O então bóia-fria José Pereira, 44 anos, mudou o próprio destino e o de seus sete filhos quando, no início da década de 90, veio de Alagoas com a família para visitar alguns parentes em Curitiba. Para não ficar sem fazer nada, resolveu dar uma de servente de pedreiro, auxiliando o parente na construção da Academia de Tênis Daniel Contet, em Santa Felicidade, o bairro da gastronomia que surgiu com a ?invasão? dos imigrantes italianos.

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José nem pensava em ficar no Sul. Sua intenção era voltar pras Alagoas. Mas foi ficando e aceitou o convite para se tornar uma espécie de ?gerente? das quadras. Os filhos, ainda crianças, começaram a acompanhar o pai no novo emprego. ?Para não ficarem sem fazer nada, logo coloquei os garotos catando bolinha?, conta José. E foi assim que eles deram suas primeiras raquetadas. Hoje, acumulam medalhas, troféus e até pequenos cachês em real, dólar e euro.

Teliana Pereira, 15 anos que já esteve entre as 50 melhores (foi 47.ª) do mundo é hoje o número 52 no ranking mundial na categoria feminina até 18 anos (2004 Top 100 Junior World Ranking Girls), já esteve na França por cinco vezes, jogou em Roland Garros, conheceu e se fotografou ao lado de celebridades do tênis, como Roger Federer, Henri Mathieu, Guga, Boris Becker, Mark Philippoussis e já está apadrinhada – desde fevereiro de 2003 – por um astro da música pop, o cantor inglês Phil Collins (Little Dream Foundation Kids -Suíça).

Renato Pereira, 19 anos que também foi ?boleiro?, já participou e venceu vários campeonatos regionais e dá aula de tênis para os freqüentadores da academia. José Pereira Junior, que completou 14 anos em janeiro, acaba de chegar de Trujillo (Peru) com o troféu de primeiro lugar na categoria individual do torneio de Tênis Totora Bowl.

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Além do patrocínio dessa fundação, do Instituto de Tênis de Florianópolis, os atletas da família Pereira utilizam os recursos da Lei Municipal de Incentivo ao Esporte, da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer, da Prefeitura da Curitiba. ?A lei existe desde 2002 e já destinou mais de RS$ 2,5 milhões a projetos esportivos, beneficiando mais de 600 atletas?, explica o secretário Raul Plassmann.

Teliana que aos oito anos catava bolinha, aos nove já disputou seu primeiro torneio valendo medalha e foi campeã paranaense na categoria 10 anos, na ATDC. Ela começou a jogar, incentivada por Didier Rayon (seu treinador) francês radicado no Brasil há vinte anos. ?Quando Teliana começou a jogar, ela nem sabia contar os pontos, por isso precisou do auxílio de outra pessoa em quadra?, conta o pai.

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Ele faz questão de dizer que não gosta de dar entrevistas e não interfere na carreira dos filhos. ?Gosto de ficar quieto no meu canto?, comenta. Essa é a mesma postura da mãe Maria Nice, 43 anos, que se limita a dar os parabéns para os filhos quando ligam de algum lugar do mundo para falar do desempenho em quadra.

Esse comportamento dos pais, de certa forma, agrada tanto Teliana quanto Júnior. ?Assim ninguém fica botando pressão na gente?, comenta a jogadora que já disputou o Circuito Credicard Mastercard, Circuito Unimed, Bahia Open, Banana Bowl (São Paulo), Cosat (Confederação Sul-Americana de Tênis), sul-americano em equipe (Barcelona 2004). Até tem dificuldade para lembrar dos países onde jogou em tão pouco tempo. Para citar alguns, México, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Paraguai, Uruguai, Agentina, Espanha, Alemanha, França. Em 2001 trouxe, de Monte Carlo, o troféu de primeiro lugar na categoria 16 anos (embora tivesse 13). Mas para ela, o acontecimento mais importante de sua carreira, foi ter vencido com o irmão Renato a etapa do Credicard, em Joinvile (2003) justamente no dia do aniversário do treinador Didier Rayon. ?Foi o nosso presente para ele. Ficamos todos muito felizes?, comenta.

?Júnior chegou de mansinho, nem era conhecido, quando ganhou a etapa de Curitiba do Circuito Credicard Mastercard. Em seguida vieram os títulos do Bahia Open e do Til Tennis Cup, todos na categoria 12 anos masculino. Esses foram os únicos brasileiros que participaram em 2003. Em todos foi campeão. Depois dessas vitórias, Júnior deixou de ser apenas o irmão da Teliana e conquistou o seu espaço como um futuro grande jogador do Brasil?, escreveu a revista Tênis Z News.

Fama

Os nomes de Teliana Pereira e José Pereira Junior estão em todos os sites de tênis em vários idiomas. Eles são assunto de programas de televisão e de revistas especializadas, mas ainda não têm a dimensão exata da fama.

Embora os filhos Teliana e Junior sejam as grandes promessas do tênis paranaense e brasileiro, a família continua vivendo com muita simplicidade. Por enquanto os prêmios em dinheiro ainda não são significativos. ?Mas a intenção é continuar jogando e ser feliz com o tênis. Quero ser profissional, seguir carreira mesmo. Como pretendo me dedicar muito, acho que o dinheiro será uma conseqüência?, enfatiza a jogadora, que treina cerca de 3 a 4 horas por dia e estuda em casa uma espécie de supletivo do ensino médio, com provas bimestrais.

Júnior, a partir de abril, vai morar em Camboriú (SC) e vai integrar a equipe do Instituto Tênis de Florianópolis. E ambos são categóricos ao afirmar que não pretendem deixar o Brasil caso sejam convidados para jogar e estudar por alguma universidade, principalmente dos Estados Unidos, onde é comum a contratação de atletas em troca de bolsa.

Na opinião de Teliana, atletas que vão para as universidades americanas, na sua maioria, jogam enquanto estão cursando, mas não seguem carreira profissional. Depois que terminam o curso, são descartados. ?Ou seja, só interessam para a escola enquanto estão lá dentro?, comenta a tenista.

Os planos de Teliana e do irmão mais velho, Renato, são alugar um apartamento em Curitiba e morar sozinhos. A casa onde vivem hoje em Santa Felicidade é muito pequena para uma família de sete filhos.

?Nem tenho meu próprio quarto. Sei que sou nova para morar sozinha, mas sempre vou ficar por perto dos meus pais e vou levar meu irmão de 19 anos para morar comigo?, fala Teliana na frente da mãe que não concorda, mas entende. ?Chega uma hora que os filhos precisam seguir com suas vidas. Eu tinha 17 anos quando me casei e logo já tive que cuidar da casa e dos filhos sozinha e ainda trabalhar fora?, analisa.

Atletas terão mês de março para se inscrever na Lei de Incentivo

A Secretaria Municipal do Esporte e Lazer realiza, está preparando mais uma rodada de palestras de orientação a instituições e atletas interessados em apresentar projetos para inclusão na Lei de Incentivo ao Esporte.

As palestras, realizadas também nos dias 10 e 17 deste mês na própria secretaria são gratuitas e oferecem orientação e informações para a correta elaboração dos projetos que devem ser protocolados de 1.º a 31 de março.

Para participar, não é preciso fazer inscrição. ?Essas palestras são importantes para sanar dúvidas e, principalmente, para que o atleta não corra o risco de ter seu projeto indeferido em função de um simples detalhe?, alerta Antônio Cândido de Medeiros Junior, gerente do Departamento de Incentivo ao Esporte e à Promoção Social.

Os projetos apresentados nesta primeira fase serão analisados por uma comissão especial formada por representantes da própria Secretaria, da Câmara de Vereadores, da Procuradoria Geral do Município, do Sindicato dos Clubes Sociais (Sindiclubes), dos atletas e dos paraatletas. O prazo para o deferimento dos processos se encerra em agosto próximo. Os projetos aprovados devem ser executados entre 01 de setembro deste ano até 31 de janeiro de 2006. E a prestação de contas deve ser feita até o final de fevereiro de 2006.

A Lei de Incentivo ao Esporte está em vigor desde julho de 2002 e permite às entidades civis sem fins lucrativos, inclusive clubes sociais, a redução de até 67% do IPTU relativos a imóveis próprios, cuja utilização esteja vinculada às suas atividades essenciais. O incentivo, em Curitiba, consiste na redução de R$ 3,00 do imposto devido para cada R$ 1,00 destinado a projetos esportivos.

Para o secretário municipal do Esporte e Lazer, Raul Plassmann, é fundamental que mais clubes e entidades se interessem em apoiar o esporte, porque o objetivo é atender, cada vez mais, um maior número de atletas, aumentando os ganhos sociais do projeto. Por intermédio dessa lei, os atletas dispõem de recursos para viagem, alimentação, hospedagem. Além da possibilidade de obter bons resultados nas competições dentro e fora do País, o atleta na volta, dá a contrapartida social. ?É com esse mecanismo que Curitiba incentiva novas gerações de atletas?, diz o secretário.