“Um balde de gelo na espinha”. É como Daniela*, 28, descreve a sensação de ver a foto do namorado ao lado de outra mulher postada em uma rede social em plena noite de Réveillon. A revelação veio por meio de uma mensagem anônima que chegou por meio do aplicativo Whatsapp. “Chegou um ‘print’ de uma foto dele celebrando com outra menina e um recado: ‘você não merece o que estão fazendo com você’. Na hora fiquei transtornada. Ao mesmo tempo eu trocava mensagens com ele, que dizia estar ceando com os pais em casa”, lembra. Depois do choque e da confirmação da traição, o relacionamento terminou ainda enquanto os fogos estouravam. “Eu nunca gostei muito das festas de fim ano, mas essa foi a pior noite de Ano Novo da minha vida”, afirma.
No mesmo celular pelo qual Daniela* recebeu a notícia devastadora, chegaram as palavras de conforto da terapeuta da família, que a acompanha há alguns anos e atendeu prontamente ao chamado da moça, na mesma noite. “Por sorte ela costuma responder whatsapp rápido. Na mensagem ela me falou sobre como lidar com esse sofrimento. Foi o que me acalmou e evitou que eu ficasse pior”, diz.
Leia também: Campanha Setembro Amarelo alerta para prevenção ao suicídio
Assim como Daniela*muita gente “pediu socorro” a especialistas e entidades focadas em apoio emocional e saúde mental, em Curitiba, neste fim de ano. Somente no Centro de Valorização da Vida (CVV), foram realizados 275 atendimentos entre os dias 24 e 31 de Dezembro. O número é 25% maior do que durante os outros meses do ano. Quem explica é Quintino Dagostin, um dos voluntários responsáveis pelo programa que atende pelo serviço há mais de 20 anos. “Nessa época as pessoas avaliam tudo o que passou e se frustram por não terem alcançado seus objetivos durante o ano. Nessas horas falta alguém pra desabafar então muitos entram em contato conosco para abrir o coração”, conta.
Funcionando há 36 anos em Curitiba, o CVV conta com 50 voluntários que fornecem apoio emocional 24hs por telefone, e-mail, Skype e pessoalmente. O programa tem sedes espalhadas pelo Brasil e recebe quase 5 mil ligações por dia por meio do telefone 188. Os atendimentos preservam a identidade do solicitante e consistem basicamente na disponibilização de “um ombro amigo” nos momentos de maior angústia para quem não sabe a quem recorrer. Em Curitiba, segundo Dagostin, mais de 2.500 apoios mensais são feitos por meio do programa. Os motivos das ligações vão de desabafos até situações iminentes de suicídio que, como revela Dagostin, representam 30% dos atendimentos. “Nessas horas nós acolhemos e procuramos acalmar quem está do outro lado da linha. O CVV não trabalha com aconselhamentos mas com clarificações. A medida que as pessoas desabafam e põe tudo pra fora elas se acalmam e voltam a pensar de forma mais clara”, explica.
Leia também: Conheça os 12 principais sinais de quem está pensando em suicídio
Infelizmente a falta de informação e o preconceito em relação à doença fazem com que muita gente se recuse a reconhecer que precisa de ajuda. De acordo com a psicóloga clínica Marcia Silveira, é aí que mora o perigo. “Muitas pessoas em depressão demoram muito pra procurar apoio e costumam esperar a situação chegar ao limite”, afirma. Resultado da baixa produção cerebral dos neurotransmissores serotonina e dopamina – responsáveis pela regulagem do humor e pelas sensações de prazer e bem estar – a depressão pode ser consequência de fatores biológicos, psicológicos, sociais ou eventos traumáticos, como a história de Daniela*, citada no início da matéria.
Segundo Marcia, os motivos que levam muitos pacientes portadores de depressão a se sentirem ainda piores durante as celebrações de fim ano são a quebra da rotina e as reflexões comuns à época. “Durante o ano existe um ‘redemoinho’ que leva as pessoas a atitudes e comportamentos que normalmente nem percebem. Com o fim do ano, o ritmo muda e as pessoas pensam em recomeços, novos projetos e percebem mais claramente as frustrações. Muitos se sentem desmotivados ao notarem que não evoluíram da forma que esperavam e ficam ainda mais depressivos”, explica. Segundo a psicóloga, muitos não conseguem deixar os pensamentos negativos e nessa hora, é importante buscar apoio profissional.
Conselhos pra recomeçar
O ano que passou pode não ter sido fácil pra muita gente, mas para quem quer começar bem 2018, a psicóloga aconselha um exercício mental simples, porém eficaz. “As pessoas tendem a pensar só naquilo que deu errado. É importante mudar e focar nas coisas boas também. Ninguém vive só de episódios negativos”, pondera. Outro conselho é buscar atividades prazerosas, como boas leituras e práticas que tragam a sensação de bem estar. As más companhias, os relacionamentos abusivos e os vícios devem ser eliminados. “Gosto de comparar a vida como uma grande mochila na qual vamos colocando várias coisas. Com o tempo muito daquilo que julgávamos essencial acaba ‘estragando’ lá dentro. Por isso é importante saber o motivo de parar e retirar da mochila tudo aquilo que não nos serve mais e nos faz mal”, diz.
Leia também: Jogo Baleia Azul deixa Curitiba em alerta: oito já brincaram com a morte
Para Quintino Dagostin, o momento é de repensar as relações interpessoais e também com o trabalho. “Não se pode resumir a vida entre casa e trabalho. É preciso estar entre pessoas, vivendo momentos que agreguem e construam boas relações. Nessas horas vale procurar os amigos, a família ou a igreja”, finaliza.
Tudo tem jeito
Para quem pensa que é o fim da linha e nada mais tem jeito, o CVV conta com o Grupo de Apoio dos Sobreviventes do Suicídio (GASS), que funciona todas as primeiras terças-feiras e penúltimas quintas-feiras do mês, na sede do CVV, às 19h30 e às 15h, respectivamente. Nas reuniões, voluntários que já sentiram na pele o terror de atentar contra a própria vida, trocam experiências e dão apoio para quem se sente da mesma forma.
- Veja as dicas da pisóloga Michelli Duje pra recomeçar:
- Transforme o seu Natal e ano novo em momentos positivos
- Supere as dificuldades e recomece nesse Ano Novo!
Outra ação que pode ajudar muita gente é o “Janeiro Branco” – no qual serão promovidas campanhas educativas para a saúde mental, durante todo o mês. No Paraná, a campanha conta com o apoio do Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CPR-PR) busca viabilizar maior conscientização psicológica por meio do trabalho de diversos profissionais ligados à saúde e à assistência social com o compartilhamento de posts e palestras-relâmpago sobre saúde emocional em salas de espera de hospitais, escolas, empresas, igrejas, parques, praças, auditórios, faculdades e todos os espaços públicos e privados nos quais as pessoas possam ser inspiradas e incentivadas a pensarem melhor sobre o tema.
Mais detalhes sobre a programação em Curitiba podem ser encontrados no site : www.janeirobranco.com.br e www.facebook.com.br/campanhajaneirobranco
Ajuda Gratuita
Pra quem precisa de ajuda profissional mas não dispõe de plano de saúde nem de recursos para pagar um especialista, diversas universidades oferecem atendimento gratuito ou prestado por valores simbólicos durante todo o ano. Os serviços são prestados por formandos dos centros educacionais e contam toda a estrutura de qualquer clínica particular. De acordo com a psicóloga Marcia Silveira, os serviços são seguros e podem ser procurados tranquilamente pelos pacientes. “Tudo é supervisionado pelos professores e trabalhado em ambientes seguros e muito profissionais”, afirma.
Confira a lista com as universidades que oferecem o serviço:
Universidade Tuiuti do Paraná (UTP)
Segunda a sexta-feira, das 8h às 21h e sábados das 8h às 12h
Fone: (41) 3331-7836/ (41) 33317846
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Segunda a sexta-feira das 8h30 às 22h
Fone: (41) 3310-2614
Clínica de Psicologia Uniandrade
Segunda a sexta-feira, das 8h às 22h
Fone: (41) 3219-4290
Núcleo de Práticas em Psicologia da PUCPR Segunda a sexta-feira, das 8h às 22h
Fone: (41) 3271-1663/ (41) 3271-1591
Centro de Psicologia UP
Segunda a quinta-feira, das 7h30 às 22h30 Sextas, das 7h30 às 21h Sábados, das 8h às 12h
Fone: (41) 3213-5227
Psicofae – FAE
Segunda a sexta-feira das 8h às 21h
Sábado das 8h às 12h
Fone: (41) 2105-4826/ 2105-4815
Serviço Escola de Psicologia FACEL
Segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 21h
Fone: (41) 3087-9650
Clínica Tatiana Fortes
Terças e sextas-feiras, das 9h Às 21h
Fone: (41) 3310-1531
Clínica Integrada de Saúde
Segunda a quarta e quintas-feiras, das 8h às 12h, e das 13h às 18h Terças e sextas-feiras das 8h às 12h, e das 13h às 20h30
Fone: (41) 3267-9108/ (41) 3369-2627