São Paulo – A Europa aumentou a luta contra o racismo depois das manifestações xenófobas dos torcedores espanhóis nos jogos contra a Inglaterra, no sub-21 e no amistoso de quarta-feira. Tanto a Uefa quanto a Fifa adotaram medidas para coibir comportamentos ofensivos como os registrados no Santiago Bernabeu, principalmente quando o técnico sueco da Inglaterra, Sven Goran Eriksson, substituiu David Beckham aos 15 minutos do segundo tempo por Shaun Wright-Phillips.
A entidade máxima no continente europeu aumentou multas impostas ao Sparta Praga, da República Checa, e ao Sevilla, da Espanha, por incidentes racistas durante competições internacionais.
O clube da capital checa desafiou uma multa da Uefa de 50 mil francos suíços, cerca de US$ 42.720,00. A entidade acusou o clube de repetidas ofensas racistas de seus torcedores no jogo da Liga dos Campeões contra o Lyon, da França, em 28 de setembro. O time alegou que os coros foram incorretos e que não eram racistas.
Por sua vez, a organização presidida pelo sueco Lennart Johansson pediu um aumento na multa para 75 mil francos suíços. O órgão de apelações da entidade decidiu aumentar a multa para 60 mil francos suíços, cerca de US$ 51.200,00.
Coro
Na Espanha, o Sevilla apelou contra uma multa de 15 mil francos suíços, US$ 12.800,00, aplicada pela Uefa pelo coro racista de seus torcedores e também pelo disparo de fogos de artifício no jogo da Copa da Uefa contra o Nacional da Ilha da Madeira (Portugal), em 15 de setembro. O clube espanhol alegou que era impossível detectar a entrada dos fogos no estádio.
Quanto aos coros racistas, os dirigentes afirmaram que partiam de um pequeno grupo na torcida. O órgão de apelações foi acionado novamente e decidiu aumentar a multa para 25 mil francos suíços, cerca de US$ 21.300,00. Em ambos os casos, tanto o Sparta de Praga quanto o Sevilla tiveram de arcar com os custos do processo de apelação.
O corpo de apelações da Uefa divulgou nota revelando que os aumentos nas multas de sexta-feira reforçam fortemente a posição determinada da entidade máxima do futebol continental contra o racismo nos gramados europeus.
Rei Negro
A decisão chegou no momento em que dirigentes e organizações ligadas ao futebol protestam e se unem contra o avanço do racismo. O presidente da Fifa, Joseph Blatter disse, na sexta-feira, que é "repugnante e inaceitável" este racismo no futebol, que tem como rei um negro, referindo-se ao brasileiro Pelé, eleito o melhor do século. A entidade máxima do futebol está investigando os incidentes espanhóis e vai exigir esclarecimento para saber se seus estatutos e o Código de Ética foram violados.
Entre os protestos está o dos jogadores franceses da primeira divisão. Eles entrarão em campo neste fim de semana com camisas com a frase: "Não ao Racismo" e "Não à Violência", numa ação apoiada pela Liga. Os jogadores da segunda divisão farão algo parecido na próxima semana.
Ato de racismo na Europa não é inédito
São Paulo – Ter problemas com segregação não é novidade para atletas negros que atuam na Europa. Muitos passaram por situações constrangedoras, embora sejam freqüentes também os casos de estrangeiros que se naturalizaram e foram aproveitados em seleções.
A Espanha abriu espaço para atletas negros em sua seleção. Mesmo assim, não são presença constante, ao contrário do que ocorre na Inglaterra. Nos últimos dez anos, apenas três defenderam a ‘Fúria’. Dois deles nasceram no Brasil – Donato e Catanha – e optaram por nova cidadania. O terceiro é Vicente Engonga, natural de Barcelona, mas de pais que vieram da Guiné.
Em 1998, quando teve oportunidade na equipe nacional, era o único negro espanhol, dentre 480 jogadores de sua nacionalidade na Série A da Liga. Hoje, esse número aumentou, por conta do crescimento da imigração.
O caso de Donato e Catanha era diferente. O primeiro começou carreira no Vasco, nos anos 80, mas emigrou jovem para a Espanha, defendeu o La Coruña por muito tempo e parou de jogar no ano passado. Sua identificação com o país era tão grande que se naturalizou e não voltou mais. O maranhense Catanha teve sua melhor fase no Celta, de Vigo, o que o levou a aceitar proposta de nova nacionalidade.
Na Inglaterra, o espaço para negros no ‘English Team’ começou há muito mais tempo. O primeiro a ter oportunidade foi Viv Anderson, em 1976. Na época, despertou curiosidade dos torcedores locais. O mesmo não aconteceu com Shaun Wright-Phillips, um dos novos convocados por Sven Eriksson e que se tornou o 48.º negro na seleção.
A ira que Ashley Cole, Jenas e principalmente Wright-Phillips despertaram em parte do público que esteve no Santiago Bernabéu, embora desprezível, não foi inédita. Dois anos atrás, Emile Heskey, então no Liverpool, reclamou de comportamento racista durante jogo com o Valencia, pela Liga dos Campeões. Na mesma época, o Ipswich Town, também inglês, se queixou de segregação em partida com o Sartid, da Sérvia; situação semelhante vivida por atletas do Blackburn Rovers contra o CSKA Sofia, em torneio europeu. Britânicos relatam incidentes racistas, nos últimos anos, em deslocamentos por Macedônia, Eslováquia, Albânia. Em contrapartida, a Federação Inglesa foi multada por conta de gritos racistas de seus torcedores, no ano passado, em jogo com a Turquia, em Sunderland.
Na Holanda, já se falou em divisão na própria seleção, entre negros e brancos. Na Itália, as torcidas de Lazio e Verona são consideradas as mais racistas. O holandês Aaron Winter, negro, por exemplo, saiu da Lazio por não suportar mais discriminação.