Crítica

Auditor da Fifa diz que ameaça maior à entidade são os seus próprios membros

A maior ameaça à Fifa não é a polícia, empresas, governos, grupos criminosos, manipuladores de resultados no futebol, nem mesmo a influência que ela ganhou. Hoje, a maior ameaça à Fifa são seus próprios cartolas. Quem faz o alerta é Domenico Scala, presidente do Comitê de Auditoria da Fifa e que denunciou diante de 209 dirigentes nesta semana a “cultura da corrupção” na entidade.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, publicada nesta segunda-feira, o auditor nascido na Basileia em 1965 garante que não sabia da operação da polícia que resultou na prisão de sete dirigentes em Zurique. “Mas não fiquei surpreso”, confessou. Para ele, a Fifa e as federações nacionais precisam colocar um mandato para seus dirigentes, como forma de frear o uso da máquina e “amizades longas demais”. Alguns dos atuais dirigentes estão no comando da entidade por duas décadas.

Estadão – Nos últimos anos, uma série de medidas foi criada na Fifa para lidar com escândalos. Isso foi suficiente?

Domenico Scala – Apesar dos eventos recentes, não podemos ignorar que reformas significativas foram tomadas. Foi a investigação do Comitê de Ética no processo de escolha das sedes de 2018 e 2022 que produziu o informe de inquérito que foi entregue ao Procurador-geral da Suíça. Duvido que isso teria ocorrido no passado. O Comitê de Ética fez o possível dentro dos seus limites e a Fifa repassou suas obrigações ao concordar que o informe fosse entregue às autoridades competentes.

Estadão –O que tem sido feito sobre a distribuição de recursos às federações nacionais?

Domenico Scala –O controle sobre os fundos de desenvolvimento a várias associações foi significativamente fortalecido. Uma série de precondições de administração agora são exigidas para receber tais fundos e os novos órgãos de controle criados estão sendo liderados por pessoas que atendem ao critério de independência.

Estadão –E quanto às escolhas de futuras Copas, o que vai mudar?

Domenico Scala –As regras de candidaturas para a Copa estão sendo revisadas de forma significativa e a decisão de quem receberá o Mundial está com o Congresso.

Estadão –Qual é a maior ameaça à Fifa?

Domenico Scala –O maior risco para a Fifa é seu Comitê Executivo e seus membros. Eu tenho dito isso antes e não poderia ser mais verdade hoje. A má conduta de vários membros no passado e possivelmente recentemente danificou a reputação da Fifa. Esse comportamento é também um grave desrespeito ao amplo bom trabalho que a administração da Fifa realiza todos os dias e por organizar grandes Copas do Mundo e mais de 20 torneios por ano.

Estadão –Que medida extra poderia ajudar a reduzir esse risco?

Domenico Scala –Membros do Comitê Executivo, dirigentes do futebol nas confederações e em nível nacional precisam ter um limite de mandato. Isso por si só não é uma garantia. Mas evita “amizades longas demais”.

Estadão –O senhor sabia que as prisões iriam ocorrer?

Domenico Scala –Não, eu não sabia. Mas não fiquei surpreso.

Estadão –Por que?

Domenico Scala –A nova liderança da Concacaf ordenou um informe independente sobre práticas em sua organização e o publicou há dois anos. É uma leitura vergonhosa e não é difícil de imaginar que aquilo fosse apenas a ponta de um iceberg. Os eventos recentes confirmam isso.

Estadão –O senhor considera que a Fifa cumpriu seu trabalho?

Domenico Scala –A administração da Fifa, de uma forma geral, está fazendo um trabalho muito bom. Mas o Comitê Executivo subestimou os riscos de más condutas nas confederações e associações nacionais para sua própria reputação. Eu entendo que seja uma “missão impossível” controlar 209 entidades. Mas algumas são mais arriscadas que outras e isso precisa ser melhor considerado.

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