Não é nada raro. Nas ruas de Moscou, torcedores enrolados nas bandeiras de seus países cercam jovens russas ou que não entendem a sua língua para gravar e postar vídeos de teor machista que estão despertando indignação nas redes sociais pelo mundo.
No episódio mais comentado até o momento, um grupo de brasileiros cerca uma mulher russa cantando essa é bem rosinha, em alusão à cor de seu sexo. Sem saber do que se trata, ela canta junto na cena que acabou viralizando e provocou comentários de repúdio em todo o país.
Uma série de mulheres, entre elas as atrizes Bruna Linzmeyer e Mônica Iozzi e a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), denunciaram o comportamento flagrado no vídeo como exemplo de machismo e misoginia.
Em Moscou, os diplomatas da embaixada brasileira relatam já ter recebido emails criticando os autores do vídeo em questão, enquanto nas redes sociais circulam pedidos que aqueles homens sejam punidos e expulsos da Rússia.
Essa ação, no entanto, dependeria de uma queixa formal da vítima, que não foi registrada. Também de acordo com a embaixada brasileira em Moscou, não houve contato do governo russo com o Itamaraty sobre esse episódio.
Em nota, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro não comentou esse incidente específico, mas reiterou que a imensa maioria dos torcedores brasileiros é pacífica e respeitosa, lembrando que publicou um guia com recomendações para cidadãos que viajam à Rússia para seguir a Copa.
Um dos homens que aparece nas imagens do vídeo é Diego Valença Jatobá, um advogado pernambucano que já foi secretário de Turismo em Ipojuca, nos arredores do Recife, e que já postou outras fotos polêmicas nas redes, entre elas um selfie que fez segurando um maço de dólares.
Ele fechou sua conta no Instagram e não responde a mensagens desde que o vídeo em que aparece com outros quatro torcedores vestindo a camisa da seleção brasileira passou a ser atacado na internet.
Mas Valença Jatobá e seus amigos não são os únicos a assediar mulheres na Rússia durante o Mundial. O comportamento deles, aliás, segue um padrão que se repete nas ruas moscovitas e de outras cidades que recebem esse torneio.
Enquanto brasileiros repudiam o vídeo que veio à tona no último final de semana, torcedores argentinos e peruanos os latino-americanos estão entre os que mais compraram ingressos para a Copa vêm postando imagens com o mesmo teor obsceno.
Num vídeo que circula entre grupos de amigos argentinos, duas russas são ensinadas a se oferecer para fazer sexo oral com torcedores do país usando uma expressão vulgar corrente na Argentina.
Esse também não é o único vídeo. Muitos outros torcedores vêm copiando os primeiros que viralizaram e repetindo a estratégia com russas e outras mulheres que não falam a mesma língua que eles.
Um torcedor peruano, por exemplo, fez vídeos de mulheres russas e dinamarquesas em que as faz dizer que estão dispostas a transar com ele, além de várias mensagens de cunho mais pornográfico.
O caso do homem identificado como Antolin Fernández Chacón e de outro torcedor de seu país que aparece num vídeo tentando agarrar uma mulher à força também teve repercussão negativa na internet e na imprensa do Peru.
Torcedoras, aliás, não são as únicas vítimas de assédio. Em mais um vídeo que viralizou na Copa, a jornalista colombiana Julieth González, do serviço da Deutsche Welle em espanhol, foi abraçada e beijada por um homem enquanto entrava no ar ao vivo na TV.
Um sujeito se aproveitou disso e se atirou em cima de mim. Ele me deu um beijo e tocou meio seio, disse González. Tive de continuar e depois tentei ver se ele continuava por ali, mas já tinha ido.
Em outro vídeo visto pela reportagem, uma jornalista russa que não quis ser identificada também sofreu constrangimento na Fan Fest em Rostov. Ela foi gravada rodeada de torcedores brasileiros dizendo palavras como delícia, que ela não entendia.
Na Rússia, não há lei que criminalize o assédio sexual, em especial no ambiente de trabalho. Nos últimos meses, às vésperas da Copa e depois de um episódio envolvendo um político acusado de assediar jornalistas, a parlamentar Oksana Pushkina vem pressionando para criar essa legislação, mas nada saiu do papel.