A derrota histórica no Mineirão abriu o debate a respeito do futuro do futebol brasileiro. Dirigentes, treinadores, o comando da atual comissão técnica da seleção admitiram à reportagem que a hora é de mudança no conceito de jogo e na formação dos jogadores. Um bom modelo a seguir, diz Carlos Alberto Parreira, é o da Alemanha, finalista da Copa. A CBF, até esta quarta-feira à noite, não havia se manifestado sobre que providências tomar depois do desastre em Minas.
Dirigentes influentes e muito próximos de José Maria Marin, presidente da CBF, concordam que é preciso abrir um fórum de discussão em todo o País para se criar um novo conceito do futebol brasileiro. É consenso na maioria dos segmentos ligados ao esporte que a mudança passa por investimento na formação de jogadores. O primeiro passo seria a valorização das categorias de base dos clubes, com profissionalização em todas as áreas, desde treinadores, preparadores físicos, médicos e psicólogos.
Uma das preocupações é conter o enorme êxodo de jovens jogadores ao futebol da Europa. Como os garotos saem cada vez mais cedo para jogar, a formação da maioria deles é na escola estrangeira. Os meninos são obrigados a assimilar nos clubes os conceitos do jogo europeu, treinados que são por técnicos da Europa. “Hoje é muito difícil fazer um jogador da seleção jogar no nosso estilo. Eles têm saído cada vez mais cedo do Brasil, aprendem o jeito de jogar dos estrangeiros e quando se apresentam à seleção têm dificuldade para jogar como brasileiros”, disse Felipão.
A visão de Parreira é mais ampla. “Nesse momento da nossa derrota, que impactou muito, está muito claro que temos uma boa oportunidade de rever algumas coisas. Os alemães se preocuparam em trabalhar a base, melhorar o nível dos treinadores, melhorar os campeonatos em todos os aspectos. Essa é a saída. Temos de nos concentrar naquilo que já fomos muito bons que é o trabalho de formação dos jogadores, melhorar a base dos clubes.”
DIRIGENTES – O presidente do São Paulo, Carlos Miguel Aidar, defende a criação de uma nova associação para tratar de interesses comuns dos clubes. A partir “desse fórum”, algumas prioridades seriam estabelecidas. Uma delas, a de discutir um novo modelo para o futebol. “A CBF tem que cuidar da seleção, os clubes precisam cuidar deles mesmos.”
Para o diretor de Futebol do Corinthians, Ronaldo Ximenes, a eliminação da seleção impõe “a obrigação de repensar os rumos do futebol”. “O resultado só aflorou uma discussão que está bem atrasada. Investimento na formação de atletas e planejamento a médio e longo prazo são essenciais. Infelizmente estão bastante atrasados”, comentou Ximenes.
José Carlos Brunoro, diretor executivo do Palmeiras, analisa o desfecho no Mundial como um alerta. “Temos uma safra de jogadores mais fraca que o normal. A formação do futebol brasileiro é bem falha, pois não estamos dando a estrutura devida aos garotos. Temos uma pressa muito grande de negociá-los.” Ele defende ainda mudança na formação de treinadores.
Thiago Scuro, diretor de Futebol do Red Bull, empresa que começa a investir no futebol brasileiro, vê um desnível na comparação dos treinadores brasileiros com outros do exterior. “Estão abaixo do resto do mundo, basta ver que tem treinador chileno e argentino que faz sucesso até na Europa e nós não conseguimos. Brasileiro só vai para terceiro escalão, como Japão e Emirados. Falta humildade para admitir que ficamos para trás nesse sentido”
O presidente da Federação de Futebol do Paraná, Helio Cury, acredita que o País tem a oportunidade de abrir canais de discussão a fim de detectar a queda da qualidade técnica dos jogadores. Para ele, no entanto, é preciso esperar a poeira “assentar”. “A Copa ainda não acabou. É preciso criar essa agenda com calma e organização.”
Enfático na crítica “ao colapso decretado pela Alemanha no Mineirão”, o presidente da Federação de Futebol de Santa Catarina, Delfim Peixoto, vice-presidente eleito da CBF na chapa de Marco Polo del Nero, disse estar convicto de que a própria entidade vai tomar a iniciativa de reunir atletas, dirigentes, treinadores e outros agentes do futebol para se elaborar “uma nova ordem do futebol brasileiro.” “Temos de destacar que há realmente um abismo entre muitos de nossos treinadores com vários estrangeiros.” (Colaboraram Fernando Faro, Daniel Batista e Vítor Marques)