A alegria de três crianças correndo em torno da pequena praça à frente da Igreja Matriz de Bom Jardim, na região serrana do Rio, contrastava com o semblante triste e com o silêncio respeitoso de centenas de pessoas que a todo momento entravam e saíam do prédio antigo que abriga a Câmara Municipal, localizado poucos metros adiante. Foi lá que Tiago da Rocha Vieira, o Tiaguinho, foi velado durante este domingo, antes de ser sepultado no fim da tarde no cemitério da cidade. Atacante da Chapecoense, ele foi uma das 71 vítimas fatais do acidente aéreo na Colômbia na última terça-feira.

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O corpo do jogador de 22 anos chegou ao local do velório às 2h da manhã, e já nas primeiras horas do dia a movimentação de amigos e familiares era intensa. À tarde, longas filas se formaram. Muitos vestiam camisetas brancas com a foto do atacante, que nascera na cidade vizinha de Trajano de Moraes, mas vivera desde pequeno em Bom Jardim, cujo acesso florido e canteiros bem cuidados fazem jus ao nome do município.

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Tiaguinho era uma pessoa querida na cidade de 26 mil habitantes. Aos 58 anos, Jorge de Souza, que todo mundo em Bom Jardim chama de Dedé, diz que vai lembrar para sempre do menino habilidoso que empilhava gols no campo do Bom Jardim Esporte Clube, time onde o jogador começou a carreira e onde deu os primeiros chutes, com apenas cinco anos de idade. A bandeira do clube, aliás, repousou sobre o caixão do jogador durante o dia todo.

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Dedé cuida do modesto campo do Bom Jardim há 12 anos, e em dias de jogos é o responsável por trabalhar no bar que fica a 10 metros do gramado. Ele conta que havia um acordo entre ele e Tiaguinho na época em que o jogador era ainda um adolescente despontando para o futebol: cada gol valia um guaraná. “Teve um jogo em que a gente estava perdendo por 3 a 1 e ele chegou atrasado. O técnico colocou o Tiaguinho no segundo tempo e ele marcou quatro gols. Aí ele chegou no alambrado e falou pra mim: ‘Dedé, assim eu vou te quebrar'”, recorda o responsável pelo campo, entre sorrisos e olhos marejados.

O jogador deixou o time amador da cidade e foi para a base do Corinthians em 2010, depois de se destacar no campeonato estadual Sub-17. Tiaguinho deixou a equipe serrana antes de encerrar a competição que deu o título ao Bom Jardim. Do time paulista, peregrinou por diversos clubes do interior de São Paulo até chegar à Chapecoense, no ano passado.

A ligação com a cidade onde cresceu, contudo, permaneceu intacta. Ele costumava passar as férias em Bom Jardim, cidade onde ainda mora a família dele e da mulher, Graziela Rocha. Tiaguinho já havia programado um jogo na cidade para o próximo dia 17. Queria arrecadar fundos para crianças carentes.

Grávida de seis semanas do primeiro filho de Tiaguinho, Graziela chegou no início da tarde deste domingo de Chapecó, onde morava com o jogador e de onde acompanhou o velório coletivo no sábado. Estava muito abalada. No próximo dia 13, o casal completaria um ano de casamento.

Os pais de Tiaguinho, Bárbara e Miguel, também demonstravam muita tristeza. O jogador era filho único do casal, que é separado. “Eles não estão em condições de falar. Parece que só agora caiu a ficha”, conta Gilmara Marins, sobrinha de Sergio, padrasto do jogador. Desde terça-feira, foi ela quem tratou de todos os detalhes da cerimônia em Bom Jardim. Neste domingo, chegou à Câmara Municipal ainda de madrugada, junto com o caixão do atleta da Chapecoense, e trabalhou sem parar até a hora do sepultamento. Demonstrava cansaço e abatimento.

O cortejo com o corpo de Tiaguinho deixou a Câmara Municipal em cima de um caminhão do Corpo de Bombeiros. Praticamente a cidade inteira acompanhou o traslado até o cemitério. Na chegada, duas salvas de palmas serviram como última homenagem ao jogador. Próximo às 17h, o corpo do filho mais ilustre de Bom Jardim foi sepultado. Ficou na história.