos e em 1945 contratou como treinador Matt Busby, um obscuro ex-atleta escocês que acabaria se tornando um divisor de águas na história do futebol inglês. Busby, um ex-combatente, desmilitarizou o relacionamento entre técnico e jogador, com seu estilo mais paternal, formou um time jovem que gostava de jogar bonito, apelido de “As belezas de Busby”.
Com “elas”, o Manchester foi campeão em 1952, 56 e 57. Neste último ano, tornou-se o primeiro time inglês a participar da recém-criada Copa Européia (hoje Liga dos Campeões), desafiando a indiferença dos outros clubes do país em relação à competição e chegando às semifinais.
Em 1958, quando muitos torcedores já esperavam ver alguns dos jogadores ajudando à Inglaterra na Copa da Suécia, veio o capítulo mais triste da história do Manchester: o avião que trazia o time de Belgrado teve um problema na decolagem em Munique e caiu, matando oito das 11 “belezas de Busby”.
O técnico, que sobreviveu ao acidente, teve forças para montar um outro time, que em 1968 encantou o mundo ao se tornar campeão europeu, comandado pelo norte-irlandês George Best e o legendário Bobby Charlton, outro sobrevivente de Munique.
A concorrência, porém, não parou. Os anos seguintes foram marcados pela ascensão do Liverpool e a decadência do Manchester, que ficou 26 anos sem conquistar o título nacional, tendo sido rebaixado para a segunda divisão nas temporadas de 1973/74. A poeira começou a ser sacudida em 1986, com a chegada de outro escocês, Alex Ferguson.
Centralizador, Ferguson adotou métodos contrários a Busby. Ele baniu do clube jogadores indisciplinados e foi buscar talentos como o francês Eric Cantona e o irlandês Roy Keane para comandar um grupo de jovens atletas, entre eles um tímido e franzino adolescente chamado David Beckham. O resto da história o mundo já sabe: sete títulos ingleses nas últimas 11 temporadas, três Copas da Inglaterra e os troféus da Liga dos Campeões e do Mundial Interclubes de 1999. E um modelo de perseverança e eficiência a ser seguido.
Uma marca de muito sucesso
Muita torcida, pouco dinheiro. Até o início da década de 90, o Manchester se encaixava perfeitamente na descrição e foi preciso que uma revolução fora das quatro linhas ocorresse para o clube se transformar na verdadeira corporação que hoje é. O primeiro movimento veio em 1991, quando lançou ações na bolsa de valores e levantou dinheiro para reformar seu estádio, o Old Trafford.
No ano seguinte, a criação da Premier League e a injeção de dinheiro proporcionada pela aquisição dos direitos de transmissão pela pela rede de TV a cabo Sky (US$ 408 milhões), deram ao clube mais suporte financeiro para trabalhar a marca Manchester. Uma mega-operação de merchandising, junto com o sucesso em campo, deu origem a todo tipo de produtos relacionados ao clube.
Com a transmissão dos jogos da Premier League para mais de 170 países, os gols de Beckham & Cia. são acompanhados por milhões. As excursões à Ásia arrastam multidões aos aeroportos e estádios. Um levantamento feito pelo clube estima em 40 milhões o número de torcedores do Manchester. Sozinho, o clube movimenta mais dinheiro que os campeonatos português e escocês, por exemplo.