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O uruguaio Juan Figer é um empresário de tráfego internacional muito ligado ao futebol paranaense. |
São Paulo – Gilmar Rinaldi; Juan Figer, Todé, Manuel Barbosa e Cláudio Guadagno; Oliveira Júnior, Jorge Machado e Alemão; Alexandre Martins, Reinaldo Pitta e Wagner Ribeiro. Este time não joga bola, mas manda no futebol brasileiro: é um time imaginário integrado só por empresários de jogadores.
Os empresários, também conhecidos como agentes ou procuradores, não formam craques – apenas definem o futuro de cada jogador emergente, apressando a mudança de clube. São os inevitáveis intermediários nas freqüentes e milionárias trocas de camisas. A profissão de atravessador é antiga, mas esses agentes passaram a ser os novos ricos do futebol. Eles atropelam os clubes, oferecem vantagens aos cartolas e lucram com a Lei Pelé.
A nova legislação esportiva brasileira, responsável pelo fim da Lei do Passe, está longe de cumprir a profecia de seu idealizador, Pelé, na época em que foi ministro de Esportes. "Vai ser a Lei Áurea do futebol", disse ele em 1998, pouco antes de se afastar do ministério. Na verdade, mesmo após as alterações do texto original, a lei impôs aos clubes a perda do controle sobre seus jogadores, que, ainda jovens, ficam liberados para aceitar propostas de outro time do Brasil ou do exterior.
Atrás de qualquer jogador brasileiro com ambição de buscar a sorte em outro país está sempre um empresário. Aconteceu assim com Kaká, ex-São Paulo, hoje ídolo do Milan, da Itália. Sua transferência, auxiliada por torcedores são-paulinos que vaiavam o craque, foi definida pelo agente Wagner Ribeiro, o mesmo que está levando Robinho, do Santos, para o Real Madrid.
O uruguaio Juan Figer, que tem contrato com inúmeros jogadores, oferece suas atrações para times brasileiros, que servem de vitrine para negociação com os estrangeiros. Em fevereiro, essa mesma fórmula levou o empresário Jorge Machado a antecipar a saída do atacante Neto, do Mogi Mirim, ainda no início do campeonato paulista.
Empresários vivem de comissões. Eles faturam em cima da ida e da volta de cada jogador. Em julho de 1992, Francisco Monteiro, conhecido como Todé, convenceu o então jovem zagueiro Antônio Carlos, campeão da Libertadores pelo São Paulo, de que havia chegado a hora de ganhar dinheiro na Espanha. Ao mesmo tempo, ele avisou aos dirigentes do clube espanhol Albacete que um "jogador brasileiro de futuro", Antônio Carlos, poderia ser excelente reforço. Fechado o negócio, não demorou muito para as três partes oficiais se frustrarem: o São Paulo, de Telê Santana, sentiu saudade de seu zagueiro; o jogador disse que não se adaptou à cidade de Albacete e o clube espanhol percebeu ter feito mau investimento. Haveria conserto? Sim. A mágica foi feita por Todé, que agiu como intermediário também para trazer Antônio Carlos de volta ao Brasil, desta vez com a camisa do Palmeiras, cinco meses após a exportação do zagueiro para a Espanha.
Empresa em paraísos fiscais não é privilégio da MSI, atual parceira do Corinthians. Ronaldo, do Real Madrid, teve seu primeiro contrato de assessoria com a empresa Gortin, dos empresários cariocas Reinaldo Pitta e Alexandre Martins, registrada nas Ilhas Virgens Britânicas, em 1992, época em que o jogador era do São Cristóvão. Pitta e Martins perderam a galinha dos ovos de ouro no ano passado, depois de terem sido condenados pela Justiça do Rio a 11 anos de prisão, em primeira instância, pelo envolvimento num escândalo extrafutebol, a remessa ilegal de US$ 35 milhões para o exterior. Foi pelas mãos dos dois agentes que Ronaldo chegou ao Cruzeiro, em 1993, e depois, ao PSV Eindhoven da Holanda, ao Barcelona, da Espanha, à Internazionale, da Itália, e ao Real, novamente na Espanha.
Em 2004, os dois empresários ficaram detidos em cadeias do Rio e de Maceió – saíram por meio de habeas corpus. Diante disso, Ronaldo anulou o contrato.
O português Manuel Barbosa, empresário de Mozer, Ricardo Gomes, Valdeir, Valdo e outros jogadores da seleção nos anos 90s, tem em seu currículo a transferência de Raí do São Paulo para o Paris Saint-Germain, em 1992, época em que freqüentava a CBF e era amigo do técnico Carlos Alberto Parreira. Ao participar de alguns negócios misteriosos na França e em Portugal, Manuel Barbosa desgastou-se. Em sua terra, ele já não consegue mais nem entrar no Benfica. Na França, dirigentes de Paris, Bordeaux e Marselha não podem ouvir falar em seu nome.
A profissão de agente é reconhecida pela Fifa, que impõe a obrigatoriedade do registro dos empresários nas confederações dos seus respectivos países. A CBF, que costuma abrir concurso para admitir novos agentes, mantém no seu site uma lista dos empresários oficiais. Por meio dos oficiais e dos clandestinos, o futebol brasileiro exportou mais de mil jogadores em 2004 e nos três primeiros meses de 2005 para 85 países e colônias dos cinco continentes: 832 no ano passado e 252 no começo deste ano.
Neto, exemplo da realidade
São Paulo – O antes desconhecido Neto, primeiro herói do Campeonato Paulista deste ano, já desapareceu. Em 19 de janeiro, ele foi escalado no ataque do Mogi Mirim e marcou os dois gols da vitória sobre o Corinthians por 2 a 1, no Pacaembu. No dia seguinte, Euvaldo José de Aguiar Neto contou sua história: "Sou baiano, tenho 22 anos, já joguei no Mirassol, no São Caetano e no Vietnã".
Ele disse que estranhou muito a vida no Vietnã, país do Sudeste da Ásia, onde defendeu o time Binh Duong em 2004. "Lá, eles comem rato!"
Mais três partidas pelo Mogi e Neto completou quatro gols na equipe. No início de fevereiro, ele seguiu para o quinto clube de sua curta carreira: o Chonbuk Hyundai, da Coréia do Sul, outro país do Extremo Oriente. "Estou feliz. Vou ganhar 15 mil dólares por mês", festejou o atacante.
A transferência de Neto para a Coréia foi acertada pelo empresário Jorge Machado, o mesmo que havia acertado seu empréstimo do Mirassol para o Mogi, clube usado como vitrine, trampolim, camisa de aluguel. A reforço custou aos coreanos US$ 550 mil, dos quais uma parte fica com o Mogi, uma com o Mirassol e outra com o empresário.
"A Coréia é melhor que o Vietnã e estou ganhando dinheiro", disse Neto numa ligação telefônica para o zagueiro Fábio Braz, do Mogi, referindo-se ao salário de US$ 15 mil mensais.
