São Paulo – Embora tenha recebido o benefício da liberdade provisória concedida pelo juiz Marcos Alexandre Coelho Zilli, o zagueiro argentino Leandro Desábato, que foi preso em flagrante na madrugada de ontem, no Morumbi, só será libertado hoje. É que a expedição do alvará de soltura está condicionada ao pagamento de fiança de R$ 10 mil.

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Como o expediente bancário já estava encerrado, a fiança só poderá ser paga hoje, a partir das 10 horas. Em seguida, o advogado do jogador argentino apresentará ao juiz a guia de recolhimento comprovando o pagamento, quando então será expedido do alvará de soltura. A libertação, porém, não é total. Desábato irá deixar a prisão, mas ainda não pode voltar para a Argentina. Ele terá que aguardar uma autorização especial que será emitida por outro juiz, pois está sendo processado por um crime que pode colocá-lo na prisão de um a três anos.

O jogador argentino passou a noite anterior preso numa cela individual no 34.º Distrito Policial, da Vila Sônia, Zona Sul de São Paulo. Ele foi detido quando ainda estava no gramado do Morumbi, logo após terminar a partida em que o São Paulo venceu o Quilmes por 3-1.

O zagueiro foi acusado de racismo por ter chamado Grafite de "negro" durante uma discussão no final do primeiro tempo. Como o atacante brasileiro reagiu ao insulto com um tapa, foi expulso junto com o argentino Luis Arano, que também se envolveu na discussão.

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Após o jogo, Grafite se apresentou à delegacia para fazer a denúncia de racismo. Esta é a primeira vez no Brasil que um jogador é detido num estádio depois de um jogo de futebol pela acusação de racismo.

"Ninguém está inventando nada. Tudo isso está previsto pela lei. Isto pode servir de exemplo não só para o futebol mas para tudo", afirmou o delegado Oswaldo Gonçalves, responsável pela prisão.

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"O racismo tem que ser reprimido de todas as formas. Isso ocorreu lá (na Argentina) e se repetiu aqui", afirmou Gonçalves ao mencionar as reclamações dos jogadores do São Paulo, que foram vítimas de insultos racistas quando visitaram o Quilmes neste ano também pela Copa Libertadores.

Segundo Gonçalves, o jogador argentino foi acusado oficialmente do crime de "injúria qualificada", um delito que pode ter uma condenação de um a três anos de prisão.

A delegação do Quilmes – que viajaria de volta para Buenos Aires em vôo fretado às 8h30 de ontem permaneceu em São Paulo. O cônsul da Argentina em São Paulo, Norberto Vidal, esteve presente na delegacia e alegou que a palavra "negro" na Argentina não tem necessariamente conotações racistas e que pode ser utilizada carinhosamente.

Conmebol divulga suspensão

São Paulo – O argentino Desábato, do Quilmes, já começou a pagar pelas ofensas racistas proferidas contra o atacante Grafite, do São Paulo. Ontem, o zagueiro foi informado de que está fora da Taça Libertadores. O paraguaio Nicolas Leóz, presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), veio ao Brasil para a festa de aniversário do Santos e aproveitou para "visitar" a 34.ª Delegacia de Polícia de São Paulo, onde o argentino está preso. Na saída, ele decretou a sentença:

– Ele não joga mais a Libertadores.

Por enquanto, a punição vale somente para o torneio continental. Mas ainda existe a possibilidade de ser ampliada para outras disputas, pois tanto a Associação de Futebol da Argentina (AFA) quanto a Fifa ainda não se pronunciaram sobre o caso.

A intenção de Leóz é aplicar uma punição exemplar ao argentino, como advertência aos demais jogadores. Ele disse que o racismo é um problema mundial e prometeu fazer o possível para combatê-lo dentro do futebol.

O presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de São Paulo, Rinaldo Martorelli, também tentou visitar o atleta, só que na condição de diretor jurídico do sindicato sul-americano de atletas. "’É lógico que o racismo deve ser combatido, mas estou aqui para garantir a ele (Desábato) o amplo direito de defesa", afirmou o sindicalista.

Atleta sem arrependimento

São Paulo – Leandro Desábato, do Quilmes – preso em flagrante na noite de ontem no gramado do estádio do Morumbi acusado de racismo – não demonstrou arrependimento por ter ofendido o atacante Grafite. A avaliação foi feita no início da tarde de ontem pelo delegado seccional Djar Gomes Neto, responsável pelo processo.

"Ele estava abatido, cabisbaixo. Afinal, trata-se de um atleta que atua num clube argentino e que jamais poderia imaginar que poderia passar por uma situação dessas. Mas não demonstrou nenhum arrependimento", disse o delegado.

De acordo com o delegado, o jogador admitiu em depoimento que xingou o brasileiro, mas ressalvou que este tipo de provocação ("negro") seria comum na Argentina e que não teria a conotação racista. O delegado disse ainda que o jogador se surpreendeu com os desdobramentos do fato. "Ele achava que só iria prestar um depoimento rápido e iria embora em seguida".

Gomes Neto contou que o jogador passou a noite isolado. Recebeu atendimento médico por ter reclamado de cãimbras e dores musculares, mas durante toda a manhã foi impedido de receber visitas e não foi tratado com nenhum tipo de privilégio. Pouco depois das 11 horas, recebeu alimentação. "A mesma comida (em marmitas) que é servida aos presos nas delegacias de São Paulo" revelou o delegado.

?Grafite conseguiu", diz Olé

Buenos Aires – A imprensa argentina publicou com destaque a prisão do jogador Leandro Desábato. Enquanto Clarín e La Nación deram um tratamento isento, o jornal esportivo Olé responsabilizou o brasileiro Grafite por ter provocado os insultos, como informa a agência Ansa.

Na sua edição on-line da 1h21 da madrugada, Olé chama Grafite de "El Negro" e publica na foto o atacante são-paulino batendo no zagueiro Leandro Desábato. O Olé também critica o brasileiro por ter provocado os rivais durante todo o jogo e ter insistido no tema de racismo.

Já em sua edição on-line matutina, o veículo publica um título mais neutro sobre o caso: "Desábato foi preso por racismo".

O jornal Clarín, o de maior tiragem na Argentina, diz em um box de capa que "Um jogador do Quilmes foi preso por chamar um rival de ‘negro’", e destacou o fato de Desábato ter sido o primeiro jogador a ser preso em campo no Brasil.

O La Nación, que ao contrário cita o nome dos envolvidos na capa, ressaltou as declarações do cônsul argentino no Brasil, para quem "negro" pode ser considerado até mesmo como um tratamento carinhoso na cultura de seu país.

A matéria também ressalta o fato de Grafite ter reagido ao "suposto insulto" com uma agressão, pela qual foi expulso, junto ao jogador do Quilmes Arano.

"O Negro disse que o haviam discriminado, e na primeira dividida foi expulso junto com Arano", diz o veículo.