Como geralmente faz em encontros reservados com os conselheiros do Atlético, Mário Celso Petraglia não só fez a apreciação de temas previstos na reunião do Conselho Deliberativo. Foi o Petraglia de sempre – avaliou o período em que é o homem forte do clube, criticou oposicionistas, falou mal da imprensa, pediu mais sócios e defendeu até o limite os seus planos para o futuro. Só não foi tudo perfeito para o cartola porque uma liminar do Tribunal de Contas do Estado impediu que seus planos sobre a FUNCAP se concretizassem totalmente.
Por mais que a “pauta-bomba” tivesse outros temas quentes, o assunto mais importanteda reunião do sábado (27) era a instituição da FUNCAP. Afinal, criada ainda em 2013, a fundação depende do aval do Ministério Público, e sempre foi defendida por Petraglia, presidente do Conselho Deliberativo, como a melhor forma de se proteger o patrimônio do Atlético de “aventureiros” – a rigor, quem é contra ele dentro do clube.
Os estatutos do Atlético e da FUNCAP permitem a transferência de todos os bens do clube para a fundação, incluindo o estádio Joaquim Américo e o CT do Caju. Mas o encontro do sábado foi usado para diversas promessas de que isto não acontecerá. “Nós não temos intenção de transferir patrimônio ou algum bem que exista agora. O bem que nós capitalizaremos é um bem novo”, disse Petraglia, que depois completou. “Apenas o futuro imóvel que o clube adquirirá para erigir a fundação fará parte dos bens da fundação”.
Na verdade, as declarações tiveram que ser dadas porque antes da reunião o Atlético foi notificado oficialmente da decisão do Tribunal de Contas que impedia a discussão sobre transferências de bens para a FUNCAP. “A Paraná Fomento tem em aberto R$ 250 milhões de dividas vencidas do Atlético-PR, e o TCE-PR tem uma auditoria que em breve será julgada e que analisou cada saco de cimento, parafuso e prego de toda Arena da Baixada. Foi uma auditoria de peso, com vários relatórios. O TCE-PR entendeu que deveria se acautelar para que não ocorresse qualquer possibilidade de insolvência do Clube Atlético Paranaense”, disse Cláudio Henrique de Castro, assessor do TCE, em entrevista à RPC.
A atitude do Tribunal e a repercussão do tema irritaram Mário Celso Petraglia. Durante a reunião do “conselhão”, ele atacou oposicionistas e imprensa – algo rotineiro nos vinte anos em que lidera o Atlético. “Nossos opositores se reúnem em lugares de baixo nível, ficam bebendo, cheirando e manchando a nossa honra. Eles têm a esperança de um dia tomar o poder desse clube”, atirou, sobre o grupo que o contesta, sem no entanto dar nomes.
Durante o encontro com os conselheiros, Petraglia recebeu a sugestão de melhorar a relação com a imprensa, até para deixar clara a linha de propósitos da FUNCAP. A resposta foi a esperada: “Odeio dar satisfação. Me revolta ter de provar que não sou ladrão. Não tenho essa disposição de provar que não estou aqui para roubar ninguém. Não vou viver dizendo que não sou um Ali Babá com 40 ladrões. Vão plantar batatas”, disse.
Ao defender suas posições para os conselheiros – e para quem assistia a reunião através da internet, pois o Atlético disponibilizou a transmissão da discussão sobre a FUNCAP -, Petraglia não conteve a emoção em vários momentos. Chegou a ameaçar chorar e pediu tempo para se acalmar, sendo aplaudido pela plateia. “Me entristece essa dúvida, essa desconfiança. Jamais prejudicamos esse clube. Não levantem suspeitas”, desabafou.
Mesmo sem querer dar satisfações e sem querer mudar nada do que pensa, Petraglia teve que recuar num ponto importante da FUNCAP – o caráter vitalício de seus integrantes. A alteração facilitou a aprovação unânime da proposta de continuidade do processo de implantação da fundação.
No protesto realizado à porta do CT pela torcida Os Fanáticos, esse tema era o mais contestado. O estatuto da Fundação foi mudado, e o cartola foi forçado a mudar o discurso. “Excluímos a causa de perpetualidade, afinal, todos nós morreremos um dia. Ninguém quer que alguém se eternize dirigente na fundação”, comentou Petraglia.
Outro assunto tratado no discurso do cartola foi a queda do número de sócios – e ao falar do tema, recuperou uma promessa, de que o Atlético seria campeão do mundo em dez anos (a partir da posse de Petraglia como presidente do conselho administrativo, em dezembro de 2011). “Não podemos pretender ser campeões do mundo com apenas 20 mil sócios. Tenho dúvida sobre 40 mil sócios. O torcedor começa a pagar e, na primeira crise, para. O torcedor brasileiro não tem compromisso com a sua paixão”, avaliou.
Antes de mudar de tema, o presidente do Conselho avaliou o período em que lidera o Atlético, valorizando o próprio trabalho. “Éramos o terceiro clube da cidade. O Paraná Clube tinha um grande patrimônio. O Coritiba era, com todo respeito, maior do que nós, foi campeão brasileiro antes, sempre foi campeão paranaense, às vezes por força própria, às vezes por outros caminhos. Foi uma luta chegar onde chegamos. Vamos deixar uma semente plantada do nosso trabalho”, finalizou.
Outros assuntos
Apesar do interesse do Conselho Deliberativo (presidido por Petraglia), o julgamento do recurso de Marcos Malucelli e Alfredo Ibiapina, que foram expulsos do quadro de sócios em 2015 e recorreram, foi transferido sem data marcada para acontecer. Os conselheiros participaram da inauguração do ginásio do CT do Caju, que permitirá treinos em gramado sintético semelhante ao da Arena da Baixada, e também de outros equipamentos do centro.
Sobre as torcidas organizadas, a diretoria fez nova apresentação, liderada pelo presidente Luiz Sallim Emed (que já estuda o assunto internamente há alguns anos), explicando os motivos da proibição das facções. Fora do CT, a Fanáticos pedia mais conversa entre as partes. “Nós queremos dialogar e entender o porquê de nos afastar sistematicamente do clube. A diretoria atleticana parece querer afastar a torcida mais popular da Arena”, afirmou Renato Martins, da diretoria da organizada.
Para fechar, a reunião do Conselho Deliberativo foi aberta para perguntas, e aí a diretoria foi bastante questionada sobre as últimas atitudes no departamento de futebol, principalmente as saídas de Vinícius e Walter – que, em nova entrevista, afirmou que a decisão de sair do clube foi exclusivamente de Mário Celso Petraglia e o chamou de “doente”. Luiz Sallim Emed tomou a palavra e garantiu que o clube segue trabalhando para reforçar o time ainda para a disputa do Brasileirão e da Copa do Brasil.