Mas vai faltar grana no INSS daqui uns anos? A reforma vai acabar com o rombo financeiro? Vai ter dinheiro pra pagar todo mundo no futuro? A proposta é boa ou ruim? As dúvidas da população sobre a reforma da previdência são enormes. Então a Tribuna ouviu dois especialistas para buscar essas respostas. Eles não concordam em todos os quesitos, mas alertam a população para vários aspectos.

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Renato Follador, colunista da Tribuna, é consultor em previdência e finanças pessoais há mais de 30 anos. Criou e implantou vários fundos de pensão públicos e privados. Paula Cortellini é advogada especialista em previdência há quase 10 anos.

Para Follador, a previdência tem um enorme rombo, maior a cada ano, e qualquer reforma – mesmo a de Bolsonaro, que ele considera ruim – é necessária para não faltar dinheiro no futuro. Mesmo que as empresas devedoras de INSS, a maioria já falidas (como Varig, Vasp, Pan Am, etc.), paguem o que devem – a conta está na casa de bilhões – não refrescará o rombo, que se tornará cada vez maior. Na visão dele, a arrecadação feita hoje pelos trabalhadores também é insuficiente e, como a população está envelhecendo, no futuro haverá mais idosos recebendo aposentadoria do que jovens economicamente ativos bancando o INSS.

Já Paula tem uma opinião diferente. Ela diz que independente das empresas devedoras pagarem o que devem ao INSS, o sistema se sustenta sozinho. O que o prejudica é uma lei provisória, a Desvinculação de Receitas da União (DRU), aprovada para funcionar até 2023, que dá ao governo o direito de tirar 30% do dinheiro da previdência para gastar com o que quiser.

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“O dinheiro pago pelo contribuinte ao INSS é para pagamento de benefícios, não para outros setores. Existem estudos feitos por universidades renomadas que comprovam que o sistema atual do INSS é saudável. O que está causando o rombo é a má administração do governo, que não soube gerir adequadamente as suas contas e todo mês tira esses 30% do INSS para honrar outros compromissos, sem obrigação de devolver o que pegou. Claro que uma hora, de tanto tirar, vai desequilibrar o INSS, que tem um sistema de cálculo perfeito. Então o problema é a má gestão, não a atual fórmula de arrecadação e pagamento do INSS”, analisa a advogada.

Capitalização

Quando fala da reforma, o governo diz que um dos objetivos é a ‘capitalização‘ do sistema. Antes de explicar isto, é preciso entender o que é Seguridade Social. A Seguridade se divide em três partes: previdência (INSS, que paga aposentadorias e outros benefícios) + saúde + assistência social (o que inclui a educação). Quando falta dinheiro no INSS, tira-se da saúde e educação para honrar os benefícios do INSS.

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Mas vamos supor que não seja necessário tirar de nenhum lado e que o INSS consiga arrecadar mais do que precisa pagar. Esse excedente é a tal capitalização, dinheiro que pode ser usado para investir no Brasil e fazer a nação se desenvolver. No ponto de vista de Follador, a reforma de Bolsonaro não vai conseguir a capitalização e, pior, a previdência precisará passar por nova reforma daqui uns 10 anos (aumentar novamente a idade mínima de aposentadoria) para que continue se sustentando.

Colunista da Tribuna, Renato Follador é crítico da proposta da reforma da previdência. Foto: Felipe Rosa/Tribuna do Paraná

“O governo está jogando fora estudos técnicos, entre eles o fator previdenciário (feito pelo IBGE e estudiosos em expectativa de vida e previdência) para colocar em prática uma previdência com base o ’achismo’. Até agora ninguém da equipe econômica explicou os cálculos, a partir de que estudo ou base técnica criaram essa proposta. Não vai funcionar. O governo está perdendo a oportunidade de fazer uma reforma longeva, aproveitando o que já tem, apenas fazendo pequenos ajustes”, critica Follador, que entregou ao próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, suas recomendações.

Resolve o problema?

Tanto para Paula, quanto para Follador, a reforma não resolve o problema. Para ambos, a reforma é ruim na maioria dos pontos, além de estar sendo de difícil compreensão para mais de 90% da população.

Live

Quer tirar sua dúvidas? Então não perca hoje, às 14h30, a live com o consultor financeiro Renato Follador, colunista da Tribuna e especialista em previdência, pelo Facebook da Tribuna do Paraná.

A reforma da previdência, Tim-tim por tim-tim

 

Será que me aposento?

 

Por essas e outras, a Reforma da Previdência está deixando todo mundo confuso e apavorado. O governo Bolsonaro afirma que ela é necessária para garantir que, no futuro, o País tenha dinheiro para honrar as aposentadorias. Mas as regras são numerosas e confusas, o que levou multidões a escritórios de advocacia e de consultores especializados em previdência.

O escritório de Paula, localizado no Centro de Curitiba, foi um deles. “As pessoas estão com medo de não conseguirem se aposentar. Até quem já é aposentado tem medo de perder o benefício”, diz Paula, que pacientemente atende e explica cada caso.

Um destes exemplos é da auxiliar de limpeza Tatiana dos Santos, 33 anos, que mora em São Paulo. Ela ficou viúva em 2014, aos 27 anos, época em que era totalmente dependente do marido. Mesmo com a pensão de dois salários mínimos que passou a receber, se viu obrigada a trabalhar para complementar a renda e sustentar os dois filhos, atualmente com 8 e 14 anos pois o marido não lhe deixou nenhum dinheiro ou patrimônio. “Aqui em São Paulo o custo de vida é muito alto. Eu até tentei voltar para o Piauí, mas por outro lado, lá tem menos empregos e os salários são menores”, diz ela, que atualmente ganha um salário mínimo como auxiliar de limpeza e teve o primeiro registro na carteira de trabalho aos 30 anos.

Devido ao alto custo de vida na capital paulista, mesmo somando salário e pensão, o dinheiro é bem contado para não faltar: van escolar, aluguel, transporte, saúde das crianças, remédios, entre outras necessidades.

Mas os anos passaram e Tatiana conheceu outra pessoa: está com casamento marcado para 30 de março. Desde então, mal dorme com medo de perder a pensão. “Mas a advogada me tranquilizou. Só perde o benefício quem é funcionário público ou militar. Como sou do regime geral do INSS, permaneço recebendo. Graças a Deus, porque só com o meu salário não sustento meus filhos”, disse Tatiana. “Muitos aposentados ou pensionistas têm me procurado com medo de perder o benefício com a reforma. Mas para esse público não muda absolutamente nada. Continuam recebendo normal”, explica Paula.

Ficou no quase!

O empresário Ayrton José Discini Filho, 58 anos, por muito pouco não deverá pegar a fase de transição. Pelas contas dele ainda faltavam quase três anos para se aposentar. Mesmo que entrasse numa regra de transição, achava que teria que trabalhar até perto dos 70 anos para pegar a aposentadoria integral. Mas em contato com um grupo de amigos da adolescência, descobriu que os dois anos e 11 meses que passou estudando no colégio agrícola contavam como contribuições ao INSS.

Mesmo assim, por falta de informação, achando que ter 35 anos de contribuição seria suficiente para se aposentar, ele quase foi ao INSS pedir o benefício. Sorte que consultou antes uma advogada e descobriu que não pegaria o benefício integral. Seria necessário trabalhar mais quatro meses para isto, o que daria uma diferença de R$ 800 a mais a receber por mês.

“Na velhice, a gente precisa de mais cuidados, consome mais remédios. Veja a minha mãe, toma 13 por dia. Gasta R$ 900 com medicamentos por mês. Esses R$ 800, se eu tiver boa saúde e não gastar com remédios, vou precisar para outros cuidados que todo idoso precisa”, explicou ele, que faz aniversário no próximo 16 de abril, detalhe que vai somar um ponto a mais nessa conta para pegar a aposentadoria integral.

Vou perder meu benefício?

Paula explica que as pessoas que preencherem os requisitos para aposentadoria até o dia anterior à data de promulgação das novas regras, continuam se aposentando pela lei antiga. Para explicar melhor, ela dá o seguinte exemplo: suponha que você tenha completado todos os requisitos no dia 12 de abril e, no dia 13 de abril (datas fictícias) as novas regras passem a valer.

Mesmo que a pessoa só vá ao INSS no dia 13, 14 de abril ou qualquer outra data posterior, ela continua sendo aposentada pelas regras antigas, pois vale a data que ela completou os requisitos. Mesma coisa a pensão por morte ou pensão por invalidez, por exemplo. Vale a data do falecimento do cônjuge ou do acidente que deixou a pessoa inválida, não a data que ela solicita o benefício.

A advogada ressalta que a reforma ainda não está valendo. Ela sequer foi discutida e aprovada pelo Congresso Nacional, que ainda deve solicitar muitas alterações neste texto.

https://www.tribunapr.com.br/noticias/economia/reforma-da-previdencia-consultor-renato-follador-tira-suas-duvidas/