Após 18 anos, Santos faz a festa

Quando Carlos Eugênio Simon apitou o fim do jogo final, os 1.500 torcedores do Santos que assistiam à partida num telão instalado no Ginásio de Esportes Athiê Jorge Cury, dentro da Vila Belmiro, começaram ali mesmo um carnaval, ao som do hino do clube. Logo depois, a festa se esparramou para fora do estádio e cinco mil pessoas gritavam: é campeão. Grito que estava engasgado na gaganta da torcida santista há 18 anos, quando o Santos conquistou seu último título importante, o Campeonato Paulista.

Fora da Vila Belmiro, onde os torcedores comemoravam enquanto esperavam a chegada dos Novos Meninos da Vila, os campeões, a população rapidamente se concentrou na Praça Independência, o tradicional reduto das comemorações das vitórias esportivas e eleitorais dos santistas. Às 19h30, o local já estava lotado, com um público nunca visto antes, e as pessoas não paravam de chegar. As ruas, que estavam desertas durante o jogo, como nos da Copa do Mundo, de repente foram tomadas pelos carros embandeirados, com motoristas promovendo um ruidoso buzinaço.

O grito de alegria, porém, foi sofrido. Risos e lágrimas se alternavam depois da conquista do título de campeão brasileiro de 2002, substituíndo os momentos de alegria e tensão vividos durante a partida. Aos 23 minutos do segundo tempo do jogo, quando o Santos ganhava por 1 a 0, a torcedora Roberta Batista, 19 anos, não se conteve: “não estou acreditando: até hoje só vi o meu time perder”.

Dentro do Ginásio Athiê Jorge Cury, a torcida estava perfeitamente sincronizada com a que estava no Morumbi. A quadra coberta segurava o som vindo do telão e que se misturava com os da torcida local. Tudo era festa enquanto o time ganhava. O torcedor que invadiu o campo foi aplaudido, Guilherme foi vaiado ao ser substituído, Fábio Costa havia virado o herói da partida e, aos 29 minutos, Wiliam deixou o campo do Morumbi sob o coro dos torcedores que estavam na Vila Belmiro: “É campeão”.

No minuto seguinte, o silêncio. Gol do Corinthians. Mal a bola voltou a correr, novamente o coro “Santos!”, desta vez para aliviar o sofrimento. Airton Souza, 37 anos, já virava as costas para o telão para não ver os lances do Corinthians. Usava uma faixa alvi-negra como se fosse um terço e não conseguia esconder o temor que todos procuravam disfarçar: a virada corintiana. Quando saiu o segundo gol do adversário, ele e muitos torcedores deixaram o ginásio, voltando só quando o Santos empatou. Minutos depois, o terceiro gol e a festa incontida. O hino santista, uma marchinha, animou o carnaval ali mesmo no ginásio.

Os campeões

Fábio Costa, goleiro, 25 anos, natural de Camaçari, tem 1,87 m. Após 4 meses se recuperando de fratura no tornozelo, deu a volta por cima e se destacou nas fases finais com grandes defesas.

Mauro Sérgio Viriato Mendes, Maurinho, lateral-direito, 24 anos e 1,75 m. Descoberto por Juari, um ex-Menino da Vila, no Fernandópolis, sua cidade natal, chegou e agradou.

Aos 23 anos, o zagueiro gaúcho, André Luís Garcia, 1,92 m, provou sua capacidade. Execrado após a queda do Santos no Paulista de 2001, o ‘paredão’ destacou-se com atuações firmes.

Alex Rodrigo Dias da Costa, zagueiro, 20 anos e 1,88 m. Estava encostado no clube, até Leão convocá-lo para amistoso. Não só agradou como tornou-se o grande zagueiro do Brasileiro.

Leonardo Lourenço Bastos, o lateral-esquerdo Léo, aos 27 anos e 1,67 m, é o ‘pulmão’ do time. A facilidade de driblar e atacar tornou este carioca em uma das armas de Leão.

O volante e capitão, Paulo Almeida Santos, 21 anos, 1,76 m, de Itarantim, mostrou que apesar de muito jovem, sabe impor liderança dentro de campo. A proteção à frente da defesa.

Renato Dirnei Florêncio, 23 anos, 1,77 m. Provou que para atuar como volante não tem de ser brucutu e distribuir pontapés. Jogador técnico, não recebeu nenhum amarelo na competição.

Elano Blumer, meia, 21 anos, 1,74 m. Apesar de aparecer pouco para a torcida, é de vital importância no esquema de Leão. Além de atacar, ajuda bastante no combate no meio-campo.

O meia Diego Ribas da Cunha, aos 17 anos e 1,73 m, desponta como um dos grandes armadores do futebol brasileiro. Sua técnica apurada, alia dribles curtos, finalização e visão de jogo.

Robson de Souza, o Robinho, 18 anos e 1,72 m, trouxe de volta a irreverência no futebol. Com suas ‘molecagens’ nos desconcertantes dribles, o atacante encantou o País e até o Rei Pelé.

William Júnior Salles de Lima Souza, atacante, 19 anos e 1,81 m. Amigo particular de Diego e Robinho, teve a oportunidade de substituir Alberto, ontem. E até que foi bem.

Após humilhante despedida da seleção brasileira – despedido no Aeroporto – o técnico Émerson Leão, 53 anos,calou a boca de muita gente ao levar um time de jovens, desacreditado, ao título.

Um show no campo e arquibancadas

Lágrimas de alegria, gritos, pulos, risos, frases desconexas, beijos, invasão de gramado, orações de joelhos, faixas enfim na posição correta. Torcedores e jogadores do Santos apresentaram simbiose perfeita, no início da noite de ontem, no Morumbi, em um dos momentos mais dramáticos e felizes dos 90 anos da história do clube. Depois de 18 anos de espera, o time finalmente comemorou um título significativo, ao vencer o Corinthians por 3 a 2 no segundo duelo da final do Campeonato Brasileiro de 2002. Uma proeza heróica, mas sofrida, angustiante, tensa.

A serenidade do Santos obtida com os 2 a 0 de domingo passado sofreu abalo nos segundos iniciais do clássico. No primeiro toque na bola, Diego levou a mão à coxa esquerda, caiu e cobriu o rosto. Era o fim para um dos personagens centrais da campanha da equipe. Robert entrou no sufoco, com a missão de organizar o ataque.

O segundo susto dos santistas veio com um minuto, quando Guilherme desviou de cabeça cruzamento da esquerda. Dessa vez, brilhou a estrela de Fábio Costa, o goleiro que ficou fora de ação quase o ano todo, para recuperar-se de contusão. Nas arquibancadas, a apreensão dos santistas e os incentivos dos corintianos fazia supor que o duelo teria enredo bem diferente ao de sete dias atrás.

O Santos recuperou-se dos abalos prematuros, colocou a cabeça no lugar, tocou a bola, equilibrou a partida. O Corinthians, com Fabinho no meio-campo e Anderson no miolo da zaga, era mais confiável do que no fiasco do confronto anterior. O título se aproximou da garotada da Vila aos 37 minutos – por obra e graça de Robinho. O ‘moleque’ das finais pegou a bola na entrada da área, foi ciscando na frente de Rogério. O lateral, acuado, recuava, sem saber direito o que fazer, até Robinho dar o bote e ser puxado – pênalti que ele mesmo cobrou, com calma, sem chance para Doni: 1 a 0.

O Corinthians apertou no segundo tempo. Como precisava fazer três gols, partiu para cima, dominou, foi melhor do que o Santos. Mas as tentativas de Guilherme, Vampeta e companhia morriam nas mãos de Fábio Costa, em uma de suas melhores atuações no Santos.

A insistência corintiana foi premiada com a virada. Aos 30 minutos, Deivid empatou, de cabeça. Aos 39, Anderson virou, também com cabeçada certeira. O técnico Leão (expulso na metade do segundo tempo) e os 74.592 torcedores que pagaram ingresso viveram momentos de emoção incomparáveis nos minutos que restavam para Carlos Eugênio Simon assoprar o apito de encerramento.

Ao Corinthians, bastava mais um gol para uma reação memorável. Ao Santos, o empate seria suficiente. E a igualdade no placar veio aos 43 minutos, em parte com a assinatura de Robinho. O endiabrado garoto armou a jogada no lado direito do ataque e cruzou para Elano desviar. A festa santista explodiu nas arquibancadas e foi coroada com a virada definitiva. Robinho dançou diante de Kléber e Vampeta e serviu Léo, aos 47: 3 a 2. O Brasil é alvinegro, mas da Baixada.

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