Um patriarca amoroso com os filhos, netos e bisnetos e apaixonado pelas cores do Coritiba. Seu José Martins Bittar, 78 anos, criou a família ensinando na prática a importância da tolerância e do respeito. Pai de cinco filhos, ainda que as duas mulheres não se interessem muito por futebol, ele passou aos três homens o gosto pelo esporte da bola no pé, mas com um detalhe: cada um é torcedor de um time da capital. Sérgio, 57, o mais velho, é atleticano fervoroso. Paulo, 54, o filho do meio, é apaixonado pelo azul, vermelho e branco do Paraná Clube. Já Edson, 52, o mais novo, foi o único que herdou do pai a devoção ao Coxa.
“Nunca interferi nas escolhas dos meus filhos em nada. Cada um fez suas escolhas, tanto no futebol quanto na vida”, disse seu Zé, como é carinhosamente chamado por todos.
A história da paixão da família Bittar pelo futebol começou quando ainda moravam em Campo Mourão, no noroeste do Paraná. O seu Zé fazia parte da diretoria do Mourãoense, time da região, e não perdia a chance de levar os filhos para assistir os times da capital quando jogavam no interior. Além disso, adorava percorrer com os amigos os cerca de 450 quilômetros da cidade onde morava até Curitiba para estar no Couto Pereira vendo de perto o Alviverde.
Na década de 1970, a família veio morar na capital em busca de uma vida melhor e o local da nova casa não poderia ter sido mais perfeito para Edson, o filho coxa-branca.
“Chegando em 1976 em Curitiba, nós fomos morar no Ahú, bem próximo ao estádio do Coritiba. O bairro era um reduto de torcedores do Coxa. Nós íamos muito ao Couto Pereira, brincávamos lá dentro. Minha mãe fazia a bandeira e era uma festa ir aos jogos, principalmente nos Atletibas”, lembrou o filho, emocionado ao recordar da mãe Joana, que faleceu no começo deste ano. Ainda que fosse atleticana, dona Joana fazia questão de costurar os materiais do Coxa para o filho.
Edson lembrou da vantagem que sempre teve em comparação aos outros irmãos. “É o maior privilégio eu que tenho. Porque eu assisti a todos os jogos da campanha do Coritiba em 1985, Campeão brasileiro, ao lado do meu pai e ainda pude ir ao Maracanã. Nenhum deles viveu isso”, contou o coxa-branca.
A tradição da família Bittar deve se perpetuar para sempre. Cada filho do patriarca passou para as gerações seguintes as preferências pelos times. Netos e bisnetos, seja qual for a preferência de cores ou escudos, seguem a paixão pelo futebol.
As filhas mulheres do seu Zé, Márcia e Regina, apesar de não penderem para nenhum lado, acabaram vendo seus filhos sendo “angariados” pelos atleticanos da família. E parte dessa influencia se deve, em especial, a um dos irmãos. Quando o assunto é o Furacão, Sérgio tratou de contrariar o pai e escolheu logo as cores do maior rival para torcer. Ele garante que é o mais doente pelo time entre os irmãos. “Dificilmente existe um estádio no Paraná ou no Brasil que eu não estive acompanhando o Atlético. Isso se chama paixão”, comentou o rubro-negro.
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Contradizendo todos da família, Paulo não quis saber de seguir na “onda” dos irmãos. “Quando nós viemos para Curitiba, eu olhei para um lado e olhei para o outro. Verde e branco não dava certo, vermelho e preto também não. Por influencia de um tio, acabei virando Colorado e depois paranista. E assim foi crescendo a paixão”, contou o filho tricolor, que também transferiu o legado para seus descendentes. “No nascimento do meu filho falei que ele seria paranista e ele foi”, referindo-se ao filho William, de 30 anos, que hoje já é pai e o pequeno Arthur, de um ano, que também já veste as cores do Paraná Clube.
Paulo lembra de uma época em que deitava e rolava em cima dos irmãos. “Com tantos títulos que conquistamos na década de 1990, eu perguntava para meus irmãos: cadê o Coxa? Cadê o Atlético? Não existia mais! Só existia o Paraná”, lembrando dos anos dourados do Tricolor da Vila.
Em nome do pai
Apesar de todos se respeitarem e o amor em família prevalecer, é impossível que não haja provocações diante de tantas preferências. Os membros do clã Bittar não perdem a oportunidade de “alfinetar” uns aos outros. Se Zé é o primeiro a provocar. “Muitos falam que em 1985 foi um título horrível do Coritiba, contra o Bangu, mas quem fala isso disputou com o São Caetano”, disparou o pai, que não deixou de escutar a resposta atravessada do filho. “Em 2001 ele falou que ia estar morto e o Atlético não seria campeão. Ele está vivo, o Atlético foi campeão. E não foi contra o Bangu. Somos o primeiro campeão do século”, retrucou Sérgio.
As apostas também são recorrentes na família, afinal nada passa em branco na hora de tentar provar qual time é o melhor. “Apostei mil reais com o Edson que o Coxa não escaparia do rebaixamento em 2009. Ganhei, o Coritiba acabou sendo rebaixado de novo em 2017 e até agora não vi a cor desse dinheiro”, contou o atleticano Sérgio.
Entre os primos, já teve rubro-negro que vestiu o manto tricolor. “Quando o Atlético estava jogando na Vila Capanema a Libertadores e o Paraná fazia algum tempo que não jogava lá, apostei com o Guilherme quem colocaria mais torcedores no estádio. O primo que perdesse precisaria colocar a camisa do adversário. Naquela oportunidade, o Atlético colocou pouco mais de 9 mil e o Paraná 14 mil. Ganhei e ele precisou colocar a camisa do Paraná no churrasco da família. Foi lindo de ver”, lembrou o paranista, achando graça da situação embaraçosa em que deixou o primo rubro-negro.
A harmonia prevalece
Guilherme, um dos netos atleticanos do seu Zé, destacou que apesar dos diversos momentos em que todos tiram sarro uns dos outros, aprendeu que o mais importante de tudo é a união. “A paixão vem desde o nosso avô. A família toda é apaixonada por futebol, independente do time. As brincadeiras sempre fazem parte da família, isso é natural, mas sempre com respeito. É isso que o vô passou pra gente, assim como meu pai e meus tios que torcem para outros times” , comentou o torcedor do Rubro-Negro, que foi complementado pelo seu primo Willian.
“Meu pai me ensinou o que é caráter, o que é hombridade e acima de tudo, a jamais desistir. E tudo isso ele aprendeu com meu avô. Espero, do fundo do meu coração, ser para o meu filho, o que meu pai e meu avô são para mim”, falou o torcedor do Tricolor da Vila Capanema.
Cassio, o neto coxa-branca, também demonstrou toda a gratidão aos pais da família Bittar. “Agradeço muito por eles terem passado para mim a paixão pelo Coritiba. Meu avô e meu pai representam tudo na minha vida. O que hoje sou devo a eles”, concluiu emocionado.