‘Fiquei chateado’, diz paratleta tachado de ‘falso cadeirante’ ao conduzir tocha

Nos últimos dias, o ambiente das redes sociais foi “invadido” por um vídeo do revezamento da tocha olímpica em Anápolis, no estado de Goiás. Nas imagens, João Paulo Nascimento, paratleta do basquete de cadeiras de rodas, é visto caindo de sua cadeira de rodas ao tentar passar a chama para o próximo condutor. O fato de João Paulo ter se apoiado em sua perna para minimizar a queda gerou uma série de pré-julgamentos e piadas de mau gosto que foram espalhados rapidamente na internet, acusando o paratleta de ser um “falso cadeirante” infiltrado no revezamento.

Porém, boa parte dos internautas que atacaram o atleta nos últimos dias desconhecem as regras do basquete paralímpico. Na verdade, o esporte não é restrito apenas para paraplégicos. João Paulo possui uma deficiência chamada Geno Valgo, um desalinhamento que acaba colocando os joelhos para dentro, que foi diagnosticada quando ele ainda tinha 20 anos. Para explicar melhor toda esta história, é necessário recontar a vida de “Jota Pê”, como é conhecido, desde sua infância.

Seu pai, que não tem o movimento das pernas, também foi atleta de basquete adaptado e se sagrou bicampeão mundial da modalidade. Quando criança, João costumava se divertir com os equipamentos do pai: “Eu costumo brincar que a cadeira de rodas era meu brinquedo preferido”, revela, em entrevista ao Estado de S. Paulo. Porém, a grande paixão do garoto era mesmo o basquete tradicional.

“Eu jogava mesmo o basquete convencional. Minha lesão foi até devida a jogar muito basquete. As crianças costumam sonhar em jogar futebol pela seleção brasileira, mas eu não, sempre sonhei em jogar na NBA! Depois que meu problema foi diagnosticado, eu tinha 20 anos e o médico me orientou a não jogar mais caso eu ainda quisesse andar normalmente. Na época, foi muito frustrante, pois o basquete era minha vida”, afirma João. Porém, a paixão pelo esporte ainda era maior do que os obstáculos. Desde então, ele se dedicou ao basquete adaptado, assim como seu pai.

“No momento do acidente no revezamento, eu procurei fazer uma manobra que eu sou habituado a fazer, em que eu fico em uma roda só e dou um giro de 360 graus. Porém, na hora que eu dei o impulso, o rapaz que estava me ajudando achou que eu estava caindo e tentou segurar a cadeira. Com isso, o cinto se soltou e eu caí”, revela. Ele faz questão de frisar que possui força nas pernas, apesar da deficiência, o que explica o fato de ele ter se apoiado no momento da queda.

“Eu fiquei chateado com os comentários, pois, para mim, o que aconteceu foi normal. Costuma acontecer no basquete de cadeira de rodas. Já aconteceu comigo em quadra e eu me levanto rapidamente. Não esperava este tipo de reação, nem ser tachado de um ‘falso cadeirante’. As pessoas não conhecem muito bem o esporte paralímpico. Todas as deficiências são avaliadas por fisioterapeutas, médicos e outros profissionais sérios. E isso tudo é feito em escala internacional, ao contrário daqueles que disseram que isso acontece só no Brasil”, desabafa João.

Agora, o foco do paratleta está totalmente voltado para os Jogos Paralímpicos do Rio. João Paulo Nascimento vive expectativa para a convocação da seleção brasileira. “Nos últimos três anos da minha vida, eu apenas pratiquei o basquete. No ano passado, joguei em um clube espanhol. Porém, com a falta de patrocínio, tive de voltar para o mercado formal e atualmente trabalho em um laboratório farmacêutico. Minha rotina é corrida, pois eu trabalho, treino e faço faculdade, mas espero ter o esforço recompensado com a convocação”, finaliza.

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