Poucas horas depois de conquistar a medalha mais esperada da sua história olímpica, o Brasil ganhou neste sábado à noite também a mais inesperada. Apenas o 51.º colocado do ranking mundial do tae kwon do, Maicon Siqueira levantou o Arena Carioca 3 e, numa campanha de três vitórias, recebeu o bronze na categoria para atletas de mais de 80kg. Na luta que valeu o pódio, ele venceu o britânico Mahama Cho, de virada, por 5 a 4, depois de entrar no último round perdendo de 3 a 1 A medalha é a 18.ª do Brasil, que ainda vai ganhar mais uma no vôlei masculino.

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Até o inesperado pódio olímpico, Maicon nunca esteve sequer entre os principais lutadores do País. No ranking nacional, é apenas o quarto da categoria +87kg, que é fundida com a subdivisão para atletas de 80 a 87kg no programa olímpico. E, fosse por qualidade técnica, o Brasil nem teria representantes nessa categoria no Rio-2016.

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O caminho para que ele chegasse ao Rio-2016 começou por uma proposta ainda mal explicada da Confederação Brasileira de Tae Kwon Do (CBTKD), que escancarou as portas para que Anderson Silva, o Spider, lutador de MMA, defendesse o Brasil na modalidade na Olimpíada.

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A entidade tinha direito a quatro vagas na Olimpíada por convite, duas por gênero, e precisava apontar onde as alocaria. Para atrair Anderson, definiu que a +80kg seria uma delas. Essa decisão tirou a possibilidade de Edval Marques, campeão olímpico da juventude na até 68kg de disputar o Rio-2016.

O Spider, depois, desistiria da ideia de disputar a Olimpíada para “focar no MMA” em um momento em que estava suspenso por doping. A CBTKD viu seus planos ruírem e passou a se concentrar em escolher um atleta para representar o País na categoria, promovendo uma seletiva dividida em três etapas e concluída em março. Novamente Maicon era o azarão, mas venceu André Bilia e Guilherme Felix, os favoritos.

Mineiro de Justinópolis, um distrito de Ribeirão das Neves (MG), na Grande Belo Horizonte, Maicon é o caçula de uma família de nove irmãos e precisou trabalhar como servente de pedreiro e garçom para seguir na modalidade. Desde 2013 ele treina em São Caetano do Sul, na Two Brothers Team, uma das principais equipes do País.

Depois de uma Olimpíada tão militar do Brasil, Maicon dá um alento para um outro tipo de modelo de desenvolvimento esportivo: o universitário. O lutador tem o patrocínio de uma faculdade de São Caetano do Sul (SP), onde estuda Geografia, e, no ano passado, foi medalhista de bronze na Universíada, a chamada “Olimpíada Universitária”, na Coreia do Sul. No circuito internacional, porém, ele não tinha resultados expressivos. Ganhou três Opens internacionais, mas sempre de baixo nível técnico.

No Rio, estreou com vitória sobre Stephen Lambdin, dos Estados Unidos, por 9 a 7. Nas quartas de final, saiu na frente contra Abdoulrazak Issoufou Alfaga, de Niger, mas levou a virada no round final e perdeu por 6 a 1. Precisou torcer para o rival chegar à final para que pudesse voltar para a semifinal, à noite. Deu certo. O nigerino, aliás, se tornou o segundo atleta de seu país a ganhar uma medalha olímpica, a primeira em 44 anos.

Enquanto a torcida ainda comemorava o ouro do futebol, assistido por dispositivos celulares, Maicon subiu ao mate para enfrentar o francês M’Bar N’Diaye, sétimo do ranking. Numa luta que começou franca, o brasileiro pontuou primeiro e passou a confiar nos contra-ataques, vencendo por 5 a 2 o quinto colocado do ranking olímpico.

Essa é a segunda medalha olímpica do Brasil na história do tae kwon do. A outra foi conquistada por Natália Falavigna, também de bronze, nos Jogos de Atenas, em 2004. Naquela mesma Olimpíada e, depois, em 2012, Diogo Silva chegou à disputa do bronze, mas foi derrotado. No Rio, Iris Sing e Venilton Teixeira caíram nas quartas de final, mas, diferentemente de Maicon, não foram repescados. Julia Vasconcelos ficou na estreia.