Piraquara

Sonhos de liberdade

Mãe de um menino, hoje com um ano e quatro meses, Edna foi presa quando estava grávida de cinco meses. Ela lembra que a detenção ocorreu em Ponta Grossa, diante dos outros três filhos. Os olhos dela se enchem de lágrimas ao recordar daquele momento. “Pedi para o policial não me algemar na frente deles e fui atendida”, conta emocionada e afirmando que já foi perdoada por eles e pelos pais. “Meus pais não me criaram para isso, foi culpa do meu envolvimento com pessoas erradas”, justifica Edna, que aguarda julgamento para a acusação de associação para o tráfico e tráfico de drogas.

O pai do menino, como acontece na maioria dos casos, sumiu. Presa há quase dois anos na Penitenciária Feminina do Paraná (PFP), em Piraquara, Edna conta que recebe cartas da família, mas a distância de Ponta Grossa impede uma rotina de visitas. “Minha filha e meu pai escrevem mandando notícias. O que eu mais quero é reconstruir nossa família quando sair daqui”.

Por enquanto, ela nem cogita se separar dele. “Eu me sinto culpada de ter trazido meu filho junto comigo para a prisão, mas mãe nenhuma quer ficar longe do filho, até porque ficar perto é o melhor. Se eu pudesse traria os outros”, admite. Dedicada a reduzir os dias na prisão e garantir alguma poupança após sair da penitenciária, ela diz que já acumula quatro meses de remissão da pena por conta dos dias trabalhados. “Acredito que se eu for condenada, conseguirei regime semiaberto e vou poder sair de mãos dadas com o meu filho”.

A mãe de outro menino, Rosângela, vai celebrar hoje o primeiro ano de vida do filho. Ela também foi presa na frente da filha de 12 anos, em Bandeirantes, quando estava grávida de quatro meses do menino. Assim como Edna, ela não quer se separar do bebê. “Ele é a minha força aqui dentro (da PFP). Peço a Deus que ele não complete o segundo ano de vida aqui e nem eu passe mais um Dia das Mães longe da minha filha”, afirma. “É o Ruan e as cartas da minha filha que me fazem suportar. Quando chega uma carta dela, esqueço até que estou presa”, relata Rosângela, contando que a filha está sendo criada pela avó. “Com 12 anos ela já está na oitava série, só posso agradecer a Deus por uma filha assim”, conta a mãe, orgulhosa.

O pai do menino cumpre pena na PEP. “É muito triste essa situação, mas vamos transformar tudo isso em ensinamento”, prevê Rosangela, que também aguarda julgamento por conta de associação para o tráfico.

Comunidade de mães

Na PFP, há uma ala específica para as mães pós-paridas, que após retornarem da maternidade podem permanecer nesse espaço com seus filhos até os bebês completarem seis meses. O que impressiona os funcionários e as próprias detentas é o comportamento dos recém-nascidos. ‘Parece obra de Deus. Eles quase não choram por cólicas ou qualquer outro motivo”, atesta Neide. Depois desse período, as crianças vão para o berçário e lá permanecem até as mães serem liberadas ou decidirem mandar seus filhos para algum familiar de 1º grau.

“Quase 100% das detentas estão ocupadas, seja trabalhando para as empresas parceiras, seja no setor do berçário, que é disputado de forma acirrada pelas mulheres que possuem filhos aqui”, explica a vice-diretora da PFP, Laíde do Rocio Bernardi. Quem não é designada para o setor, após o filho completar seis meses, precisa se conformar em ficar apenas um período do dia com a criança (das 5h30 às 12h ou das 12h às 19h), que é alternado para evitar qualquer injustiça. “Cada mãe acaba tratando todos como filhos, já que elas dependem uma das outras nessa criação. É praticamente uma comunidade de mães”, observa Rita de Cássia.

Dilema materno

Exercer a maternidade na prisão ou da prisão. Essa é a inquietação estampada no semblante de boa parte das mães que chegaram à Penitenciária Feminina do Paraná (PFP), em Piraquara, carregando seus rebentos no ventre. Atualmente há 34 crianças no berçário. Embora a Lei de Execução Penal garanta que as detentas possam ficar com seus filhos até os seis anos de idade, na prática, as crianças deixam o local com dois anos de idade – por opção das próprias mães.

A diretora da PFP, Rita de Cássia Costa, considera que esse é um meio termo razoável entre o direito de quem está presa de poder amamentar o seu filho e estreitar vínculos e o direito da criança de crescer livre dos muros de qualquer prisão. “Buscamos trabalhar a presa e os familiares que estão fora para essa conscientização”, explica. Das 400 detentas, a maioria com idade entre 18 e 26 anos, 88% são mães. Destas, 34 vieram grávidas e tiveram seus filhos presas e três ainda aguardam o nascimento.

“A grande maioria está aqui por envolvimento com drogas, muitas vezes porque estava ajudando o companheiro”, explica. Nenhuma engravidou na prisão e entre as razões disso, a diretora aponta: a conscientização sobre a necessidade de prevenir a gravidez, o convívio com a dor de quem teve filho na prisão ou está longe da prole por conta de estar ali e, principalmente, o abandono. “Apenas seis mulheres da unidade recebem visitas íntimas, isso porque o companheiro está preso ou por terem sido substituídas por outra em pouco tempo”, acrescenta.

Visitas são raras

Normalmente as crianças criadas na PFP são levadas pelas avós ou irmãs das detentas. “Nem dá para comparar o volume de gente nas filas para visitação daqui com a da PEP (Penitenciária Estadual de Piraquara), onde estão os homens. A grande maioria não recebe visita de ninguém durante o período que fica presa”, explica a agente penitenciária Neide Efigênia de Oliveira.

O antídoto dessa solidão e, por vezes, da redenção dessas mulheres está na maternidade. “É fundamental se reconhecer como mulher, mãe e protagonista desse processo de formação e educação daquela criança”, explica a pedagoga coordenadora do projeto Educação Mamãe-Bebê, Cleide B.S. Fernandes. O projeto é desenvolvido na PFP em parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

A Secretaria Estadual da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos não tem um registro do número total de crianças que passaram pelo berçário da PFP em 20 anos do serviço. O custo de manutenção mensal gira em torno de R$ 7 mil, entre alimentação, roupas e remédios. Os contratos de repasses são custeados pelos governos estadual e federal. Além disso, o espaço recebe muitas doações, incluindo serviços como a última reforma do local, em 2013.

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Sobre o autor

Magaléa Mazziotti

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