Tem um lugar no bairro São Lourenço que todos deveriam conhecer. Não. Não é o parque e nem a Ópera de Arame. Apesar de lá, neste lugar, também ter música. Uma sala de música, na verdade, abarrotada de instrumentos novos, onde é possível aprender a tocar de graça. E não só isso. Aulas de inglês, artes, educação financeira, informática, literatura, filosofia, cidadania e natação, todas com material didático de primeira linha e ensinadas por professores de algumas das melhores instituições de ensino de Curitiba. Aberta há 18 anos, a Associação Ricardo Gadotti Feldmann (Arigaf) ajuda centenas de alunos de baixa renda e pode ser comparada a uma escola internacional de alto nível, só que com uma vantagem: totalmente gratuita.
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Pelo longo corredor, paredes com história. Cheias de fotografias, um enorme arsenal de declarações e homenagens escritas à punho. Entre eles um bilhete simples, com um trecho de “Imagine”, de John Lennon. “You may say I’m a dreamer, but I´m not the only one”, que traduzido para o português soa como: “você pode dizer que sou um sonhador, mas não sou único”. No último cômodo à direita, iluminados pelo sol que entra pelas janelas, cerca de trinta alunos, de pé, encerram mais um dia de estudos cantando uma música regida pela professora de inglês. A aula acabou, mas o dia está apenas começando, já que à tarde, a rotina na escola regular segue normal.
Assim funciona a Arigaf desde 2001, quando a empresária e patrona do projeto, Carmen Dolores Gadotti Feldmann abriu, no terreno de dez mil metros quadrados (onde era a chácara da sua família) uma escola sem fins lucrativos. A iniciativa foi motivada pelo desejo da educadora catarinense em ajudar ao próximo por meio da educação. “Ela utilizou suas próprias economias e transformou o imóvel da família numa escola exclusiva para alunos de baixa renda que, de alguma forma, apresentam inclinação para os estudos sociais”, revela o diretor financeiro da instituição, Thiago Pacheco. Os quartos viraram sala de aula e biblioteca, com direito a tabuleiro de xadrez, relógio de Dali e Dante nas prateleiras. Nas edículas, ao invés de churrasqueira, espaço multimídia, sala de música e até piscina aquecida. Do simples desejo de ajudar, a chácara inteira virou espaço de aprendizado.
Diferente
Se ao pensar em “escola”, o que vem à sua cabeça é português, matemática, história e geografia, saiba que na Arigaf é bem diferente. Com unidades temáticas voltadas basicamente aos estudos sociais, a escola abre apenas 70 vagas por ano e oferece módulos nos quais os alunos têm acesso a aulas práticas e teóricas em diferentes áreas do conhecimento todas lecionadas no contraturno da escola regular.
“A ideia é integrar conteúdos e não prejudicar nem concorrer, mas agregar ao que é ensinado na escola comum. O compromisso é tão sério que exigimos o boletim e quem indica o aluno à Arigaf é o próprio professor do colégio regular”, afirma a diretora pedagógica da associação, Ariana Bordinhão. Ao todo, o curso dura três anos e capacita os estudantes a conseguirem bolsas de estudos em instituições particulares de renome, parceiras do projeto. Até hoje, quase mil alunos já se formaram pela associação. A maioria cursou a universidade e conseguiu boa colocação no mercado de trabalho.
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Juliana Evelim de Souza, 28, se formou na primeira turma da Arigaf, em 2004. De família humilde, a curitibana fez faculdade de administração e, hoje, trabalha como analista de processos, em uma das maiores entidades ligadas à indústria do Paraná. “Depois de passar pela associação mudei totalmente minha forma de pensar e enxergar o sucesso. Pra uma adolescente de poucos recursos, moradora da periferia, o maior ideal de vida era virar a ‘loira do Tchan’. Na época eu achava que esse era o melhor jeito de ganhar ter dinheiro, fama e ser alguém na vida. Depois de entender que dinheiro não é tudo e que todos nós temos um papel importante a desempenhar na sociedade, mudei minha forma de pensar. Tudo graças à escola Arigaf”, revela.
Mudando vidas
O impacto na vida de Juliana foi tão forte que agora o filho dela, João Vitor, 12, é quem estuda na instituição. “Ele está cursando o primeiro ano na Arigaf e gosta muito da escola. Fico feliz e segura em saber que lá ele vai desenvolver hábitos saudáveis, como leitura, e se tornar um agente transformador na sociedade. Além, é claro, de agregar conhecimento em diversas áreas que a escola regular não consegue abranger”, diz.
Para outros alunos que passaram pela Arigaf, além da saudade dos tempos de contraturno, um sentimento fala mais alto: gratidão. É o caso da professora de inglês, Bruna Daum Alves, 23, que se formou na turma de 2006 e atribui à associação sua aptidão para exercer a profissão. “Na escola pública não tínhamos acesso a um ensino bilíngue com a mesma qualidade que o da Arigaf. Depois de três anos tendo aulas praticamente todos os dias, com professores especializados, saí de lá fluente em inglês e foi essa a minha escolha profissional. Sou grata à instituição por me capacitar a exercer a profissão que amo”, diz.
Mas não é só isso. Lições como cidadania, altruísmo e colaboração em sociedade, imprimiram na professora o desejo de lutar por uma causa maior: o engajamento social, sempre atrelado à associação. “Meu sonho é dar aula na Arigaf e ajudar as crianças a enxergarem a vida com propósitos, valores e a segurança de saberem que elas podem chegar onde quiserem. Basta querer”, ressalta.
Como a escola abre apenas uma turma por ano, as vagas de 2018 já foram preenchidas. Mas novos processos seletivos para a turma de 2019 vão acontecer a partir de agosto e, quem ficou interessado, poderá concorrer. Saiba como:
Quem pode concorrer?
Alunos que estejam entrando no 7º ano do ensino fundamental em qualquer escola da Rede Pública de Ensino (Municipal ou Estadual).
Quais os requisitos para participar do processo seletivo?
Ter obtido nos anos anteriores, comprovadamente, média igual ou superior a 7 (sete) em todas as disciplinas;
Ser de família com renda ‘per capita‘ de apenas um salário mínimo (Paraná);
* Como calcular a renda per capta: divide-se a soma dos rendimentos de todos os membros da família que moram na mesma casa pelo número total de membros. Os candidatos que apresentarem renda per capita acima de R$ 1.293,60 reais (por pessoa) não podem participar do processo seletivo.
Ter interesse e predisposição, comprovados pela família e professores, em frequentar a Arigaf durante os três anos pré-estabelecidos, a fim de atingir integralmente os objetivos do programa.
Como funciona o processo seletivo?
Primeiro é feita uma pré-seleção com base na situação escolar, socioeconômica e documental do aluno. É preciso também preencher uma ficha de inscrição e separar alguns documentos disponíveis no site www.arigaf.org.br
Em seguida os alunos passam por um teste de conhecimento com disciplinas do 1° ao 6° ano do Ensino Fundamental (português, matemática, história, geografia, ciências, inglês e redação).
Por último é feita uma entrevista pedagógica para conhecer o aluno e sua família, bem como apresentar melhor a escola ao candidato.
Mais informações no site da Arigaf
https://www.tribunapr.com.br/cacadores-de-noticias/curitiba/artista-multiplo/