Ele vai realizar o sonho de jogar uma partida de Copa. Mais, uma partida de abertura e logo no país onde nasceu. Tem boas chances de até ser titular no Itaquerão. Mas não defenderá a amarelinha da seleção brasileira. Eduardo da Silva, apesar do nome e sobrenome, vestirá a camisa da Croácia no dia 12 de junho, quando todos os olhos do esporte mundial estarão voltados para o Brasil.

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Diante do inusitado da situação, o jogador de 31 anos admite ficar dividido e espera viver um momento “emocional”. Não por acaso. Ele tem quase tanto tempo de Europa quanto de Brasil. Saiu do Rio aos 16 anos e já joga no futebol europeu há 15 anos.

Lá naturalizou-se, casou com uma croata e formou família. Destacou-se no Dínamo de Zagreb e foi chamado para a seleção de base da Croácia. Em 2004, passou a ser convocado para a equipe principal, da qual já é o segundo maior goleador da história, atrás apenas de Davor Suker, artilheiro da Copa de 98.

A boa adaptação ao futebol europeu, contudo, deixou marcas. O português não é mais tão fluente. Durante a entrevista, Eduardo da Silva buscava as palavras com um constante “como se fala?” em suas respostas, ao mesmo tempo que não escondia o sotaque carioca.

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É mantendo o contato com a família que ele garante a conexão com o Brasil. Sempre que pode, aparece no Rio para visitar mãe e irmão. Tímido, diz gostar do anonimato no Brasil. E, na abertura da Copa, já avisou que vai cantar os dois hinos. E não recusará comemoração, ainda que discreta, ao seu estilo, em caso de gol.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista por telefone que o atacante concedeu à Agência Estado, no início da preparação da Croácia para a Copa.

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Agência Estado – Como será jogar uma Copa do Mundo em seu país mas defendendo uma seleção diferente, ainda mais em um jogo de abertura?

Eduardo da Silva – É uma situação um pouco delicada, provavelmente vai ser um pouco emocional. Eu saí cedo do Brasil para jogar em outro país. E há dez anos jogo pela seleção da Croácia. Nunca imaginei que um dia isso pudesse acontecer: jogar a Copa do Mundo no país onde eu nasci mas jogar por outra seleção e ainda mais sendo contra o meu país e na abertura. Nunca ninguém poderia imaginar isso.

Agência Estado – Nunca pensou em defender a seleção brasileira?

Eduardo da Silva – Era um sonho de criança jogar na seleção brasileira, claro. Só que o meu destino foi diferente. Eu fui para a Europa. Cresci lá e fiz minha vida lá. Tenho grande amor pela Croácia, pelos torcedores. E eles me tratam muito bem também.

Agência Estado – Comemoraria um gol contra o Brasil?

Eduardo da Silva – Vai depender do gol. Se for gol de honra, não tem como comemorar. Mas se for de empate ou até da vitória… Mas não sou de comemorar muito. Só abraço meus companheiros, bem tranquilo. Mas isso é do momento, né. Na hora você vê o que vai fazer.

Agência Estado – Com a lesão de Mandzukic, suas chances de ser titular aumentaram. Acredita que começará jogando contra o Brasil?

Eduardo da Silva – Venho jogando bem no meu clube nesses últimos seis meses e os jornais e os torcedores vêm colocando meu nome entre os titulares. O mais importante é que estou me sentindo bem e estou preparado física e mentalmente. Acho que tenho qualidade para jogar. Mas ainda está cedo para saber se vou ser titular.

Agência Estado – Quais as chances contra o Brasil?

Eduardo da Silva – A Croácia sempre joga bem contra seleções grandes. E nesse caso será até bom jogar a abertura. Vejo como uma grande vantagem porque teremos menos pressão, porque jogaremos contra o favorito. E assim poderemos mostrar nosso melhor futebol. Se a Croácia fizer o primeiro gol, será difícil para o Brasil virar. Com a minha experiência aqui, sei que a seleção croata é muito disciplinada e vem muito bem fisicamente. O Brasil vai estar mais nervoso do que a Croácia porque jogará em casa, diante da torcida. Claro que a Croácia também vai estar nervosa, mas quando começa o jogo, tudo passa.

Agência Estado – Neymar será mesmo a maior preocupação da Croácia?

Eduardo da Silva – Sim, ele é a estrela, talvez não só do Brasil como da Copa, assim como Messi, Cristiano Ronaldo, Iniesta. O Brasil tem outros jogadores de grande nível como Oscar, Fernandinho, Willian. E é forte na defesa também.

Agência Estado – Mantém amizade com os brasileiros do Shakhtar Donetsk? Conversam sobre o futuro duelo entre as duas seleções?

Eduardo da Silva – A gente mantém contato. Com o Willian, não conversamos sobre seleção porque ele já estava em outro time quando foi convocado (Chelsea). Mas tem o Bernard. A gente brinca, com alguns limites, claro.

Agência Estado – Quais são as metas da Croácia na Copa?

Eduardo da Silva – A meta, por enquanto, é passar da primeira fase. E vai depender muito da estreia contra o Brasil. Se for bem, pode ir longe. Passando de fase, tudo é possível. Na Croácia, comparam a atual seleção com a de 98 e dizem que agora está mais forte. Mas temos que confirmar isso dentro de campo. Se não confirmarmos, não vamos entrar para a história da Croácia.

Agência Estado – Espera ser bem recebido pelos brasileiros ou acredita em alguma reação hostil, por vestir a camisa do rival?

Eduardo da Silva – Espero que eles entendam a minha situação, que procurem conhecer minha história. Eu saí cedo do Brasil, vim atrás do pão, como todos. Não fui para a seleção croata por interesse, foi mais pelo carinho mesmo. E nunca tive a oportunidade de jogar no Brasil, ainda mais na seleção brasileira. Estou no futebol europeu há 15 anos.

Agência Estado – Acredita que a Copa pode torná-lo famoso aqui para facilitar um possível retorno no futuro?

Eduardo da Silva – Eu já pensei em jogar o Campeonato Brasileiro para ver como é que é. Mas acho que me sentiria como um estrangeiro, porque estou totalmente adaptado ao futebol europeu, minha mentalidade é europeia. E não busco ser famoso no Brasil. Aí, quanto menos famoso, melhor.

Agência Estado – Por segurança?

Eduardo da Silva – Também. Todo mundo me conhece na Europa, sou um jogador bem respeitado. Mas no Brasil as pessoas só me conhecem de nome, “aquele Eduardo que joga na Europa”. Nunca me viram. É por isso que, quando vou para o Brasil, nas férias, não tenho nenhum problema. Não tem coisa melhor. Gosto de ficar anônimo. Sou mais fechado, mais tranquilo.

Agência Estado – Você morou oito anos na Croácia e já passou metade da vida na Europa. Hoje se sente mais croata do que brasileiro?

Eduardo da Silva – Não me sinto, não, para falar a verdade. Mas meus colegas de seleção, meus amigos croatas, dizem que eu já virei croata por causa do meu comportamento, do jeito de falar, de brincar. E até meus colegas brasileiros que jogaram comigo no Shakhtar e na Inglaterra falavam que eu já sou totalmente europeu. Mas não deixei de ser brasileiro. Sou apenas diferente mesmo. Tenho sangue brasileiro, mas não tenho mais a mesma mentalidade. Se tivesse, já teria voltado há muito tempo, assim como outros. Diria que 98% dos brasileiros que jogam na Europa não conseguem ficar cinco anos consecutivos lá. Acabam voltando. Eu acabei me adaptando rápido. Gosto de morar, viver aqui é muito bom.

Agência Estado – Como faz para manter a ligação com o Brasil?

Eduardo da Silva – Em toda oportunidade que tenho, venho visitar meu irmão, minha mãe. Todas as minhas férias eu vou para aí e só fico em casa. Quando eu estava na Inglaterra, não tinha a oportunidade de ir no fim do ano porque o campeonato não parava. Ia sempre no meio do ano. Agora na Ucrânia consigo porque o campeonato acaba no fim do ano, consigo passar o Natal e a virada no Brasil.

Agência Estado – E como faz para manter esta conexão brasileira com os filhos?

Sou casado há nove anos e tenho dois filhos, um casal, com minha esposa, que é croata. Ela foi um dos motivos que me levaram a jogar pela seleção da Croácia. Minha filha vai fazer nove anos e fala inglês, croata e português fluentemente, porque ensinei desde pequena. Meu filho tem três anos e fala croata e português também. Dentro de casa, acabamos falando um pouco de tudo.