Deixados pra trás

A resolução de um problema criou outro no Jardim Cristal. A prefeitura desapropriou um terreno ao final da Rua Deputado Luís Gabriel Sampaio, à beira do Contorno Leste, e levou as cerca de 60 famílias pra novas moradias ali perto. Mas, como a maioria foi pra apartamentos, não lhes foi permitido levar seus cães de estimação. Sem saber o que fazer deles, há cerca de um mês abandonaram os bichos pra trás, que se espalharam pelo bairro. A Tribuna percorreu o bairro e contou pelo menos 50 cães abandonados pela região, famintos, machucados e doentes.

No Jardim Cristal, famílias tiveram que deixar terreno e não puderam levar os cachorros, que ficaram na rua. Foto: Lineu Filho.
Bairro ficou cheio de cães abandonados. Alguns moradores tentam ajudar, mas não tem lugar pra todos. Foto: Lineu Filho.

A dona de casa Maria Luisa Jonas, 33 anos, já relatou várias vezes o problema à prefeitura pra ver o que podem fazer e saber o que será feito no terreno desapropriado. “Mas não recebi nenhuma resposta”, lamenta. Ela diz que a prefeitura deu prazo de três meses pras famílias darem outro destino aos cães, antes de serem transferidas. “Mas onde iam deixar? Pra quem iam doar? Eles não conseguiram e tiveram que deixar aí mesmo. Não tiveram outro jeito”.

Ajuda

Maria Luisa explica que os moradores têm tentado ajudar. Muitos recolheram alguns animais pra dentro de seus terrenos, mas chegaram a um limite e continuam tentando ajudar os da rua colocando água, comida e casinhas do lado de fora. Mercados e aviários do bairro têm doado ração. Mas é uma situação provisória que, segundo ela, vai piorar, pois alguns cães estão procriando. Sem contar os que estão doentes e machucados e podem trazer doenças.

Mesmo com poucas condições financeiras, a dona de casa Maria de Jesus Chagas, 80 anos, comprou um saco de ração e todos os dias vai com a nora, até o terreno desapropriado, levar água e comida. “Eles ficam tão alegres, abanando o rabo, rodeando a gente. Quem pode dar cinco reais daqui e dali, a gente vai fazendo uma vaquinha pra comprar a ração. Hoje até acabou. Ainda não sei se vai dar pra comprar outro pacote”.

Responsabilidade de quem?

No Jardim Cristal, famílias tiveram que deixar terreno e não puderam levar os cachorros, que ficaram na rua. Foto: Lineu Filho.
No Jardim Cristal, famílias tiveram que deixar terreno e não puderam levar os cachorros, que ficaram na rua. Foto: Lineu Filho.

Fabiane Rosa, organizadora do grupo Salva Bicho, lamenta a situação. “Fomos informados, mas não temos muito o que fazer a não ser divulgar o problema, em buscar de novos lares pra estes cães. Nós somos apenas um grupo de amigos que nos unimos pela causa dos animais, mas não temos poder de exigir nada das autoridades, ou de quem quer que seja”, afirma Fabiane, que tem sob sua responsabilidade quase cem cães, todos resgatados de rua, a maioria em abrigos ou lares temporários, que ela tenta sustentar com ajuda de amigos e doações. “E todos os grupos que atuam com proteção animal estão assim, abarrotados”. Pra Fabiane, tanto a prefeitura quanto os antigos donos dos cães têm que ser responsabilizados. “Os tutores destes cães não poderiam tê-los abandonado desta forma. Mas se foi uma exigência da prefeitura que as famílias não levassem os bichos aos novos lares, deveria encontrar uma solução pro problema em conjunto com estas famílias”, analisa.

Prefeitura: não há proibição

A Secretaria de Habitação informou que as desapropriações no Jardim Cristal fazem parte do Projeto do Parque Linear do Rio Itaqui, que tem entre seus objetivos a drenagem do rio e a conservação de áreas de preservação ambiental. O projeto prevê a realocação de 825 famílias, das quais 631 já foram remanejadas pros residenciais Nápoles, Vila Verde e Amazonas, no Guatupê.

A secretaria ressalta que durante todo o processo de realocação das famílias é feito um trabalho de acompanhamento técnico-social, por meio de empresa especializada e licitada, a fim de orientar e assistir as famílias na transição pras novas moradias. A orientação dada é que os animais domésticos não fossem abandonados no antigo local. De acordo com a pasta, aumentou o número da guarda responsável entre os realocados, já que muitos muraram suas novas casas e dedicaram atenção aos animais que haviam abandonado. A prefeitura nega qualquer proibição quanto a possuir animais nas novas moradias.

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Giselle Ulbrich

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