Salgou no bolso!

Anunciado na última sexta-feira (3), o reajuste de cerca de 15% na tarifa do transporte coletivo de Curitiba – de R$ 3,70 para R$ 4,25 – pegou muita gente de surpresa e desagradou a população. Pelos pontos de ônibus, o que se viu ontem, dia em que a nova tarifa entrou em vigor, eram passageiros reclamando do aumento e contando as moedas para completar o valor da passagem, agora R$ 0,55 mais cara. O aumento no valor gerou um protesto que terminou com vandalismo na noite desta segunda-feira (6) em Curitiba. Onze pessoas foram detidas.

Maria: Lá em casa são oito que dependem do transporte público.
Na casa de Maria, oito pesoas dependem de ônibus.

“Foi demais, o prefeito prometeu melhorar para o povo e fez isso. Ficou muito ruim com esse aumento. Entre filhos e netos, são oito pessoas lá em casa que dependem de ônibus. Poderiam ter subido para R$ 3,80, já estaria bom. R$ 4,25 ficou muito caro, principalmente para quem está desempregado. Como a pessoa vai conseguir sair para procurar serviço?”, questiona a aposentada Maria Francisca Alves, 73 anos, que com o aumento, não pôde pagar as passagens e buscar seus netos no Caximba para irem até sua casa no Xaxim.

Lucas: Uso cartão transporte e sei que vai ser descontado ainda mais do meu salário
Lucas: Uso cartão transporte e sei que vai ser descontado ainda mais do meu salário

Esperando para embarcar no Ligeirão Boqueirão, a administradora Érica Pires, 43, era outra passageira insatisfeita. “Vai fazer muita diferença, vai ficar pesado no orçamento. E o pior é que a gente não vê muita vantagem, os ônibus são muito cheios, quando chove molha dentro, tem barata e muita sujeira. Foi um susto, fomos pegos de surpresa, não era isso que a gente ouvia durante a campanha (para prefeito). É por isso que sempre que posso uso outros meio de transporte, como o Uber, que oferece conforto a um preço mais em conta”, diz.

Erica: Vai ficar pesado no orçamento
Erica: Vai ficar pesado no orçamento

Mesmo recebendo créditos de vale-transporte fornecidos pela empresa, para o assistente comercial Lucas Gruber, 21, o aumento é visto como algo negativo. “Ficou muito caro, principalmente porque falta qualidade, segurança e conforto. Também precisamos de mais ônibus nas linhas. Uso cartão transporte e sei que vai ser descontado ainda mais do meu salário. E não é só isso, temos vários custos todos os dias, só o salário do povo não cresce na mesma proporção, ele nunca consegue acompanhar estes aumentos”, reflete.

Mais caro pra todos

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa
Vilna: O valor muda, só os ônibus que não.
Vilna: O valor muda, só os ônibus que não.

Moradora de Piraquara, a copeira Maria da Luz Bandeira Ribas, 42, pega quatro ônibus todos os dias, pagando nestas viagens o valor diferenciado das linhas da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), que variam de R$ 4,25 a R$ 5,30, dependendo da cidade. “São dois ônibus para ir para o trabalho e mais dois para voltar para casa. Esse aumento, vai fazer muita diferença no fim do mês, pesa para a família toda. Mas se ainda melhorasse alguma coisa, se aumentassem o número de ônibus em cada linha seria bom. Só hoje já estou há mais de 20 minutos esperando o Pinhais-Guadalupe”.

Maria da Luz pega quatro ônibus e preço varia entre R$ 4,25 e R$ 5,30.
Maria da Luz pega quatro ônibus e preço variam R$ 4,25 a R$ 5,30.

Também vivendo na RMC, a manicure Vilna da Mota Milanez, 41 conta que terá de rever o orçamento para poder continuar utilizando o transporte público. “Vamos ter que apertar ainda mais. Para vir de Almirante Tamandaré para cá pagamos R$ 4,30 por cada passagem, bem mais caro do que antes. O valor muda, só os ônibus que não, continuam velhos e demorados”, diz ela, acompanhada de sua mãe, a dona de casa Liderci Mota Milanez, 63, e de seu filho Felipe, 10.

“Ficou muito complicado, pra gente que pega ônibus todos os dias está muito pesado agora”, opina outra usuária, a dona de casa Mara Lúcia Santos, 54, que vive no Jardim Gabineto, na Cidade Industrial de Curitiba.

Alternativas

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

O economista Daniel Poit, membro do Conselho Regional de Economia do Paraná (Corecon-PR), considera este reajuste inoportuno, especialmente pelo momento de crise em que o país vive atualmente. “É ruim e até estranho um aumento deste, tão acima da inflação. Além disto, temos o problema do desemprego, são pessoas que não pegam o ônibus para ir e voltar do trabalho, mas para procurar um emprego. É uma política antissocial. Estamos em um momento complicado para os trabalhadores, de luta pela manutenção de seus empregos e também para as empresas. Para elas, cresce o custo operacional. No caso das famílias, dependendo da condição de cada uma, as despesas envolvendo transporte público podem comprometer até 30% da renda mensal”, observa.

De acordo com Poit, algumas mudanças de hábito podem ser adotadas por quem quer fugir do transporte coletivo. “Nesta hora, valem as dicas clássicas: fazer a pé as distâncias mais curtas, utilizar uma bicicleta, buscar por caronas em sites e rede sociais ou formar grupos de transporte colaborativo. Táxi e Uber com mais pessoas e em determinadas distâncias podem ser interessantes, mas geralmente custam mais. Aparentemente, o carro pode parecer ser mais vantajoso, mas antes de trocar o ônibus pelo automóvel é preciso avaliar a distância, o gasto com combustível e outras despesas, como IPVA, seguro, manutenção, estacionamento e até o valor do carro, que é um capital imobilizado. Com o uso de transportes alternativos, além de economizar a pessoa também estará se integrando socialmente”, indica.

Dobro da inflação

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

O economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos do Paraná (Dieese-PR), Fabiano Camargo da Silva, destaca que historicamente a tarifa vem subindo acima da inflação, o que não acontece com a maioria dos salários. Segundo o Dieese-PR, de julho de 1994 até agora, a tarifa teve variação de 962,50%, enquanto a inflação medida pelo INPC (que mede a inflação para famílias com renda de um a oito salários mínimos) teve alta de 478,09%.

Outro problema apontado por ele é com relação à estrutura do transporte público de Curitiba. “Não sabemos o valor real do custo da tarifa, o custo efetivo de cada empresa. Falta transparência e a solução de uma série de problemas, apontados por vários estudos entre eles, do Tribunal de Contas do Estado. Assim, estes aumentos acabam sendo paliativos. O que deveria ser mudada é a metodologia do sistema, que segue parâmetros obsoletos, utilizados desde a década de 80”, aponta.

Justificativas pros reajustes

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

De acordo com a prefeitura de Curitiba, o aumento nas passagens é justificado pela necessidade de recompor o equilíbrio econômico-financeiro do sistema de transporte público, o que deve incluir a retomada nos investimentos, como a aquisição de 24 novos ônibus biarticulados e a implantação do Ligeirão na linha Santa Cândida-Capão Raso.

Segundo a Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec), “a atualização das tarifas se faz necessária para a busca do reequilíbrio econômico-financeiro do sistema de transporte coletivo, pois o número de passageiros pagantes metropolitanos reduziu 9% no último ano”.

Para os próximos seis meses, há a promessa de que as equipes técnicas da Comec e da Urbs vão detalhar todas as ações necessárias para a implantação do novo sistema metropolitano de transporte para trazer melhorias para o transporte coletivo de toda a região.

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