Foto: Arquivo/Tribuna |
Hoje, o estádio do Paraná Clube passa por reformas e quer voltar a ser palco de grandes partidas. continua após a publicidade |
25 de junho de 1950. Domingo frio e cinzento em Curitiba, precedido de um sábado chuvoso. Naquele típico dia de inverno, porém, a cidade vivia um alvoroço nunca visto anteriormente. A capital de um Paraná agrícola e conservador seria sede da maior competição do futebol mundial.
Inaugurado três anos antes, o Durival de Britto foi palco de Espanha 3 x 1 Estados Unidos, jogo válido pelo grupo B da Copa do Mundo. No mesmo local, Suécia e Paraguai empatariam em 2 x 2 na quinta-feira, dia 29. A Copa do Mundo não envolvia multidões de torcedores, batalhões de jornalistas ou milhões de doláres, mas ainda assim a pacata Curitiba efervesceu durante aqueles quatro dias.
A construção do então chamado "Colosso de Vila Capanema" foi fundamental para a vinda da Copa de 50 para Curitiba. Com capacidade para 18 mil pessoas, a imponente praça do Ferroviário era na época o terceiro maior estádio particular do Brasil – atrás apenas de São Januário, do Vasco, e do Parque Antártica, do Palmeiras. Para o Mundial, arquibancadas metálicas foram instaladas no gol de fundos, onde antes ficava a famosa concha acústica. A imprensa da época classificaria de "espetacular" o aspecto da Vila lotada nos jogos do Mundial.
Conta a lenda que o então governador do Paraná, Moysés Lupion, pagou 1 milhão de cruzeiros para que Curitiba sediasse o Mundial – algo como R$ 3 milhões hoje em dia. "Fizeram uma campanha enorme para trazer a Copa para cá. E a Vila era o estádio mais moderno do sul do Brasil, não poderia ficar de fora", recorda João Maria Barbosa, o "Barbosinha", ex-jogador do Água Verde e do Ferroviário e atualmente coordenador do museu do Paraná Clube, que foi um dos 9 mil pagantes de Espanha x EUA.
Ele recorda que muita gente veio do interior do Paraná e de Santa Catarina para presenciar o espetáculo. E quem não podia pagar subia nos vagões dos trens parados no pátio de manobras da Rede Ferroviária Federal – como o jornalista Luiz Geraldo Mazza. O problema era quando o maquinista manobrava a locomotiva, movendo junto os "penetras".
As lojas enfeitaram suas vitrines com as cores das seleções que jogariam em Curitiba. Cinco rádios brasileiras e uma espanhola transmitiram a primeira partida, assistida por inúmeras autoridades, como o governador Lupion e o embaixador da Espanha no Brasil. A renda do confronto entre a "Fúria" e os norte-americanos, de quase CR$ 400 mil, foi a maior da história do futebol paranaense até então.
Tudo saiu conforme o planejado, a antiga Confederação Brasileira de Desportes (CBD) enviou fax à Federação Paranaense de Futebol congratulando pelo sucesso na organização dos dois jogos. A Curitiba de pouco mais de 300 mil habitantes deixaria a Copa um pouco menos provinciana.
Fúria espanhola decepcionou em Curitiba
O primeiro jogo da Copa de 1950 em Curitiba decepcionou a imprensa da época. A Espanha, já chamada de "Fúria", trazia um ataque considerado arrasador, com Basora, Hernández, Zarra, Igoa e Gainza, mas suou para derrotar os primários norte-americanos.
No dia seguinte ao jogo, o diário Paraná Esportivo elogiou o espetáculo pelo ineditismo, pelo estádio cheio e o clima ordeiro, mas criticou a qualidade das equipes. "Ficou evidente a deficiência técnica, na qual até os bascos deixaram muito a desejar", publicou. Os espanhóis, segundo o jornal, tinham aspecto de jogadores sul-americanos, enquanto os americanos aparentavam maior "conservadorismo", a começar pelos calções que vinham até o joelho, no melhor estilo britânico.
Os Estados Unidos saíram na frente logo aos 18 minutos do primeiro tempo, com um tiro longo de Jonh Souza, que quicou no gramado antes de entrar. "Foi um frango do goleiro", lembra o jornalista Levi Mulford, que pagou 20 cruzeiros (5% do salário mínimo) parta assistir à peleja. No jogo seguinte, o arqueiro Eizaguirre seria substituído por Ramallets, que ocupou a meta até o final da Copa.
Já naquela época, a Espanha mostrava sinais de instabilidade. A "Fúria" parecia nervosa à medida que o tempo passava e não igualava o placar – o ponta Basora, tido como um "autêntico craque", perdeu um gol feito, e Zarra, Igoa e Gainza também desperdiçaram excelentes oportunidades de empatar.
Já o time do Tio Sam foi classificado de "principiante" pelos cronistas da época – que elogiaram apenas a eficiência do "limpador de área" Colombo e o "esforço titânico" do meia Gaetjens. "Mas a Espanha era mais técnica e os americanos cansaram no final", lembra o ex-jogador Barbosinha, que assistiu ao jogo.
Com três gols nos 10 minutos finais, os espanhóis viraram o placar para 3 x 1.
Já o duelo entre Suécia e Paraguai, disputado quatro dias depois, tinha alguns temperos interessantes. Os suecos impunham respeito pela medalha de ouro conquistada na Olimpíadas de Londres, em 1948. Os paraguaios eram comandados pelo folclórico técnico Manuel Solic, que pouco depois dirigiria o Flamengo.
O público foi um pouco menor, até porque era quinta-feira à tarde e poucas empresas liberaram seus funcionários. "Foi um jogo melhor do que Estados Unidos x Espanha, mais eqüilibrado. A Suécia tinha estilo mais cadenciado, e o Paraguai nunca foi de matar com a unha", recorda Barbosinha. Tanto eram lutadores que os paraguaios cavaram o empate no último minuto, com um gol de Atilio López.
Depois de jogar em Curitiba, Suécia e Espanha conquistaram o primeiro lugar de seus grupos e chegaram à fase decisiva, disputada em turno único com Brasil e Uruguai. Até hoje, o quarto lugar em 1950 é o melhor desempenho dos espanhóis em Copas do Mundo.