Foi em 1977 que o menino Wesley saiu cedo de casa para recolher uma pedra com formato bem esquisito que havia caído próximo ao muro do condomínio onde morava, no bairro Portão, em Curitiba. Mal sabia ele que, 43 anos mais tarde, a tal peça seria importante para pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) pesquisarem a origem do Sistema Solar.
Na noite em que o meteorito caiu do céu, Wesley havia escutado um estrondo muito grande e seu pai, seu Vanderlei, que olhava pela janela, viu um clarão no céu. “Meu pai viu aquilo e, como viveu muito tempo em sítio, disse que era ‘pedra de raio’”, relembra o vendedor Wesley Cândido Venceslau, hoje com 52 anos.
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No dia seguinte, bem cedo, o menino foi procurar a tal “pedra de raio” que o pai havia comentado. “Eu achei a pedra perto do muro. Voltei para casa correndo com ela”, conta. Desde então, o objeto inusitado ficou guardado com a família, na inocência de ser apenas uma pedra diferente. “Era nossa relíquia. A gente sabia que poderia ser de fora, do espaço, mas ninguém tinha visto nada parecido. Então guardamos esses anos todos”, explica.
Com cerca de 13 centímetros de comprimento e pesando mais de 1 kg, a “pedra de raio” foi envernizada e guardada. Até que uma notícia sobre meteoritos encontrados em Santa Filomena, no interior de Pernambuco, chamou a atenção da família Venceslau. “A gente ficou sabendo do que aconteceu em Santa Filomena e imaginamos que a nossa pedra poderia ser um meteorito também”, suspeitou Wesley.
Foi então que a irmã mais nova de Wesley, a pedagoga Quezia Cândido Venceslau, de 39 anos, decidiu entrar em contato com a UFPR para tirar a dúvida de todos. “Guardamos a pedra por 43 anos sem saber que era um meteorito. A gente imaginava que pudesse ser, mas não tinha nenhum laudo que comprovasse”, diz a pedagoga.
Para tirar a prova, a Wesley e Quezia mandaram fotos da rocha para o professor Fabio Braz Machado, do departamento de Geologia da UFPR, que dias depois foi até a casa da família para fazer uma avaliação mais precisa. Uma parte da pedra foi doada e uma análise em laboratório comprovou o que todo mundo já desconfiava. A pedra é de fato um meteorito raro e especial, pois tem aproximadamente entre 4,1 e 4,6 bilhões de anos de idade — podendo ser a rocha mais antiga já encontrada no Brasil.
Mais do que raro
Todos os dias, mais de uma tonelada de corpos celestes atingem a atmosfera da Terra. Quando chegam ao solo, ganham o nome de meteoritos — grande maioria chegam menores que um grão de arroz.
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“São aquelas estrelas cadentes que vemos no céu. Alguns podem adquirir um formato orientado. É como estar num carro dirigindo e aí cai uma gota de chuva no parabrisa. Com o carro em movimento, essa gota cai e fica deformada, alongada. Foi o que aconteceu com esse meteorito”, descreve o Fabio.
O meteorito da família curitibana tem uma forma inusitada, deformada, porque sofreu atrito com a atmosfera da Terra. “Ele caiu a uma velocidade de 30 km por segundo, por isso ficou com essa forma. É um meteorito orientado do tipo condrito, que chamou a atenção no laboratório porque é muito raro”, explica o geólogo. A rocha ainda deve receber outras subclassificações nos próximos meses, após análises mais detalhadas.
Por ter certamente mais de 4 bilhões de anos, o meteorito vai ajudar a universidade a saber mais detalhes sobre a origem do Sistema Solar. “Nosso sistema tem 4,6 bilhões de anos. E o meteorito tem minerais e elementos químicos que não são encontrados na Terra. Provavelmente. veio do cinturão de asteróides que fica entre Marte e Júpiter”, revela o professor”. “Em tempos em que muitos acreditam na Terra plana, o meteorito é a prova de que o planeta é redondo”, ressalta o geólogo.
Relíquia valiosa
O meteorito é relíquia da família, mas o apego não é tão forte assim. Isso porque Wesley confessou que, caso apareça alguma proposta de compra, ele vende a pedra sem pensar duas vezes.
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“Já fiz a minha parte, doei um pedaço para universidade. O restante vamos ver, né? Ela caiu do céu e, se der, podemos fazer um dinheirinho com ela nessa pandemia”, brinca.
Wesley chegou a pesquisar sobre o valor da pedra, que pode chegar a valer R$ 40 mil o kg. “Ela vai ser registrada na sociedade internacional de meteoritos, vai ser batizada de Meteorito de Curitiba. Vai passar por testes, ser datada e tudo mais. Será a mais antiga rocha no Brasil, a nossa de Curitiba”, conta, orgulhoso.