As espécies frutíferas atraem morcegos em certas épocas do ano. Até se acostumar, Tereza morria de nojo e medo. ‘Falei pro pai que nunca mais ia comer jabuticaba depois que vi um morcego na jabuticabeira. Liguei pra prefeitura pra eles virem tirar, mas disseram que os bichos não fazem nada, só querem comer fruta‘, diz.
Pai da bancária aposentada encheu de verde o enorme quintal da casa no Fazendinha. Foto: Lineu Filho
Tereza Belniaki, 60 anos, bancária aposentada e moradora da Rua João Bettega desde um ano de idade.
A família de descendentes de poloneses veio de Araucária em 1955 e é uma das mais antigas que moram na rua. Tereza tinha um ano de idade quando chegou à João Bettega, junto com os pais e os dois irmãos mais velhos – depois, nasceriam os dois irmãos mais novos. ‘Era uma estrada de barro, com um barranco, umas valetas e umas pontes de madeira‘, conta. Ela também se recorda de um moinho de cereais e de um armazém de secos e molhados que funcionava como terminal de transporte coletivo. ‘Só tinha uns ônibus pequenininhos, bem bonitinhos, tipo lotação, que paravam ali na frente.‘
O local era tão sossegado e seguro que Tereza se lembra de ir buscar banha no mercado de bicicleta, sozinha, desde bem nova. ‘Eu colocava a latinha da banha amarrada na garupa e ia pedalando pelo meio dos trigais. Tinha muito trigal aqui na região. Pra ir pra escola eu atravessava uma plantação que ficava onde é a Vila Rosinha‘, conta.
Passagem do trem
Apesar do jeito provinciano, o lugar também tinha sinais de modernidade, como uma grande fábrica de corda, que empregou muita gente da região, e uma fábrica de janelas e vitrôs, detalha Tereza. Qualquer novidade era uma festa para ela e os quatro irmãos: ‘Lembro de quando asfaltaram a rua. Primeiro botaram o antipó, depois o saibro, depois o asfalto. A gente ficava olhando e achava tão lindo‘.
Rosa Belniaki, 90 anos, uma das moradoras mais antigas da Rua João Bettega.
Anexo à casa da família, há um barracão desativado que seu pai costumava alugar. No local funcionaram um depósito de açúcar e uma estufa de amadurecer banana. ‘Aqui na frente passava muita boiada, passava cabrito…‘, recorda Tereza. ‘Uma vez, uma vaca invadiu o barracão e eu só ouvi o grito do inquilino: ’Dona Rosa, tem uma vaca aqui dentro!’‘, conta a mãe, rindo.
Quando moravam em Araucária, os Belniaki eram lavradores. Depois de venderem a chácara que tinham na cidade metropolitana e comprarem o terreno da João Bettega, Paulo trabalhou como corretor de imóveis e construiu barracões para alugar, de acordo com a filha. A princípio, a família se estabeleceu em uma casa de madeira, com um forno a lenha que Dona Rosa usava para assar pão. Depois, o pai ergueu a residência de alvenaria, a mesma onde hoje vivem Tereza, a mãe, um dos irmãos mais velhos, o cão são-bernardo Udo, o vira-lata Bento e dois papagaios.
Pracinha da Santa
A imagem de Nossa Senhora de Fátima foi colocada na “pracinha da santa” pela Paróquia São Jorge, se não falha a memória de Dona Rosa Belniaki, há mais de 20 anos. ‘Mas os sombreiros que têm ali foi meu pai que plantou‘, diz Tereza. A mania de Paulo de sair plantando árvores chegou a dar trabalho para a administração municipal. “Teve uma época que tinha tanta árvore que ele ia plantando e a prefeitura ia tirando. Chegaram a falar: ’Seu Paulo, aqui é local das pessoas caminharem, não pode ter tanta planta”, conta a filha.Vai um frete aí?
Nascido em Santa Luzia, na Paraíba, Odoaldo migrou para o Norte do Paraná, onde trabalhou como ‘peão de trecho‘, e chegou a Curitiba na década de 1960, aos 20 anos de idade. ‘Aqui na João Bettega não tinha supermercado, só bodegas. Também não tinha asfalto, era estrada de chão. Bem aqui perto tinha um moinho que beneficiava arroz, feijão, milho‘, relata. O sorridente paraibano, conhecido de toda a vizinhança, confirma a história das árvores da pracinha da santa. ‘Foi Seu Paulo quem plantou. Mas quando cheguei na cidade, essa praça nem existia, era só mato. Mudou bastante de lá pra cá‘, conclui.