Por causa do último edital lançado pela Prefeitura de Curitiba, que prevê a contratação de instituições comunitárias e privadas para atender crianças de Educação Infantil (0 a 5 anos), 12 Centros de Educação Infantil (CEI) da capital decidiram fechar as portas. A cidade tem atualmente 73 centros dessa categoria e, segundo os pais, a medida poderá impactar até duas mil crianças.
O principal motivo seria financeiro, já que as escolas afirmam que não conseguirão se sustentar só com o valor que será repassado pela prefeitura em 2020. O assunto gerou protestos e o Ministério Público do Paraná (MP-PR) entrou, nesta quarta-feira (6), com um mandado de segurança pedindo a suspensão do edital.
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Além do mandado, pais de alunos realizaram uma petição, com 14.230 assinaturas, também solicitando a suspensão do edital. O documento foi anexado ao do MP, que deverá ser julgado na semana que vem. A justiça deu um prazo de 72 horas à prefeitura, a contar desta quinta-feira (7), para se manifestar sobre o assunto antes do julgamento.
A Prefeitura de Curitiba garante que não haverá diminuição das vagas, ao contrário do que dizem os pais e representantes de CEIs que sofreram os impactos das mudanças, já que 99 novas instituições participaram do edital. Em nota enviada para a reportagem, a prefeitura informa que a expectativa é de que após o processo de conferência de documentação, estejam habilitadas instituições suficientes para a criação de 2,3 mil novas vagas.
Conta não fecha
Marcelo Cruz, presidente da Associação de Centros Comunitários de Educação Infantil de Curitiba, conta que o edital pegou todos de surpresa. Não houve tempo hábil das instituições se adequarem. Ele confirma que o que mais afetou foi a questão financeira.
Como o valor que a prefeitura repassa aos CEIS, por aluno, não é suficiente para manter as atividades – este ano foi de R$ 5.517 anuais -, as instituições pediam contribuições voluntárias aos pais para complementar os gastos. O custo por aluno passa de R$ 800, que inclui as despesas necessárias para a manutenção da escola, além do pagamento de salários, que corresponde a cerca de 75% da despesa das instituições.
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Este último edital proibiu as instituições de pedirem a contribuição voluntária, o que gerou revolta dos pais, que não se importavam em pagar para melhorar a qualidade do serviço prestado aos seus filhos.
A Tribuna conversou com alguns pais do CEI Adolfo de Bezerra Menezes, único CEI no Centro, que atende 270 crianças, e um dos que fechará as portas. Eles disseram que a contribuição nunca foi obrigatória, variando de R$ 50 a R$ 400 conforme a condição de cada pai. Mesmo a prefeitura aumentando em 77% o valor do repasse para 2020, passando a custear R$ 8.600 por ano por aluno, o montante não é suficiente para arcar com os custos das escolas.
Vamos fechar!
Um dos CEIs que vai fechar as portas é o Josefina Rocha, no Bacacheri. A instituição tem 58 anos de história e não possui alunos particulares, somente do convênio da prefeitura. “O que mais nos atinge é a insegurança do contrato. Neste novo edital, não existe nenhuma garantia de que a prefeitura irá nos encaminhar o número mínimo de crianças que precisamos para pagar os custos e nos manter funcionando”, diz uma funcionária da escola, que pediu para não ser identificada.
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Além disto, ela explicou que a prefeitura tirou todas as crianças com 4 e 5 anos dos CEIs e mandou para os CMEIs, que são municipais. Os CEIs ficarão só com as crianças entre 0 e 3 anos. “Nós não estamos preparados para isto porque nosso público era das crianças maiores. Teríamos que readequar toda a escola para atender os menores e não temos esse recurso”, analisou.
Acolhimento
Ela explica que não foi somente a proibição de pedir contribuições aos pais que levou à decisão de fechar, já que o Josefina Rocha é uma instituição social e não visa lucro. Conforme ela, o grande foco do CEI era o acolhimento das famílias, individualmente, no portão da escola. Como agora é a Secretaria de Educação que distribuirá os alunos em cada instituição, eles não poderão mais fazer as matrículas diretamente e conhecer cada família.
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Segundo eles, isso tirou o objetivo social da escola. “Nosso lema sempre foi atender com amor. Nosso foco não é só fazer matrícula e atender a criança. Nosso diferencial sempre foi o acolhimento. É claro que se a prefeitura nos mandar uma criança, ela será atendida com amor. Infelizmente é um ciclo que se encerrou”, disse a funcionária, com a voz embargada, contando que já chorou muito junto com outros funcionários. Todos serão demitidos.
As novas regras geraram muitas dúvidas. A Tribuna conversou com pais e representantes da comunidade escolar além da diretora do Departamento de Educação infantil da Secretaria Municipal de Educação, Kellen Patrícia Collarino, para esclarecer cada um dos pontos levantados pelos pais.
Custo por criança
Pais e CEIs: O representante das creches comunitárias de Curitiba, Marcelo Cruz, explica que o valor que será repassado pela prefeitura, no ano que vem será suficiente para cobrir somente 200 dias letivos. Um cálculo feito em 2017, diz ele, e com as devida correções monetárias, diz que atualmente uma escola precisa de cerca de R$ 12 mil anuais para atender uma criança.
Prefeitura: Conforme Kellen, os estudos feitos chegaram a três propostas de valores mensais, mas como, por lei, a prefeitura só pode fazer contratos com base em Convenção Coletiva de Trabalho, os outros dois valores foram descartados, permanecendo o valor anual de R$ 8,6 mil.
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Proibição de contribuição
Pais e CEIs: A contribuição voluntária que os pais davam aos CEIs ajudava a manter a qualidade do atendimento. O edital proibiu. Haverá demissões e substituição de profissionais graduados por outros sem a devida formação.
Prefeitura: Conforme Kellen, o que o edital busca proibir é que as escolas exijam o pagamento dos pais. “Não podemos permitir que o pai receba um bilhete na agenda da escola, exigindo que ele pague um valor em atraso. É um serviço público, não pode ser cobrado. E a prefeitura já está remunerando as escolas por isto.”, diz ela.
A Tribuna ainda questionou Kellen que, se o CEI pode receber doação de empresa e outras entidades, por que não poderia receber dos pais. Ela disse que o pai não é proibido de doar nada à escola, desde que isto seja voluntário.
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Misturando a criançada
Pais e CEIs: As crianças entre 4 e 5 anos serão mandadas aos CMEIs. Vão permanecer nas escolinhas contratadas somente as crianças entre 0 a 3 anos. Como nos CMEIs existem crianças de até 11 anos, os pais estão preocupados com essa mistura de idades. Também questionam se a estrutura está preparada para atender os menores.
Prefeitura: A diretora de Educação Infantil explica que um novo documento do MEC diz que a interação dos menores com os maiores é benéfica. É um novo conceito que está na Base Nacional Curricular. É claro, diz ela, que isto não é feito sem os devidos cuidados e supervisões.
Atualmente todos os CMEIs possuem estruturas separadas para as crianças menores e para as maiores. O recreio, inclusive, é feito em horários diferentes. As salas de aula e banheiros não precisarão ser adaptados para as crianças menores, visto que isso já existe nos CMEIs. “Os tempos são outros e a educação precisa acompanhar isto. Existem novas metodologias, novos conceitos. Não estamos dizendo que as crianças podem ficar soltas o tempo todo, mas é bom que eles tenham outros pares”, analisa Kellen.
Quantidade de professores
Pais e CEIs: Cerca de 2.600 crianças que eram atendidas pelos CEIs vão passar aos CMEIs. Os pais questionam de onde virão tantos professores e funcionários para suprir a nova demanda.
Prefeitura: Kellen diz que, assim que esta gestão assumiu a prefeitura, havia 16 CMEIs novos na cidade, recém-construídos, sem uso, porque a gestão anterior programou as construções mas não reservou orçamento para contratar profissionais. A Secretaria de Educação abriu uma ou duas turmas em casa escola e depois abriu um Processo e Seleção Simplificado (PSS), no qual contratou equipe suficiente para abrir mais salas de aulas nos 16 novos CMEIs. Ainda serão contratados mais alguns professores em regime de PSS para suprir a demanda.
Escola fora do trajeto
Pais e CEIs: Ao invés de matricular os filhos perto de casa, muitos pais matriculam perto do trabalho por facilitar a logística. No cadastro deste ano, foi solicitado o CEP da residência e seria priorizado uma escola perto da casa da família.
Prefeitura: Kellen diz que a pessoa tanto podia colocar o CEP da residência quanto do trabalho. E com base neste CEP apareciam as escolas mais próximas. Portanto, os pais podem procurar escolas mais convenientes para o trajeto da família.
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Período integral
Pais e CEIs: Pelo edital, não há garantia que os alunos que estudam em período integral vão conseguir vaga integral na nova escola. “Eu trabalho oito horas por dia. Eu sou sozinha, só eu e meu filho. Estou apavorada, não sei o que fazer”, disse uma mãe entrevistada esta semana.
Prefeitura: Kellen explica que isto é um boato e que quem já é aluno do integral está com a vaga integral garantida. Ninguém será mandado ao meio período.
Prefeitura esclarece
Após a publicação da reportagem, a Prefeitura enviou uma nota para esclarecer pontos que julgou necessários. Segundo a nota, o edital em vigor expira em dezembro de 2019, sendo portanto necessário nova regulação do serviço e o novo documento traz melhorias para o sistema e, ao contrário do que pensam os pais, ampliam a capacidade de atendimento aos pequenos.
A nota diz ainda que das 73 prestadoras de serviço com os atuais contratos, 61 estão participando do novo credenciamento (83,5%) e outras 38 novas instituições também se cadastraram. No dia 11 de novembro sairá a lista final de todas as credenciadas. “O incremento na oferta de vagas é fruto de um trabalho sólido e responsável, pelo qual a gestão colocou em funcionamento, desde 2017, 16 CMEIs e criou as condições financeiras para o aprimoramento da rede pública municipal de ensino”, diz o texto.
A Prefeitura garante ainda nenhuma das crianças matriculadas hoje sofrerá interrupção na sua trajetória escolar. “Elas têm vaga assegurada e serão atendidas pelas instituições que estão sendo cadastradas em novo edital (e que pode ser exatamente a mesma que a atende hoje) e também pela rede municipal”.
Os contratos foram aprimorados, segundo a prefeitura, para assegurar que a política pública seja aplicada em sua melhor forma, com critérios técnicos, dificultando desvios de qualquer natureza. “Nenhuma família poderá, daqui para frente, receber pedido de qualquer cobrança monetária por parte da prestadora de serviço. Essa medida tem o objetivo de proteger as famílias economicamente mais vulneráveis”, adiciona a Prefeitura.