O Atlético Paranaense ganhou no início deste mês uma disputa com a Receita Federal que pode beneficiar diretamente diversas outras agremiações com contas a acertar perante o Fisco. Decisão da 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) considerou o clube paranaense uma associação sem fins lucrativos, possibilitando que fique isento de alguns tributos federais.

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Na prática, o clube está livre de cobrança do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS e Cofins. A decisão cancelou um débito de aproximadamente R$ 85 milhões do clube, com juros calculados até 2011, referentes a cobranças de 2005 a 2009.

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O processo não foi julgado em caráter repetitivo, ou seja, o resultado se aplica somente a este caso. Porém, na opinião de advogados tributaristas consultados pelo Estado, é possível, sim, que se gere jurisprudência e sirva a outros interessados.

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“Não se aplica automaticamente a todos os clubes, mas a tendência é que a tese defendida por eles venha a ser acolhida na maioria das instâncias em razão da decisão do Carf”, explica Américo Espallargas, do escritório CSMV, especializado em direito desportivo.

O debate entre o Fisco e os contribuintes é antigo e gira em torno do seguinte questionamento: os clubes podem usufruir da isenção concedida por lei federal a associações sem fins lucrativos, mesmo exercendo atividade relacionada ao futebol profissional?

Em sua defesa, os times se apoiam na Lei 9.532, de 1997, a mesma que livra igrejas e entidades assistenciais (ONGs, por exemplo) do recolhimento de tributos: “Consideram-se isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos”.

Na prática, para um clube ser assim enquadrado, ele não pode repassar eventual lucro gerado pela sua atividade aos sócios. Ou seja, o que o futebol gera de dinheiro tem de ser reinvestido no próprio futebol.

Já a Receita possui entendimento diferente, pois a atividade tem caráter econômico: envolve negociação de jogadores, venda de ingressos em estádios, renda com direitos de transmissão para a TV, entre outras coisas, o que seria incompatível com a figura da associação sem fins lucrativos.

QUEDA DE BRAÇO – Nos últimos anos, tal divergência resultou em várias autuações. A Receita deixou de conceder a isenção e passou a fazer cobranças retroativas. “O que o Fisco fazia era lavrar auto de infração dizendo que o clube não tinha recolhido os impostos e, em seguida, executava. O clube se defendia administrativamente e virava um processo judicial de cobrança da Fazenda”, diz Espallargas.

“O que muda com a decisão do Carf é o reconhecimento, por uma instância superior, dos clubes como associações sem fins lucrativos. Não significa que não possam operar e ter lucro no seu negócio. Significa que não podem distribuir lucros para os seus associados”, completa.

Por maioria de seis votos a dois, o colegiado do Carf, que é o órgão do Ministério da Fazenda responsável por julgar processos relacionados a autuações fiscais da Receita, acatou a tese dos clubes, favorecendo o Atlético-PR. O que não o impede de receber novas cobranças.

“Essa decisão foi de uma autuação específica. Outras poderão vir, não há como evitar. Mas acho pouco provável”, opina Miguel Hilú Neto, do escritório Hilú, Costódio & Caron Baptista, que defendeu os paranaenses no caso e também não descarta que a Fazenda recorra com “embargos declaratórios”. O acórdão deverá ser publicado dentro de dois a três meses.

Para quem vem brigando na Justiça contra as mordidas do Leão, trata-se de um alívio. “A isenção vem sendo questionada pela Receita como uma tese. Esta deve ser largada pelos agentes de fiscalização”, acredita o advogado Flávio Sanches, que defende o Palmeiras. “A matéria passa a ter uma pacificação.”