Lá no ano de 1919, a cada dois óbitos que ocorriam em Curitiba, um era de criança. E sabe por que isto acontecia? Pelo simples fato de que a capital não tinha nenhum atendimento de emergência pediátrico. O mais triste é que boa parte dos casos tinha solução ou cura. Muitos eram até simples de resolver, faltava apenas uma avaliação médica básica.
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Foi então que uma mulher chamada Maria Bárbara, viúva do desembargador Agostinho Ermelino de Leão, mudou essa realidade. Ela percebeu a aflição das mães com seus filhos doentes no colo, que não tinham para onde correr na emergência. Então ela juntou algumas amigas, pertencentes ao Grêmio das Violetas (até então, os Grêmios femininos se ocupavam apenas de chás e distração e as mulheres não tinham voz na política e na sociedade), e fundaram a Cruz Vermelha no Paraná. Iniciaram um projeto de atendimento emergencial numa casa emprestada pela Família Gomm na antiga Rua da Liberdade (atual Rua Barão do Rio Branco), com médicos e enfermeiros voluntários que atendiam das 9h às 11h diariamente.
Era o Instituto de Higiene Infantil e Puericultura da Cruz Vermelha, que oferecia consultas e remédios gratuitos a crianças e adolescentes carentes. Este atendimento inicial salvou milhares de vidas e logo a sociedade notou a importância do serviço, que rapidamente passou a atender no seu limite.
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Em 1922, iniciou-se a construção do Hospital de Crianças, para onde o Instituto se mudou definitivamente em 1930 (quando a obra ficou pronta) e onde está até hoje, na Rua Desembargador Motta, esquina com a Avenida Silva Jardim, no Centro de Curitiba. Desde 1932, quando foram inauguradas as três primeiras enfermarias, o hospital nunca mais fechou as portas. São 87 anos aberto ininterruptamente, 24 horas por dia.
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O hospital já teve outros nomes (como Hospital Cesar Pernetta, em referência ao médico que foi muito importante para a instituição na época e também criou o soro Pernetta – soro caseiro – usado até hoje, que tratava da desidratação por diarreia, doença que matava muitas crianças na época). Aliás, a maioria das mortes infantis eram por gastroenterites, geradas pela falta de saneamento e de informação dos pais. Mas o nome pelo qual você conhece o local hoje é Hospital Pequeno Príncipe (HPP), que neste dia 26 de outubro, está completando 100 anos.
Nem velho, nem obsoleto!
O HPP tem hoje 32 especialidades médicas, 2.500 funcionários, 350 médicos e 1.500 voluntários. Com base na quantidade de especialidades e de cirurgias, é o maior hospital geral pediátrico do Brasil, um dos cinco maiores da América Latina e referência em atendimento a doenças raras, cirurgias complexas, transplantes de órgãos sólidos e medula. Mas apesar da idade, seu diretor, José Álvaro Carneiro, diz que o HPP não é uma instituição velha.“A medicina evoluiu, o nível de detalhes vai sempre avançando e a gente vai incorporando novas tecnologias. É muito difícil acompanhar tudo. Mas a gente vem conseguindo.
Além disso, fomos o primeiro hospital acreditado do Paraná (que conseguiu uma certificação de qualidade na área hospitalar) em seu nível máximo. Fazer muitas coisas diferentes e complexas, com alto nível de excelência, a gente só conseguiu porque é uma instituição contemporânea e de boa performance”, se orgulha José Álvaro.
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Mas isso não basta para o hospital, que a partir do ano que vem deve iniciar a construção de mais um prédio no bairro Bacacheri, em Curitiba, num terreno de 200 mil metros quadrados e que, por possuir um enorme bosque, irá implantar estudos sobre plantas medicinais.
Genômica
Além da ampliação do atendimento, coisas que ainda são novidade na medicina já serão realidade no novo HPP, como o laboratório de genômica, que é uma inovação radical da medicina. Em resumo, a genômica estuda as células de cada paciente e traz um tratamento personalizado a cada indivíduo e doença.
O Pequeno Príncipe também possui uma faculdade, que já formou e especializou diversos médicos e enfermeiras, profissionais vindos do Brasil todo para estudar aqui e levar de volta o conhecimento a suas regiões. “Temos profundo orgulho disso. Sem eles a missão seria impossível, porque os nossos médicos são muito apaixonados pelo que fazem e isso é a grande força que temos. Estas pessoas atraem outras de energia semelhante e formamos esse círculo virtuoso magnético, que é a grande força do Pequeno Príncipe. Nosso desafio é manter esse círculo sempre energizado”, analisa José Álvaro.
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Casos marcantes
O que mais marca os 100 anos do Hospital Pequeno Príncipe (HPP) são as histórias das famílias que passaram por ali. Gente de todos os cantos do Brasil, buscando a cura para os pequenos, visto que o hospital é referência em doenças raras e cirurgias complexas.
Há 10 anos à frente da diretoria do HPP, José Álvaro Carneiro tem duas histórias que marcaram muito sua vida e mudaram alguns rumos do hospital. Uma delas é a do menino Nylton, que morava em Porto Amazonas, a 77 quilômetros de Curitiba. Era paciente crônico de uma fibrose pulmonar e frequentava sempre o hospital, onde morreu em 2016. O menino tocava muitos instrumentos, desenhava e pintava muito bem e vivia de um lado a outro do hospital carregando sua garrafa de oxigênio.
A única chance de sobrevida dele era um transplante de pulmão. No entanto, o Brasil nunca foi muito bom em seus resultados neste tipo de transplante. “Quando uma criança atinge 12 anos, ela passa a ter o direito de expressar o que deseja para a sua vida. E ele manifestou que não queria o transplante”, diz José Álvaro.
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Mas a decisão do menino criou um racha entre a equipe médica e a família da criança. Uns recomendavam o procedimento e relutavam contra decisão de Nylton, outros entendiam a dor do menino e apoiavam a sua decisão. Foi por causa de Nylton que o HPP implantou um comitê permanente de bioética (só sete hospitais no Brasil possuem este comitê permanente).
“Ficamos quase um ano discutindo o caso com médicos, enfermeiros, a família. É algo bonito, mas dificílimo de lidar”, disse José Álvaro, que ficou amigo de Nylton e levou o garoto a jogos de futebol.
O diretor diz que todos dentro do hospital aprenderam muito com Nylton. E quando ele morreu, em 2016, equipe médica e a família estavam preparados. “Foi muito especial e forte na vida de todos nós”, relembra o diretor.
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Abraço no craque
A outra história foi a da Fabi, um dos raríssimos casos em que os médicos não conseguem fechar um diagnóstico. Isso fez toda a equipe refletir muito sobre as fronteiras do conhecimento. A jovem tinha um combinado de problemas e morava no hospital. Era estudante dedicada, fez todo o Ensino Médio dentro do HPP (que possui um setor educacional, para que as crianças não percam o ano escolar) e se formou.
Mas uma das coisas mais especiais que aconteceram com a Fabi no hospital foi realizar o sonho de conhecer o jogador Ronaldo Fenômeno. Em 2014, o jogador soube da história e foi visita-la. Quando souberam que os dois tomavam o mesmo medicamento, abraçaram-se longamente e emocionaram todos. José Álvaro possui, em sua sala, uma foto de Nylton e outra de Fabi.
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