Está feia a coisa. A frase simples pode ser ouvida a toda hora, em cada canto do País. Mas o Coritiba vive, mais do que nunca, um momento de ?está feia a coisa?. A derrota para o Corinthians por 1×0, ontem, no Couto Pereira, foi uma ducha fria na mobilização alviverde para fugir da zona de rebaixamento. O resultado deixa o Coxa entre os quatro últimos colocados do Campeonato Brasileiro (está na 19.ª posição), e obriga a equipe a vencer pelo menos três das quatro últimas partidas. O risco de cair para a segunda divisão nunca foi tão grande.
O clima era o esperado para o confronto entre o líder do Brasileiro e uma equipe que lutava para escapar do rebaixamento – uma mistura de alta tensão e muita empolgação. A torcida do Coritiba, que entendera o apelo da diretoria durante a semana e comprara todos os ingressos disponíveis em três dias, começou a cantar uma hora antes da partida começar, criando o ambiente esperado pelo técnico Márcio Araújo, que previa ver o público ?acreditando? nos jogadores.
O primeiro tempo foi de muita marcação e pouco futebol. Tanto corintianos quanto coxas se preocupavam muito com as jogadas adversárias e esqueciam de criar. O Cori, particularmente, abdicava de ir ao ataque devido à extrema cautela defensiva. Marcado por Marcelo Mattos, Caio permaneceu anulado, e sem ele o time ficava dependente de Capixaba e Jackson, que viviam tarde negativa. Renaldo e Maia estavam isolados.
Sem Tevez e Gustavo Nery, o Corinthians era uma equipe previsível – apoiava-se na velocidade de Rosinei, Nilmar e Jô e nas jogadas de bola parada. Os lançamentos de Carlos Alberto foram bem acompanhados pela zaga alviverde, mas toda bola alçada à área do Coxa era um tormento. Aos 19, Carlos Alberto errou o lance sozinho. Mas quatro minutos depois, em lance idêntico, ele não falhou, e abriu o placar.
O gol corintiano desnorteou o Coritiba, que não sabia sair da bem-armada defesa dos paulistas – apesar de frágil nas peças, era sólida no conjunto.
O tempo passou a ser adversário dos donos da casa, que sofriam com a pressão inevitável de não só buscar o empate, como também de correr pela vitória. Mesmo tendo maior posse de bola, o Cori não criou lances de perigo, enquanto o Corinthians, que jogava ?sossegado?, levou perigo a Douglas em alguns contra-ataques.
Márcio Araújo fez uma alteração no intervalo – sacou Maia, que não tinha condições de jogo, e colocou Alcimar. O time melhorou, passou a pressionar o Timão no próprio campo, fazendo algo que poderia ter feito ainda no primeiro tempo. Mas as chances eram escassas, e a equipe foi caindo gradativamente de produção.
A última cartada do treinador foi a entrada de James e Peabiru nos lugares de Nascimento e Renaldo. Só que a iniciativa de desmontar o sistema com três zagueiros foi tumultuada após a expulsão de Flávio – ele se desentendeu com Betão e acabou indo mais cedo para o chuveiro, em uma decisão contestada do árbitro Álvaro Azeredo Quelhas.
O que estava difícil tornou-se quase impossível com um jogador a menos. Sofrendo com seu time na zona de rebaixamento, o torcedor coxa ainda tinha que ouvir os fiéis corintianos a gritar ?é campeão? e ?olé? em pleno Alto da Glória. A partir de agora, para o Coritiba todo jogo será uma batalha pela vida e pela permanência na divisão de elite do Campeonato Brasileiro.
Márcio elogia equilíbrio e ?prepara? vitórias
Era um contraste evidente nos rostos de torcedores e jogadores de Coritiba e Corinthians. Do lado alvinegro, a felicidade de vencer fora de casa e dar um passo decisivo para a conquista do título brasileiro. Do lado coxa, lágrimas de muitas das 30 mil pessoas que esperavam uma vitória e a extrema preocupação por conta da entrada definitiva na zona de rebaixamento. Agora, nem há muitas contas a fazer – o Coxa tem que vencer jogos, o quanto antes.
?Não temos segredo. Temos que ganhar?, resumiu o meia Caio, que foi muito marcado por Marcelo Mattos. ?Claro que precisamos ter tranqüilidade, mas o momento é de vencer de qualquer jeito?, completou o meia Luís Carlos Capixaba. A partida contra a Ponte Preta, quinta, passa a ser dramática – o Cori precisa vencer e torcer por um tropeço do Figueirense para sair da zona perigosa.
Os jogadores deixaram claro que a derrota veio por conta de uma falha coletiva. ?A gente levou um gol de bola parada, foi um erro nosso?, disse o atacante Alcimar, um dos poucos que se salvaram da atuação ontem. ?Nós estávamos preparados para esperar cinco jogadores deles, mas eles vieram com seis e não soubemos marcar. Um lance destes acabou sendo fatal?, comentou o goleiro Douglas.
Márcio Araújo preferiu lembrar que o Cori conseguiu equilibrar o jogo. ?Não houve superioridade, e sim um lance decisivo de bola parada. Enfrentamos um time com sorte de campeão?, lamentou o treinador. ?Não vou ficar justificando com nada. Não trabalhamos com máquinas, às vezes os jogadores não rendem o que se espera, mas isto acontece. E não tem nada do juiz?, disse.
O presidente Giovani Gionédis confessou a preocupação, mas manteve a calma. ?Não adianta ser passional neste momento. Enfrentamos o líder do campeonato, um time de qualidade. A vitória que faltou foi a do Brasiliense, que faria com que o Coritiba ficasse fora da zona de rebaixamento com qualquer resultado hoje (ontem)?, avaliou.
O dirigente também não criticou a arbitragem. ?Eu cobrei do Flávio. Ele é um jogador experiente, e não poderia entrar na provocação do Betão?, lembrou Gionédis, que elogiou a torcida. ?Eles têm razão de estar agitados, mas estão de parabéns pela atitude durante o jogo, apoiando a todo momento?.
O técnico não quis falar em ?ameaça?. ?Não estou aqui para pensar em rebaixamento, mas sim em recuperar uma equipe que não merece estar nesta posição. Não entregamos os pontos, vamos buscar a vitória sobre a Ponte e vencer fora de casa. O Coritiba tem que ficar na primeira divisão e vai ficar?, finalizou Márcio.
Decidido?
Muito perto de ser campeão brasileiro, o Corinthians festejou o resultado, que veio após a eliminação na Copa Sul-americana e a desgastante viagem de volta do México. ?Se a gente quer ser campeão, não podemos reclamar de cansaço, nem deixar de lutar. Tem que ser assim, como foi contra o Coritiba?, afirmou o meia Rosinei.
Torcida fez a sua parte. Já os pangarés…
O clima era de decisão no Couto Pereira. A torcida alviverde atendeu ao apelo da diretoria, aproveitou o desconto no preço dos ingressos e compareceu em peso para tentar ajudar o Coritiba a se afastar do rebaixamento. Empolgada com a campanha do Timão, a Fiel também estava em grande número, dando ao jogo um ambiente de clássico.
Desde o início da tarde o movimento era intenso nas ruas do Alto da Glória. A galera coxa-branca estava confiante em uma vitória e chegava ao Couto com grande barulho de gritos e buzinas. ?O Coxa nunca irá para a segunda divisão. A nação alviverde vai ajudar a tirar o time dessa situação?, dizia o estudante Marco Antônio Stengel, 21 anos, ao entrar no estádio.
A torcida corintiana não ficou para trás e mobilizou uma grande caravana desde São Paulo. ?Vieram de 30 a 40 ônibus. Muitos chegaram cedo, mas alguns ainda estão na estrada. Por enquanto está tudo tranqüilo e só registramos ocorrências leves?, afirmava minutos antes do jogo o major Correia, que comandava a operação da Polícia Militar.
Dentro do estádio, tudo estava preparado para uma grande festa em verde e branco. Antes da partida, aplausos para o campeão mundial de vale-tudo Maurício Shogum. E vaias para Antônio Lopes, que, mesmo fora do comando técnico do Coxa há quase seis meses, não foi perdoado pela galera alviverde. Kia Joorabchian também não escapou. O chefe da MSI, parceira do Timão, teve que atravessar o gramado para chegar ao camarote da diretoria corintiana e não foi poupado dos xingamentos.
Durante o jogo, bem que a torcida tentou ajudar o Cori. Mas o time não correspondeu ao apoio das arquibancadas. Jogando um futebol feio e burocrático, o time acabou com o ânimo da galera coxa-branca e a festa acabou ficando por conta da parcela alvinegra do Couto, que deixou o palco do jogo aos gritos de ?é campeão?.
Sem violência
Nenhuma ocorrência grave relacionada com o jogo foi registrada pela Polícia Militar.
O maior problema aconteceu na BR-116. Quatro ônibus da torcida corintiana foram barrados pela Polícia Rodoviária Federal e não conseguiram chegar a Curitiba. Ao redor do estádio, o ponto negativo foi a atuação dos cambistas. Ingressos para o jogo contra a Ponte Preta, na próxima quinta, eram vendidos como sendo do jogo de ontem. Alguns bilhetes falsos também foram identificados nas bilheterias.
Dá-lhe contas, reza, patuá…
A semana será de muita tensão para a torcida alviverde. Além da partida do Coritiba diante da Ponte Preta, na quinta-feira, outros cinco jogos têm influência direta na luta contra o rebaixamento.
Na quarta-feira, o torcedor coxa-branca terá que vestir três camisas diferentes. O Vasco vai a Florianópolis para enfrentar o Figueirense, que está logo acima do Coxa na tabela, com dois pontos a mais. O Inter, ainda sonhando com o título, recebe o Brasiliense, que está quatro pontos atrás do Coritiba. E o Corinthians visita o São Caetano, que vem despencando na tabela e está junto com o Figueira, com 44 pontos.
Mas não vai bastar ser cruz-maltino, colorado e corintiano. Na quinta, o Coxa também terá que virar tricolor e botafoguense. O Botafogo vai até Belém e pode afundar ainda mais o Paysandu. E o Fluminense pode ser o carrasco do Atlético-MG. Se perder no Rio, o Galo recebe o Cori, no próximo domingo, praticamente já na segunda divisão.
Mas nada adianta ficar secando os adversários se o Coxa não fizer sua parte contra a Macaca. Por isso, equipe e diretoria contam com a presença da galera no Couto Pereira. O jeito é torcer muito, e rezar mais ainda.
CAMPEONATO BRASILEIRO
2º Turno – 38ª Rodada
Em campo
Local: Couto Pereira
Horário: 16h
Árbitro: Álvaro Azeredo Quelhas (FIFA-MG)
Assistentes: Helberth Costa Andrade (MG) e Márcio Eustáquio Santiago (MG)
Gol: Carlos Alberto, 23´ do 1.º tempo
Cartões amarelos: Reginaldo Nascimento Douglas, Flávio (CFC); Eduardo, Wendel, Carlos Alberto, Betão (COR)
Cartão vermelho: Flávio (CFC)
Renda: R$ 185.430,00
Público: 31.050 (28.936 pagantes)
CORITIBA 0X1 CORINTHIANS
Coritiba
Douglas; Anderson, Flávio e Reginaldo Nascimento (James); Jackson, Peruíbe, Luís Carlos Capixaba, Caio e Ricardinho; Maia (Alcimar) e Renaldo (Marcelo Peabiru). Técnico: Márcio Araújo
Corinthians
Fábio Costa; Eduardo, Marinho, Betão e Hugo (Bruno Octávio); Marcelo Mattos, Wendel e Rosinei; Carlos Alberto (Dinélson, depois Fabrício); Nilmar e Jô. Técnico: Antônio Lopes
