Santa Cândida

Decepcionante!

Ter uma casa própria, um lugar para chamar de lar e não dever nada para ninguém. É o sonho de muita gente. A vendedora Valentina Lavin, 37 anos, partilha deste pensamento. Morando de aluguel com o marido desde 2012, não vê a hora de ter a própria residência. Inscrita na fila da Cohab, há alguns anos comemorou a convocação por meio de uma parceria com o programa Minha Casa Minha Vida, do governo federal.

Foto: Felipe Rosa.
Orçamento incerto: quem comprou no Cedros está se apertando com o aluguel ou morando de favor. Foto: Felipe Rosa.

Foi informada de que poderia adquirir um apartamento no bairro Santa Cândida, no Residencial Cedros. Um projeto bonito, com área de mata ao redor e espaço para a família. No entanto, a comemoração acabou dando lugar à decepção. Com a promessa de que receberia as chaves até agosto de 2015, amarga – até agora, uma espera que parece não ter fim.

De lá para cá, a data de entrega já foi alterada por, no mínimo, quatro vezes. “Em um primeiro momento alegaram problemas com o dono do terreno e prometeram tudo resolvido até agosto. Infelizmente, a promessa não foi cumprida. Garantiram, então, para fevereiro. Depois, para maio. E aí, prorrogaram para junho. Já estamos em outubro e, agora, garantem que tudo estará pronto e entregue até o dia 15 de novembro. Eu só acredito vendo”, explica.

Foto: Felipe Rosa.
Nas obras do Cedros, muitas vezes, nem operários têm trabalhado. Foto: Felipe Rosa.

Assim como ela, dezenas de pessoas, frustradas, entraram na Justiça e exigiram providências. “O que conseguimos, por enquanto, foi a suspensão da cobrança dos juros de obra. É um valor pago por mês e que varia de acordo com o financiamento de cada morador. Tem gente que estava pagando R$ 400, outros R$ 500… Só que, com obra atrasada desse jeito, não dá pra ficar pagando pelo erros dos outros”, desabafa a vendedora, que já desembolsa cerca de R$ 600 com o aluguel mensalmente.

Apelo judicial

Mais de 100 famílias que aguardam a liberação do imóvel no Residencial Cedros são representadas pelo advogado Daniel Fernando Pastre – no total, o empreendimento conta com 544 apartamentos. A construtora responsável é a FMM. “Primeiro justificaram o atraso com as chuvas. Depois, alegaram problemas com mão d -obra. Só que o problema vem se arrastando há mais de um ano”, comenta o defensor.

Com ações já protocoladas, os proprietários aguardam decisões favoráveis na Justiça. “Uma decisão liminar aponta a Caixa Econômica Federal como responsável também, já que atua vinculada com o programa social da União, além de atuar como agente financeiro. A Caixa deveria ter monitorado a obra e, confirmando os primeiros indícios de atraso, substituído a construtora”, aponta o advogado.

Além da entrega dos apartamentos, as pessoas pedem a devolução dos juros já pagos, indenização por dano material e indenização pela impossibilidade de uso do imóvel. “Sem falar que muita gente chegou a comprar móveis ou mandou fazer, achando que poderia se mudar logo. Outras pessoas se casaram esperando vir para o novo lar e tiveram os planos frustrados. Há quem precisou prorrogar o contrato de aluguel em outro imóvel e tem, também, gente que precisou morar de favor por causa do imprevisto”, explica o advogado.

Foto: Felipe Rosa.
Prejudicados pedem ressarcimentos pelos atrasos. Foto: Felipe Rosa.

Crise afetou construtora

A informação é de que a FMM entrou em processo de recuperação judicial, devido à crise econômica. A reportagem ligou diversas vezes para a construtora, mas nenhum responsável foi localizado.

No site da empresa, um comunicado aos clientes postado no último dia 15 de agosto confirma que a FMM ajuizou o pedido no Foro Regional de São José dos Pinhais em caráter de urgência. A construtora alega, ainda, que mantém esforços para a continuidade das atividades e conclusão das obras em andamento, “apesar das dificuldades advindas da crise econômica e política que assola o país, a qual afetou de forma direta o mercado de construção civil, especialmente aquele voltado para o Programa Minha Casa Minha Vida”.

A nota diz que o pedido de recuperação foi considerado a medida mais adequada para preservar a continuidade das obras em fase final de execução, além de preservar o valor e imagem da companhia perante o mercado de construção civil.

Sem responsabilidade

A Caixa Econômica Federal diz que os empreendimentos se enquadram na faixa 2 do programa Minha Casa Minha Vida. Nestas operações, diz atuar somente no papel de agente financeiro, sem responsabilidade de construtor, vendedor ou incorporador. A Caixa diz, ainda, que os casos citados seguem em trâmite na Justiça e ainda não há uma decisão definitiva.

Problema que se repete

Quase colado com o Residencial Cedros, está o Residencial Figueiras. Com 80 apartamentos, o imóvel também está atrasado. Só que, ao contrário dos prédios vizinhos, não conta com nenhum operário. É a denúncia do atendente de farmácia Marco Pilatti. “Fechei o contrato antes dos compradores do Cedros. Mesmo assim, continuo sem apartamento. A construtora é a mesma e o problema, também”, explica.

Marco mora em uma casa alugada. Por mês, são, aproximadamente, R$ 800 desembolsados. Só que, ao contrário dos vizinhos, não conseguiu suspender a cobrança de juros da obra. “É um dinheiro que me faz falta e não é justo que isso seja cobrado. Para dar entrada no apartamento, cheguei a vender meu carro. Até hoje estou a pé”, lamenta.

Direitos devem ser buscados

Para o presidente da Associação Nacional dos Mutuários no Paraná, Luiz Alberto Copetti, a situação da construtora é compreensível, mas deve ser resolvida. “Tivemos um período de grande aquecimento nas vendas e, assim, um imóvel pagava o outro. Só que veio a recessão e afetou o setor da construção civil. Nesse caso, a construtora entrou com um pedido de falência”. A pessoa lesada deve buscar os direitos na Justiça. Quando eles entregarem os imóveis, a melhor coisa é levar um engenheiro até o local. Só ele vai poder garantir a qualidade da obra e confirmar se a empresa fez “tudo às pressas e mal feito, ou não”.

Sobre o autor

Ricardo Pereira

(41) 9683-9504