Cachorrada largada

Eles estão por todos os lados. Pequenos ou grandes, a maioria está magra, faminta e alguns, doentes. Muitos também trazem no corpo feridas e cicatrizes, marcas do descaso a que são submetidos. Este é o retrato dos cães abandonados que encontramos pelas ruas de Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba. Segundo os moradores, um problema antigo, mostrado pela Tribuna em dezembro de 2014, que segue incomodando e trazendo preocupação.

“Moro em Piraquara, na Vila Macedo e aqui é um absurdo, em cada quadra existem mais de cinco animais em situação crítica. Entrei em contato com a Prefeitura e fui bem atendida, porém, o que me falaram é que eles não recolhem os animais, por questões como falta de veterinário e pelo local (canil municipal) estar contaminado. A situação é lastimável e só colocar água e ração nos portões de nossas casas não está solucionando o problema. A cada cria, uma cachorrinha tem em média cinco filhotes”, relata a lojista Caroline Loss, 34 anos.

Foto: Felipe Rosa
Moradores reclamam do número de animais abandonados nas ruas de Piraquara. Foto: Felipe Rosa

Para estes animais, que além das próprias dores, ainda podem transmitir doenças para as pessoas, resta ter a sorte de cruzar com uma protetora voluntária pelo caminho. Pessoas como a vendedora Ester da Cruz, 48, moradora do bairro Santiago, que cansada de ver tanto sofrimento, decidiu arregaçar as mangas e agir por conta própria. Há mais de 20 anos ela vem dedicando seu tempo e dinheiro para tratar os cães abandonados, oferecendo comida, remédios e amor. Neste período, fez mais de 100 resgates e se envolveu em diversas brigas pelos animais, uma delas, na Justiça, com ação no Ministério Público contra a prefeitura.

“Tenho nove cães em casa, todos resgatados das ruas e que têm algum tipo de problema físico, como uma pata ou olho a menos, que perderam por doença ou violência. Também cuido de minha mãe, que tem Mal de Parkinson. Mas mesmo tendo apoio de outras voluntárias, tenho muitas dificuldades. A gente deixa de comer para ajudar esses bichos”, desabafa Ester.

Sem apoio

Foto: Felipe Rosa
Ester cansada de ver tanto sofrimento, decidiu arregaçar as mangas e agir por conta própria. Foto: Felipe Rosa

Segundo estimativa do grupo de protetoras voluntárias liderada por Ester, hoje, devem existir cerca de 40 mil cães sem casa em Piraquara. De acordo com elas, os bairros mais críticos, com mais cães, são Guaraituba e Planta Deodoro. Para Ester, o maior problema enfrentado pelas protetoras da cidade é a falta de apoio do poder público, em ações como castrações, campanhas educativas e também, no que diz respeito à infraestrutura.

“A gente tem apoio da população e comerciantes, que deixam que a gente coloque água, comida e casinhas para os animais. Mas não temos o da prefeitura. Até agosto do ano passado os cães estavam sendo castrados pela prefeitura, por conta da ação movida por nós. Mas agora, nada vem sendo feito. Precisamos de um censo que mostre quantos são os cães abandonados e de outras ações que protejam os animais. Sozinhas, apesar do amor, não damos conta”, explica.

As protetoras pedem apoio para seguirem ajudando a solucionar o problema dos cães e gatos abandonados de Piraquara. “Não queremos dinheiro, queremos ajuda, que a prefeitura assuma sua responsabilidade e faça sua parte. Somos eleitoras, votamos e confiamos nessa administração. Queremos parceria”, diz Ester.

Caos no canil

As protetoras pedem apoio para seguirem ajudando a solucionar o problema dos cães e gatos abandonados de Piraquara. Foto: Felipe Rosa
As protetoras pedem apoio para seguirem ajudando a solucionar o problema dos cães e gatos abandonados de Piraquara. Foto: Felipe Rosa

Outra situação que revolta as protetoras é a atual condição do canil municipal. “O canil tinha uma veterinária, que pediu licença. Hoje, os bichos que vão para lá não são bem cuidados. Tem muita sujeira, moscas e não vemos os potes dos animais com água ou comida. Os funcionários são despreparados, eles não sabem nem dar uma injeção”, reclama a despachante e protetora voluntária Vânia Oliveira de Souza, 41.

Foto: Colaboração
Protetora pede ajuda da prefeitura. Foto: Colaboração

Ela ainda conta que o grupo vem tratando e resgatando os animais do canil. “Lembro de um cavalo que acompanhamos. Ele estava com a pata inflamada e recebia medicação do jeito errado. Pagamos uma pessoa para ir até lá e cuidar dele. Mas logo depois ele sumiu do canil, como somem alguns cães. Falaram que o cavalo foi adotado, mas nunca disseram para quem”.

Outra voluntária, a monitora escolar Vanessa Bastos, 37, se emociona ao falar de um caso mais recente. “Resgatamos um cão em estado crítico de dentro do canil. Ele estava com bicheira por todo o corpo. Tiramos ele de lá e levamos ao veterinário. Mas chegando lá percebemos a gravidade: a boca dele estava toda comida pelos bichos, ele estava em estado de putrefação em vida, tanto que tivemos que decidir pela eutanásia. Foi muito triste. Não dormi, chorei a noite toda”, relata.

Castrações serão retomadas

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

A Prefeitura de Piraquara informa que criou o Programa de Controle e Bem Estar Animal, que até 2014 não existia. “O município construiu um Centro de Triagem, instituiu o programa de castração, criou as feiras de adoção e intensificou as campanhas de guarda responsável e conscientização”, alega.

O município esclarece que custeia as castrações, prestadas gratuitamente à população por clínicas credenciadas. “O serviço ficou temporariamente suspenso em virtude da realização de um novo processo de contratação e credenciamento das clínicas que já foi concluído. As castrações serão retomadas no início de fevereiro”, promete.

Foto: Colaboração
Foto: Colaboração

De acordo com a administração, o canil abriga cerca de 40 animais. “O recolhimento de animais é seletivo, especificamente para animais em situação de risco ou agressivos em vias públicas. Os animais hoje abrigados pela prefeitura recebem todo o auxílio necessário de alimentação e veterinário. Toda adoção é controlada, com termo de compromisso assinado e garantia de castração”, detalha.

A prefeitura define a questão do abandono de animais como um “problema crônico de saúde pública a nível nacional” e diz que a prioridade agora é a retomada do serviço de castração e nas campanhas de guarda responsável. “Além de peças publicitárias em jornais da cidade, espaços públicos e outdoors, são realizadas campanhas periódicas nas escolas municipais, seminários e ações em eventos relacionados ao meio ambiente”, cita.

Censo em Curitiba

Segundo estimativa do grupo de protetoras voluntárias liderada por Ester, hoje, devem existir cerca de 40 mil cães sem casa em Piraquara. Foto: Colaboração
Segundo estimativa do grupo de protetoras voluntárias liderada por Ester, hoje, devem existir cerca de 40 mil cães sem casa em Piraquara. Foto: Colaboração

Estudantes e professores do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Paraná (UFPR), com o apoio da Divisão de Monitoramento e Controle Animal, da Rede de Proteção Animal da Prefeitura de Curitiba iniciaram na última sexta-feira (20) um censo que deve apontar qual é o número de animais domésticos em Curitiba.

Segundo informações da prefeitura, neste trabalho, os alunos percorrerão as ruas dos bairros para conversar com os moradores e dimensionar a população de cães e gatos na cidade. O projeto tem parceria da Universidade de São Paulo (USP) e também recebe apoio das vereadoras Katia Dittrich e Fabiane Rosa. Serão visitadas algumas casas selecionadas e o resultado permitirá conhecer não apenas o número de animais, mas também haverá segmentação por renda e região. Os dados vão ajudar a Rede de Proteção Animal a elaborar estratégias de controle populacional.

Adote!

Quem quiser ajudar pode adotar cães resgatados pelas protetoras. Basta entrar em contato com a Ester através deste link!

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