Para começar essa reportagem, proponho ao leitor da Tribuna uma brincadeira: imagine que o bairro Mercês, em Curitiba, é o pequeno vilarejo de Collodi, no Norte da Itália, onde se passa a história do clássico infantil “Pinóquio”.
No lugar dos prédios, coloque charmosos palacetes medievais e substitua nossas araucárias por velhas castanheiras e carvalhos. Na falta da cadeia de montanhas dos Apeninos, usemos a Torre Panorâmica como referência.
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A poucas quadras dali, numa casinha de madeira simples situada na Rua Capitão Joseph Pereira Quevedo, Iury Pietreski, 28, pode ser comparado ao mestre Gepetto. Orgulhoso de suas criações, o artista se prepara para dar vida a seus bonecos que subirão ao palco do Teatro Dr. Botica neste fim de semana. Desta vez, os escolhidos são a “Lagarta Euruca”, o “Macaco Ambrósio”, “João Bem Bão” e o “Grilo Consciência” que, juntos, estrelarão a primeira peça escrita pelo artista. Voltada a todos os públicos, “O Presente” traz reflexões sobre a vida, o tempo e como aproveitar plenamente o único momento do qual temos garantia: o agora.
Já disse Dalai Lama: “só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver”. É com essa frase que a peça “O Presente”, escrita por Iury Pietreski, termina.
Com o objetivo de trazer à consciência do público infantil a importância de viver o tempo presente, o grupo Arteiros leva aos palcos a primeira história escrita pelo curitibano de 28 anos, que enxergou no teatro de bonecos uma oportunidade não só de fazer graça, mas de transmitir mensagens importantes para a sociedade.
Tudo começou em 2013, quando Iury se formou em artes cênicas pela Faculdade de Artes do Paraná (FAP). Apaixonado pela “vida de palhaço”, o artista desenvolveu afinidade com os fantoches na Cia. Almazen de Teatro. Tutelado por grandes nomes da manipulação de bonecos como João Gabriel Monteiro, Manoel Kobachuk e Edson Naindorf, o ator, de repente, se sentiu em casa por trás dos biombos, articulando cordas e emprestando sua voz para os mais diversos personagens: insetos esportistas, roedores músicos, velhos resmungões e primatas insolentes que, sem muito esforço, conseguem desviar a atenção dos pequenos pelo menos por alguns instantes da tela dos tablets e telefones celulares. “De uma hora pra outra eu entendi a paixão do personagem Gepetto pelos seus bonecos. É fascinante ver como os fantoches ganham o coração do público de forma tão simples”, revela.
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Mesma paixão
Movidos pela mesma paixão, Nayana Valente, Luan Garcia e Caroline Gnoatto se juntaram a Iury formando em 2014 o grupo “Arteiros” que, desde então, já realizou mais de 100 apresentações em escolas, espaços alternativos, feiras e eventos. Para fabricar os personagens, o grupo reservou um pequeno espaço, no bairro Mercês, onde funciona a oficina na qual os bonecos são confeccionados artesanalmente pelos próprios artistas.
Ao ator foi inevitável perguntar: “em pleno 2018 esse tipo de apresentação ainda entretém ou sucumbe diante das sedutoras tecnologias?”. A resposta foi interessante. “Hoje em dia a criança não é mais tão ingênua quanto antigamente. Eles não são bobinhos, muito pelo contrário. Sabem que sou eu dando voz ao boneco e entendem que aquilo é de mentirinha.
Mesmo assim, quando o boneco está ali, na frente deles, é como se acreditassem que o personagem tem vida, independente da minha presença. Eles se sentem livres pra interagir com os bonecos e às vezes tocam, abraçam e fazem carinho, como se eu não estivesse ali”, conta.
De fato é curioso. Na pequena sala da “Casa Ateliê”, onde o grupo recebeu a reportagem, o “Macaco Ambrósio” resolveu dar entrevista. Cheio de trejeitos ele veio “andando” pelo chão. Piscando os olhos e mexendo os braços, o galante macaquinho de repente virou de costas e improvisou um rebolado.
O riso veio automaticamente, seguido pelo pito de Iury: “Psiu! Ambrósio, isso são modos? Peça desculpas!”. Desculpas aceitas, a interação deixa no espectador a boa e velha sensação de voltar a ser criança. “O poder de provocar emoções no público, além de impressionante, é uma grande responsabilidade. Principalmente quando falamos das crianças. É apaixonante”, finaliza Iury Pietreski.