Uma das páginas mais comoventes do futebol brasileiro foi escrita ontem. Por mais que seja uma notícia triste, a morte de Assis, aos 61 anos, vítima de insuficiência real, tem um quê de poesia, como se ele quisesse reencontrar seu parceiro ideal, Washington, falecido há 45 dias. Eles estão juntos de volta, da mesma forma que fizeram a alegria das torcidas do Atlético e do Fluminense. Mas trazem uma tristeza sem tamanho para quem admirava o futebol desta dupla.
Benedito de Assis da Silva tinha problemas renais e estava internado há algumas semanas no hospital Vita. Nunca transparecera as dificuldades de saúde, mas comovera o esporte brasileiro com sua reação após a morte de Washington. Ele ficou inconsolável, não conseguiu falar sobre o companheiro e foi um dos que acompanhou do início ao fim a despedida ao centroavante. De lá para cá, se afastou do noticiário, acabou hospitalizado e sua morte foi confirmada na manhã de ontem. Assis deixa viúva e dois filhos. O velório acontece na capela Unilutus e o enterro será hoje, às 17h, no cemitério Água Verde.
A carreira de Assis no futebol foi de mais de vinte anos. Paulistano, teve seus primeiros passos no esporte na Francana, passando pela Internacional de Limeira até ser contratado pelo São Paulo em 1980, numa leva de reforços que incluía Oscar e Renato. Chegou a ser titular, mas disputava posição com o próprio Renato e com Serginho Chulapa, à época jogadores de seleção brasileira. Por isso, disputou um bom número de partidas, mas nunca se firmou no Morumbi.
Tanto que em 1981 foi negociado com o Internacional. Na verdade, foi como moeda de troca na contratação de Mário Sérgio (esse mesmo ex-treinador do Furacão e hoje comentarista) pelo São Paulo. Em Porto Alegre, mal jogou, mas conheceu um centroavante que também estava encostado no Beira-Rio – Washington. E desse primeiro ponto, que na verdade parecia o fundo do poço, eles refizeram suas carreiras.
E começando também como moeda de troca na vinda para o Atlético, pois o Inter na verdade contratou o lateral Augusto e cedeu os dois para fechar o negócio. Só que a partir daí Assis e Washington explodiram. O futebol deles se completava – Washington era o centroavante alto e técnico, Assis era o meia que chegava com força e talento. Gols saíam de todo jeito. Eram fatais. Fizeram um campeonato paranaense impecável em 1982, ganhando todos os turnos. Há quem diga que o Furacão de 1982 era melhor que o time que assombrou o País no ano seguinte.
Assombrou porque fez uma campanha espetacular no Brasileiro, parando apenas no Flamengo de Zico. História já contada tantas vezes, e relembrada quando Washington partiu. Por isso, vale recordar da série eliminatória anterior, contra o São Paulo. E foi Assis (logo ele, desprezado pelo tricolor paulista) quem calou o Morumbi na vitória por 1×0 que levou o Atlético às semifinais.
Origem do apelido
Aquelas atuações fizeram com que Assis e Washington fossem contratados (aí já a peso de ouro) pelo Fluminense. O sucesso se ampliou e Assis, agora o 10 do Flu, virou mito para a torcida carioca, ao lado do companheiro. Viraram o “Casal 20”, por conta da série de televisão que passava no Canal 12. Eram sucesso dentro e fora de campo – no gramado, com os gols e as vitórias; fora, no espírito alegre que contagiou o Rio.
Logo no primeiro campeonato carioca, Assis fez o gol do título sobre o Flamengo. Depois, fundamental na conquista do Brasileiro de 1984, com direito a vitória sobre o Corinthians no Morumbi e taça levantada após derrotar o Vasco. Foram ainda mais dois títulos cariocas e uma convocação para a seleção brasileira no período das Laranjeiras.
Assis voltou para o Atlético em outras duas oportunidades. Em 1988, estreou em um Atletiba e fez o gol da vitória. Foi campeão estadual, assim como em 1990, quando ficou mais como reserva que titular. Passou brevemente pelo Paraná e encerrou a carreira no Furacão em 1992. A partir daí, teve, a vida muito ligada ao Fluminense, onde foi auxiliar, coordenador das categorias de base e embaixador do clube. Mas nunca deixou Curitiba, onde casou em 1985 e tinha um apartamento no bairro Água Verde, bem perto da Baixada.
A história com Washington persistiu. Era ele quem liderava todas as iniciativas para ajudar o companheiro, inclusive o chamado “Washington Day”, em 2009, num dia de Fluminense x Atlético, quando foi feita uma arrecadação em nome do antigo camisa 9. Uma amizade eterna, tão forte que a união levou estes dois ídolos em apenas 45 dias. Vai em paz, Assis. Washington te recebe de braços abertos.
Luto
O presidente da Federação Paranaense de Futebol, Hélio Cury, decretou luto oficial de três dias no futebol local por conta da morte de Assis. Ontem, antes do amistoso entre Grêmio e Londrina, foi respeitado um minuto de silêncio.
Divulgação/Atlético |
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Casal 20 fez sucesso no Atlético e no Fluminense nos anos 1980. O meia-esquerda Assis (D) morreu ontem de manhã em Curitiba. |