Após apontar irregularidades, como sobrepreço e superfaturamento, a Caixa Econômica Federal bloqueou R$ 478 milhões em transferências de recursos federais para o município do Rio de Janeiro referentes a obras dos Jogos Olímpicos de 2016. Os repasses estão relacionados à construção de instalações esportivas no Parque Olímpico da Barra da Tijuca (Centro Olímpico de Tênis, Velódromo, Centro de Esportes Aquáticos e Arena do Futuro) e no Complexo Esportivo de Deodoro. Todas as obras já aconteceram, mas os prazos para prestação de contas e financiamento estão vencendo somente agora.
As informações referentes ao bloqueio dos repasses constam em inquérito civil em andamento no Ministério Público Federal. O município executou a obra e apresentou a conta à Caixa, que deveria liberar o recurso – o banco é o repassador das verbas da União. A transferência de R$ 478 milhões, no entanto, foi bloqueada após o banco encontrar irregularidades na prestação de contas.
Em nota enviada ao Estado, a Procuradoria-Geral do Município do Rio informou que “não há sobrepreço ou superfaturamento, o que há são divergências entre a tabela de custos utilizada pela Caixa, muitas vezes defasada ou incompleta, e o custo efetivamente gasto”.
Somente instalações esportivas dos Jogos do Rio consumiram R$ 7,2 bilhões. Os custos foram divididos entre iniciativa privada e os governos federal e municipal. Ao todo (incluindo a gestão do Comitê Rio-2016 e obras de infraestrutura da capital fluminense), a Olimpíada saiu por R$ 41 bilhões.
No dia 27 de julho, a Caixa informou a representantes do “Grupo de Trabalho Olimpíada” da Procuradoria da República no Rio ter encontrado “uma série de graves problemas” nas contas apresentadas pelo município. No dia 13 de agosto, a última atualização dos valores apontava que o montante bloqueado era de R$ 477.957.605,71.
“O município adiantou os recursos junto às construtoras. A responsabilidade pelo custo destas obras é da União, que tem de ressarcir o município”, alega a Procuradoria-Geral do Rio, em nota.
O relatório apresentado pela Caixa, por exemplo, traz uma planilha na qual são apontados R$ 180 milhões de itens comprados acima do valor aprovado na construção do Complexo Esportivo de Deodoro. Há, ainda outros R$ 2 milhões em “inconsistência de medição”.
No Centro de Esportes Aquáticos, o sobrepreço chegou a R$ 33 milhões. A Caixa, inclusive, indeferiu pedido para prorrogação do acordo por entender que não havia motivação técnica que justificasse o desbloqueio dos recursos.
Situação semelhante ocorre com o Velódromo. Somente em itens medidos acima do valor aprovado o banco identificou mais de R$ 11 milhões. A diferença é que o espaço precisou de obras complementares que ficaram pendentes.
“As obras dos Jogos terminaram em 2016, mas isso está se arrastando até agora porque os contratos possuem prazos para serem apresentadas as justificativas e agora alguns desses contratos estão se encerrando, o que significa que o bloqueio passa a ser definitivo. As explicações do município não foram aceitas e a Caixa diz que não vai liberar o recurso”, explica o procurador da República Leandro Mitidieri, coordenador do “Grupo de Trabalho Olimpíada”.
Com a recusa da Caixa em fazer os repasses da União, a prefeitura do Rio pagou por obras que, na verdade, deveriam ser custeadas pela União. “O município pegou recursos próprios dele, alguns e-mails confirmam isso, e pagou. Algo que ia ser pago com recursos federais está sendo pago com recursos municipais”, diz Mitidieri.
Por meio da sua assessoria de imprensa, o banco informou ao Estado que não iria comentar a ação em andamento no MPF.
INFILTRAÇÕES E FIAÇÃO EXPOSTA NAS ARENAS – Mais de 1,5 mil vícios construtivos (fiação exposta, instalações elétricas com risco à segurança, pisos danificados e casos de infiltração) foram detectados no Parque Olímpico e necessitam de reparo. A Aglo (Autoridade de Governança do Legado Olímpico), autarquia vinculada ao Ministério do Esporte responsável por administrar as instalações esportivas do Parque Olímpico da Barra, alega que já enviou diversas notificações à prefeitura do Rio e, sem resposta, resolveu que vai tomar as medidas judiciais cabíveis. No entendimento da Aglo, a prefeitura deveria realizar os reparos ou acionar as construtoras responsáveis pelas obras.
A AGU (Advocacia Geral da União) orientou a Aglo para que seja assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) no qual serão estipulados prazos e penalidades em caso de descumprimento das obrigações em relação às obras que devem ser feitas no Parque Olímpicos.
Em dezembro de 2016, acordo de transferência do Parque Olímpico foi assinado entre a prefeitura e o Governo Federal e prevê que a União administre o local por 25 anos, prazo prorrogável por igual período, totalizando cinco décadas. Ficou a cargo da Aglo administrar as Arenas Cariocas 1 e 2, o Centro Olímpico de Tênis e o Velódromo.
O planejamento inicial era que a iniciativa privada cuidasse e bancasse o parque, mas o plano não deu certo. Apenas uma empresa demonstrou interesse, mas as garantias financeiras foram rejeitadas. A solução encontrada foi entregar a gestão para a União, que criou a Aglo no ano passado.