Há cinco anos, quando começava a aparecer como potencial grande lutadora de MMA (Artes Marciais Mistas), a curitibana Cris Cyborg já falava que sua ambição era ser a melhor do mundo na modalidade. Na época, havia vencido torneios locais como o Estímulo de Muay Thai e o Storm Samurai. Foi quando começou a construir sua reputação de não temer a nada. Também tinha como meta ajudar a popularizar o esporte entre o público feminino. O tempo passou e a atleta conseguiu cumprir boa parte de seus objetivos. É contratada pelo StrikeForce, principal evento da modalidade com a participação de mulheres. Está cotada inclusive para participar do badalado Ultimate Fighting Championship (UFC), na aguardada primeira edição sem a presença exclusiva de homens.

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Um feito e tanto para quem começou a treinar artes marciais apenas aos 19 anos. Até então era apenas Cristiane Justino Venâncio Santos, atleta de handebol que decidiu aceitar o chamado de um amigo para conhecer a academia Chute Boxe. Pelo namoro com o também lutador Evangelista Cyborg, com quem hoje é casada, adotou o nome que ganhou força nos octógonos. Inclusive o aguardado desafio entre ela e a norte-americana Ronda Rousey chega a ser comparado por alguns fãs com o mais recente duelo entre Anderson Silva e Chael Sonnen, naquela que chegou a ser convocada como “Luta do Século” no MMA.

No currículo de Cris, 27 anos, dez vitórias e apenas uma derrota. O revés aconteceu justamente em sua primeira luta, contra Érica Paes, quando tinha apenas cerca de meio ano de treinamento. Depois colecionou conquistas, entre elas a do StrikeForce. Além de treinar, dá aulas e seminários aos praticantes do esporte tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil. Por tal razão veio recentemente ao país, onde tinha em seu cronograma a presença em estados como São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Distrito Federal.

Para um desses eventos agendados em Brasília, Cris inclusive deixou de cobrar qualquer tipo de cachê. Frequentadora da Igreja Batista em San Diego, ela aceitou o pedido de um pastor, após contato pelo Facebook, na internet, para realização de um seminário por um motivo que ela considera especial. “Ele me procurou e disse que estava fazendo um trabalho social, que estava arrecadando dinheiro para levar às crianças do Haiti”.

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Cris Cyborg poderá retornar ao octógono oficialmente apenas a partir de dezembro. Na sua última luta, venceu a japonesa Hiroko Yamanaka, no final do ano passado, mas acabou suspensa por um ano e o resultado da luta foi cancelado, devido ao uso de substância proibida. A lutadora conta que o equívoco ocorreu por ter tomado um suplemento alimentar. “Não fui a primeira e nem vou ser a última atleta. Acho que todo mundo faz erros, mas acho que o que aconteceu comigo pode servir de aprendizado pra outras pessoas. Acredito que Deus tem um propósito na tua vida, acho que se aconteceu isso comigo, era pra acontecer, não reclamo e continuo treinando”, disse.

Nesse tempo, no entanto, Cris não deixou de treinar. Foi inclusive campeã do Mundial de Jiu-Jitsu, em Long Beach, próximo de Los Angeles, Estados Unidos, como faixa roxa. Recentemente, também, assinou com o ex-lutador Tito Ortiz, integrante do Hall da Fama do UFC, seu novo empresário. “Falou que tinha muita vontade de cuidar da minha carreira, representar, me ajudar, e foi quando a gente conversou e entrou em acordo. Agora ele vai agenciar patrocínios, aparições em eventos e pra lutar”, disse a lutadora.

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Adversária de Cris é o Chael Sonnen de saias

Assim como a luta entre Anderson Silva e Chael Sonnen no Ultimate Fighting Championship (UFC) ocorrida nesse ano, com vitória do brasileiro, o possível desafio entre Cris Cyborg e a norte-americana Ronda Rousey está entre os mais aguardados pelos fãs de MMA (Artes Marciais Mistas). Porém, principalmente por assuntos relacionados à pesagem, esse combate ainda não tem data pra acontecer.

Deixar claro que está disposta a enfrentar a norte-americana no octógono &e,acute; um fato notório da lutadora paranaense. No entanto, Rousey até o momento se utiliza de imposições de peso e não mostrou interesse em um diálogo efetivo para encarar Cyborg. “Eu luto de 65 quilos. Já bati 63, então falei que poderia bater 63, que é uma categoria abaixo, que ela está comigo. Só que 61 eu nunca bati. Não posso cumprir uma coisa que nunca fiz, entendeu”, disse Cris, sobre a adversária.

Até o momento, Ronda Rousey se manteve apenas alfinetando Cris. A norte-americana já havia feito o mesmo tendo em sua mira uma socialite e um ex-namorado. Nem mesmo o nadador compatriota Michael Phelps, maior vencedor de medalhas olímpicas no mundo, escapou: “Ele só sabe nadar”, disse à imprensa local.

Em contrapartida, Cris Cyborg mantém o espírito esportivo. “Nunca escolhi adversária, sempre deixei o evento escolher, e o meu papel é só treinar e ficar focada na próxima luta”, conta ela, com a autoridade de quem conquistou sua reputação apenas lutando. “Todo mundo fala que ela (Ronda) é o Sonnen do MMA feminino. Com a diferença que ele fala, mas entra no ringue e luta. Tudo bem que ele falou sobre o Brasil e tal, mas é diferente. Ela vai e luta” comparou, avisando que espera somente o chamado para resolver as diferenças. “Acho que essa possível luta deve acontecer, não sei em que peso. Acredito que o evento quer ver, os fãs querem ver, e vai ser um prazer lutar representando o Brasil. É isso. Acho que é esperar, aguardar e continuar treinando”,

Apesar da situação, Cris chegou até mesmo a elogiar a lutadora que a escolheu como adversária. “Acho que ela pode mais. Então ela fala muito e todo mundo que acompanha ela sabe”, pontuou a paranaense, que de certa forma também defendeu a norte-americana sobre o fato de dizer que Cyborg só luta contra atletas mais leves. “Na verdade, todas as lutas que lutei, eu bati o peso. Ela está falando coisa nada a ver. Acho que ela fala sem pensar”. Sem medo, a curitibana completa: “Acredito que ela vai ter o mesmo fim do Sonnen”.

Um exemplo pra muitas mulheres

Uma das queixas antigas de Cris Cyborg era a dificuldade na hora de encontrar adversárias para lutar. Atualmente, porém, a curitibana comemora o fato de ver o crescimento do gênero no MMA (Artes Marciais Mistas). Não apenas isso. A desportista serve como referência para muitas mulheres. É bem sucedida profissionalmente, cuida dos afazeres do lar e ainda guarda parte de seu tempo para participação em ações sociais.

Após infância na Vila São Pedro, em Curitiba, Cris passou por vários bairros da capital paranaense. Atualmente reside em San Diego, nos Estados Unidos. Por lá ela aguarda a confirmação de sua próxima luta, a partir de dezembro desse ano, mas não esconde o desejo de lutar em uma edição do Ultimate Fighting Championship realizada no Brasil. “Imagina aqui, em um UFC Rio, eu lutar com ela (Ronda Rousey, sua adversária). Vai ser um prazer, vai ser maravilhoso. Eu queria muito (um dia atuar) no UFC, mas pensava o que ia fazer uma atleta pra lutar lá”, esclarece, sobre o fato de disputar uma modalidade onde ainda prevalece a presença masculina.

Apesar de hoje viver uma situação favorável no MMA, Cris Cyborg lembra que nem sempre foi assim. No passado, ela chegava a cogitar a existência de um torneio com lutas de modalidades alternadas, como MMA, Jiu-Jitsu, Boxe, Muay Thai e Wrestling. Era uma possível solução para dois sonhos antigos.

Um deles era o da existência de um até então inédito card, como são chamadas as listas de participantes de uma determinada competição, exclusivo de mulheres. O outro era simplesmente o de poder competir com novas pessoas, algo que quando começou a treinar era difícil de conseguir.

Sobre ambos os assuntos, Cris Cyborg diz ter motivos para comemorar. Ao menos por uma evolução. “Acho que está crescendo o número de lutadoras. Não vai ser mais um problema isso aí”, comemora. “Agora tem um evento de MMA feminino, o Invicta. É um evento que está apoiando as mulheres, então acho que o primeiro passo é ver um evento que quer dar oportunidade só pras mulheres”.,

Apesar de já ter sido considerada melhor do mundo naquilo que faz, Cris Cyborg deixa claro ser uma mulher que vive realidade similar a de muitas. “Chego em casa e faço o almoço, limpo a casa, lavo a roupa, treino, cuido do marido (Evangelista Cyborg, também lutador), volto, cuido da criança (a sobrinha Gabriela, sete anos, morou nos EUA com Cris, que não esconde o desejo em transformá-la em sua sucessora no MMA). Acho que a gente faz o trabalho dobrado”, conta.

Exemplo

Por ser uma pessoa vista como gente boa entre os amigos, bem sucedida profissionalmente, e que reserva o estilo de agressividade apenas para as lutas, Cris serve também de exemplo para muitas mulheres. Especialmente àquelas que, além dos afazeres do dia a dia, se dedicam também a praticar MMA. “Elas fazem tudo e ainda dão conta de treinar, se dedicar, admiro muito isso, eu sou como qualquer uma delas”.

Cris Cyborg conta que, desde que se mudou para os Estados Unidos, seu cotidiano mudou apenas no ritmo de treinamentos, que duram em média cinco horas diárias. “Eu gosto de ficar com a família, sair pra almoçar, subir no parque, passear com meu cachorro, continuo gostando de rap (seu predileto no momento é Pregador Luo, que mescla assuntos sobre sociedade e religiosidade), gosto de música. Não mudou muito a rotina”.