A quinta-feira (24) mostrou mais uma vez a cara do futebol brasileiro. Sem unidade, sem racionalidade e sem empatia, 20 clubes, algumas federações estaduais e a CBF se reuniram remotamente pra discutir a volta do público aos estádios no Brasileirão. E ficou mais claro ainda o que se sabe: ninguém tá preocupado com torcedores, questões sanitárias, risco de contágio do coronavírus. O que interessa é se dar bem.
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Esse espírito de “farinha pouca, meu pirão primeiro“, que existe desde que Charles Miller trouxe a primeira bola para o País, vai continuar. Só ingênuos acreditam que haverá uma união dos clubes no futebol brasileiro para qualquer assunto. De torcedores no estádio a adiamento de partidas. E, sim, por direitos de transmissão. Só ver como a reunião acabou: com discussão, quase briga e nada decidido – o que, convenhamos, nesse momento é até melhor.
Não existe um único dirigente do futebol brasileiro que se preocupe com o desenvolvimento do esporte, com o crescimento do Brasileirão como competição, com o aumento do interesse do público. O que querem saber é de passar a perna no outro, alfinetar os rivais, lutar por benefícios próprios e, se não conseguir nada disso, culpar os outros cartolas ou a imprensa. Ou até mesmo o torcedor, sempre o lado mais fraco da história.
Um retrato do futebol brasileiro
A reunião desta quinta foi pedida pela CBF depois da ridícula iniciativa da prefeitura do Rio de Janeiro em liberar a presença de torcedores no Maracanã a partir de 4 de outubro, no jogo Flamengo x Athletico. É bom reforçar: não era uma autorização para a cidade, mas para apenas um estádio. Uma medida que beneficiaria um clube, que se vê prejudicado por não ter torcedores em seu estádio.
A grita foi generalizada. E não porque colocar 20 mil pessoas em um estádio neste momento é um absurdo tão grande que é difícil não reagir com raiva a uma ideia dessas. E sim porque tinha alguém levando vantagem – no caso, o Flamengo. Foi essa a reação do Corinthians, por exemplo. E poucos dirigentes tratavam da questão sanitária. E quando tratavam, ela era uma situação subalterna à necessidade de isonomia na liberação dos estádios.
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Não, não dá pra jogar com público ainda. Como disse o secretário da Saúde, Beto Preto, talvez não dê pra pensar nisso até o final do ano. Não é porque há quem use o futebol como busca de popularidade na política que temos que aceitar isso de boa. É arriscado. Recordem o que aconteceu em Atalanta x Valencia, a “bomba biológica” da pandemia do novo coronavírus na Europa. E se dá pra ter torcida em estádio, porque os corajosos cartolas não se reuniram presencialmente? Ah, aí tem que tomar cuidado, né.
Dois pesos e duas medidas
É simbólico que a tentativa desastrada dos dirigentes – em união com a prefeitura do Rio, do governo fluminense e do Ministério da Saúde, lembremos – tenha sido seguida do surto de covid-19 nos jogadores do Flamengo. É uma situação dramática sim, você ver um grupo inteiro sendo diagnosticado sem ter como agir. E, em um país de futebol mais sério, o jogo do time carioca contra o Palmeiras no domingo (27) já teria sido adiado.
Mas no futebol brasileiro nada é normal. A diretoria do Flamengo ficou na esquizofrênica situação de defender que 20 mil pessoas vão ao Maracanã mas que não dava para ter jogo por conta dos contaminados no elenco. O Palmeiras, inicialmente contra a torcida nos estádios, não quer nem saber do risco de covid-19 e quer jogar. A CBF, como sempre, não definia, tentava chegar a um ponto em comum, até informar que o jogo iria acontecer.
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As discussões mostram que não há interesse em termos uma competição de verdade, com regras (e elas sendo seguidas), com igualdade de direitos para todos os clubes e interessante para o mercado e para o público. Por isso, não esperem que os cartolas, do nada, vão se unir para uma nova configuração de direitos de transmissão. Na hora do vamos ver, cada um vai querer o seu. Os outros participantes? O futebol brasileiro? Que se lasquem, né?