Atenas – A natação brasileira encerrou ontem a sua participação nas Paraolimpíadas de Atenas do mesmo modo que começou: com Clodoaldo Francisco da Silva erguendo os braços e comemorando no ponto mais alto do pódio.
Ontem, último dia de competições da natação e penúltimo dos Jogos, Clodoaldo abusou: levou o ouro nos 50m livre – melhorando em quase um segundo o recorde mundial que já era seu – e, duas horas depois, foi decisivo para que o Brasil conquistasse o ouro no revezamento 4×50 metros medley – ele foi o último a cair na água e levou a medalha junto com Francisco de Assis Avelino, Adriano Gomes de Lima e Luiz Silva.
Com os resultados de ontem, Clodoaldo alcançou a impressionante marca de 6 medalhas de ouro e uma de prata nas Paraolimpíadas de Atenas. O que já provocou a comparação com o norte-americano Michael Phelps, que também levou 6 de ouro além de 2 de bronze, nos Jogos Olímpicos, disputados em agosto.
Além da incrível capacidade para nadar em alta velocidade, Clodoaldo vinha impressionando pela frieza antes, durante e depois das provas. Medalhas, elogios, recordes, nada parecia abalá-lo. Mesmo depois de levar o quinto ouro em Atenas, nos 50m livre (35s41, novo recorde mundial), não demonstrou grande emoção. “Gente, não vou poder conversar muito com vocês. Daqui a pouquinho tenho de nadar os 4x50m medley com a rapaziada, me desculpem, por favor”, disse o nadador, acelerando sua cadeira de rodas.
Depois do ouro no revezamento, no entanto, o grande campeão desatou a chorar abraçado com os companheiros. ?Clodoágua?, como é chamado na equipe brasileira, mostrou que não é de gelo. “Minha emoção é muito mais pelos companheiros do que pelo ouro. Só nós sabemos o que passamos para chegar até aqui. Abrimos mão de muita coisa, nos dedicamos ao máximo e agora estamos recebendo o nosso prêmio. É muita emoção”, afirmou Clodoaldo, entre soluços.
Ajudar a conquistar o ouro parecia ser a homenagem que ele queria fazer à equipe. Aos 25 anos, Clodoaldo Francisco da Silva, um jovem de Natal que usou a natação como forma de terapia – ele sofreu paralisia cerebral ao nascer e praticamente não tem movimento nas pernas -, é considerado um fenômeno da natação paraolímpica. “Só de nadar ao lado dele já é uma vitória” , disse Francisco Avelino, uma vítima da pólio aos 9 meses de idade.
Assim que terminou a prova, Francisco Avelino chamou Luiz e Adriano para, juntos, darem um abraço no companheiro. “Clodô é o mais sério e mais profissional atleta do paraolimpismo brasileiro. Tínhamos a certeza de que ele nos ajudaria muito na prova de hoje (ontem)”, contou Francisco Avelino.
Clodoaldo ajudou mesmo, mas Francisco Avelino, Luiz (má formação nas pernas e no braço direito) e Adriano (paraplégico) também fizeram a sua parte. Os três sabiam que se entregassem os últimos 50m para os braços de Clodoaldo no mínimo em igualdade com os concorrentes mais fortes, Japão e Espanha, a medalha estaria ganha. E foi assim. Luiz Silva manteve o equilíbrio que Avelino e Adriano haviam conquistado em suas etapas e Clodô fez o resto, disparando para o ouro e fechando a prova em 2m37s46. Japão e Espanha vieram na seqüência. Um resultado distante do recorde mundial (2m3654), mas bem superior ao paraolímpico (2m39s94).
Gustavo Arantes, técnico da equipe brasileira de natação nas Paraolimpíadas, estava orgulhoso após a prova. “Além de forte e excepcional nadador, Clodoaldo é firme e determinado. Ele colocou na cabeça que disputaria o ouro em todas as provas e recebeu seu prêmio, seis medalhas de ouro e uma de prata.”
Humilde, Clodoaldo ouvia as palavras do técnico entre as perguntas dos repórteres que foram esperá-lo ao lado da piscina. Recuperado da emoção, ele foi rápido e objetivo quando teve de responder à inevitável pergunta de como fica o seu futuro e o do desporto paraolímpico no Brasil. “Acabou as Paraolimpíadas. Amanhã (hoje), volto a ser o Clodoaldo de sempre.” Clodoaldo Francisco da Silva mora num bairro afastado do centro de Natal e toma oito ônibus para poder ir treinar diariamente. Sobrevive com os pouco mais de R$ 4 mil da bolsa e da ajuda de custo que recebe do Comitê Paraolímpico Brasileiro como membro da equipe nacional e medalhista de ouro.
