Cairú – O Ecomotion está acabando com Ida. Disputando pela primeira vez uma corrida de aventura longa (435 km), a ex-jogadora de vôlei sofreu muito para percorrer o segundo trecho da prova, que varou a madrugada de ontem e terminou na cidade colonial baiana de Cairú. O previsto eram 54 km de trekking, mas quem erra o caminho acaba tendo de andar mais.
“Nós batemos na casa de um velho, que falou ‘por aqui não tem passagem'”. Aí tivemos que voltar 15 km, que com mais 15 pra compensar deu 30. Um trecho que era para ter 54 km acabou ficando com uns 90, 100″, disse a atleta da equipe Fazenda Boa Sorte, esbaforida, na chegada. Chegou em 32.º lugar, de 49 participantes. “Estou com aquela dor que maratonista sente. Dói a perna, o pé, o quadril, tudo. Meu pé é uma bolha só.” Alguém gritou: “A Ida vai voltar para o vôlei”. E ela: “Vou mesmo.” Questionada se conseguiria terminar a prova, disse: “Vou tentar. Se não der, tem o ano que vem”.
Depois de receber o auxílio da equipe de apoio, dirigiu-se ao caiaque duplo, sob chuvisco, para enfrentar uma remada de 29 km, seguida de 57 km de bike. Antes de entrar, fez um gesto idêntico àquele histórico da suíça que terminou uma prova de atletismo cambaleando, na Olimpíada de Los Angeles/84. “Vou terminar assim.”
Mas havia gente bem pior na pracinha de Cairú, onde ficaram as equipes de apoio. Adriana, da equipe feminina Playboy, mal conseguia pisar, de tão feias as bolhas. Enquanto comia a marmita de arroz e mandioca, contou o drama que passou no meio do mato. Eram 9h da manhã e o cheiro de miojo no ar mostrava que o café da manhã ainda teria mais pratos.
“Essa noite foi desesperadora. As meninas ficaram me puxando o tempo todo, e eu dormindo em pé, andando. É muito difícil controlar o sono. Eu tive alucinação, via gente, cavalo… Aí começa a entrar areia no tênis e forma um monte de bolha”, contou a atleta, que foi ‘rebocada’ pelos companheiros (duas mulheres e um homem) por uma cinta amarrada na cintura.
Às 8h, o apoio da Rosa dos Ventos estava tenso, pois estava na praça desde as 18h da segunda-feira, e nada de os competidores chegarem. Nem notícias. Pouco depois, eles apareceram. Leonardo, o Leléo, contou que eles foram parar num mangue que parecia bem inóspito. “Resolvemos não encarar e voltamos. Mas aí o psicológico abala, quebra o ritmo, acaba a comida. Mas foi até emocionante. Paramos na casa de uma mulher que fez ovo com farofa e encheu todos os nossos reservatórios de água”.
Além das bolhas e outros problemas corriqueiros, a equipe médica fez um atendimento inusitado. Usou absorventes para proteger duas bolhas que surgiram nas nádegas de um competidor. O médico Valdir Zamboni disse que perguntou se havia alguma mulher menstruada por perto e conseguiu a ‘bandagem’ que precisava.
Feridas curadas, todos partiram. Deixaram para trás uma cidade que tem um mosteiro encantador, de São Benedito, todo revestido de tijolos em azul e branco. Fundado em 1654, consta que é o terceiro mais antigo do Brasil. No piso, sobre os restos mortais, vê-se que o lugar tem mesmo uma longa história: “Aqui descanção os restos mortáes de…”
A equipe Xavante, cuja canoa virou logo na largada da prova, foi desclassificada. O capitão André Sá não suportou a ferida causada pelas garras de um caranguejo, segunda-feira, e desistiu.
Bandeira francesa no time do PR
A equipe Paranaventura largou com a bandeira da França sobre a vela de sua canoa caiçara, na primeira prova do Ecomotion. A brincadeira aconteceu em função de os paranaenses Laércio Kazmierczak, Luiz Fernando Marquete e Vanessa Cabrini contarem com o respeitado navegador francês Gilles Martinon, conhecido nos bastidores como Mister M por sua habilidade quase mágica de não se perder em trilha alguma.
A equipe é uma das melhores do Brasil, mas nunca competiu nas provas do circuito Rio-São Paulo, ou seja, seu desenvolvimento, sua progressão na prova e suas estratégias são informações ainda desconhecidas por maior parte das equipes brasileiras. O que é sabido é que eles são fortes, ganharam várias provas do circuito Chauás, que são provas difíceis, de aproximadamente 150 quilômetros.
Até o fechamento desta edição, a Paranaventura era a segunda melhor brasileira na prova, ocupando o sexto lugar. A liderança pertencia à brasileira Quasar/Lontra Radical, seguida pela espanhola MeridianoRaid e a checa Salomon/Opavanet em terceiro. Até o fechamento (20h30), elas eram as três únicas a cruzar o PC7.
