A vida do cozinheiro Edimilson Fernandes, 41 anos, é digna de um livro (na verdade ele já está sendo escrito e será lançado dentro de alguns meses). Passou por tantos altos e baixos, que sua história é um daqueles aprendizados que a vida nos apresenta de nunca desistirmos de um sonho. No caso dele, ser cozinheiro. Ele já foi desempregado e teve que morar na rua, mas também teve altos salários e nunca desistiu do seu grande objetivo. Uma história tão rica que ele decidiu compartilhar com o mundo e ensinar às pessoas a terem um objetivo, nunca perderem o foco e não deixarem de sonhar.
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Desde a infância, Edimilson era a “ovelha negra” da família. Não que ele fizesse coisas erradas, mas seu gênio forte, sua teimosia e o fato de sempre insistir no que queria fizeram a família enxergar ele desta forma. Teve uma infância feliz com os pais em Santa Maria (RS), onde nasceu, e certo dia foi morar com um tio, artista circense, com quem viajou o Brasil e aprendeu a mexer com fibra de vidro. Fazia desde cenografia para espetáculos teatrais, até peças de carros para a Stock Car.
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Mas Edimilson sentia-se perdido dentro de si. Tudo o que ganhava, gastava se divertindo, não tinha um foco na vida e acabava ficando angustiado. Ele sentia que precisava buscar algo diferente, com um significado verdadeiro. Então sonhou em seu um cozinheiro renomado. Nesta época, ele trabalhava para o piloto da Stock Car Thiago Marques, mas decidiu mudar. Queria voltar a estudar (para aprender a gastronomia) e começar a trilhar seu caminho neste novo universo. Largou o salário de pouco mais de R$ 2 mil para ganhar apenas R$ 780 limpando banheiro de restaurante. Uma mudança brusca de padrão de vida que o obrigou a ir morar na rua pela primeira vez. Pouco tempo depois, perdeu o emprego.
Sonho
Edimilson ainda se sentia perdido, perambulava por aí e dormia onde deixavam. Certo dia foi à uma agência do Sine (Sistema Nacional de Empregos) procurar trabalho. Já tinha conseguido uma oportunidade, estava na fila para fazer a ficha do emprego e quase na hora de ser chamado viu um cartaz de um curso gratuito de confeitaria. “Eu me lembrei do chef de cozinha lá do hotel Mabu, onde trabalhei, que sempre me falava: estude! E aquele cartaz me balançou muito, porque era a oportunidade de chegar mais perto do meu sonho. Saí da fila e fui lá me informar do curso, em outra sala. Me falaram que eu tinha que ir direto na escola que estava dando o curso”, disse Edimilson. Mas chegando lá, soube que as vagas gratuitas já tinham sido completadas.
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Ele não se conformou. Falou que tinha deixado para trás um emprego certo para seguir um sonho, e que não sairia dali sem a oportunidade. Ficou 20 minutos argumentando com o funcionário da escola, até que a diretora, que de longe observava a tentativa de Edimilson, decidiu lhe dar uma vaga no curso. Enquanto estudava, ele dormia em num albergue da prefeitura, na Rua Rockefeller. Foi tão bom aluno, que quando terminou o curso de confeitaria ganhou outra bolsa para um curso de panificação.
Insistente e teimoso
O ex-morador de rua queria mesmo era ser cozinheiro. Por isto, pediu ajuda de uma ex-primeira dama de Curitiba para conseguir uma bolsa de estudo no Senac. Como a ajuda demorou demais, ele próprio foi ao Senac falar direto com o diretor geral. Depois de insistir no contato e entregar em mãos uma carta escrita a próprio punho, contando sua história, Edimilson conseguiu uma bolsa integral para o tão sonhado curso de cozinheiro.
“Eu sempre fui teimoso, insistente. Todos viam isso como um defeito. Aprendi a usá-lo a meu favor”, analisa ele, que logo depois do começo das aulas voltou a trabalhar. Não com o que queria ainda – voltou a fazer peças para uma equipe de Stock Car e chegou a um salário de mais de R$ 4 mil -, o que lhe daria uma vida confortável. Estudava de manhã e trabalhava a tarde, até o anoitecer.
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Novamente, no entanto, a vida lhe apresentou uma decisão difícil. Edimilson foi convocado a viajar o Brasil junto com a equipe de Stock Car. “Fiquei numa encruzilhada, porque o salário era bom e eu precisava me manter. Mas eu batalhei muito para conseguir aquela bolsa de estudo e não podia desistir do meu sonho. Pedi demissão e continuei o curso”, diz ele, que tinha pouco mais de R$ 6 mil guardados para se manter. Uma hora o dinheiro acabou e ele novamente foi morar na rua.
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Foram novamente tempos difíceis, tendo que dormir nas cadeiras da rodoferroviária, onde mal conseguia deitar (dormia sentado), enquanto carregava o celular em uma das tomadas do local. Não tinha paz, pois sempre era retirado pelos seguranças. Um dia ele foi dormir debaixo de uma marquise na esquina da Avenida Sete de Setembro com a Rua Coronel Dulcício, no Batel. A partir dali, tudo mudou.
Foco e persistência
Edimilson passou sete meses morando debaixo de uma marquise, na Avenida Sete de Setembro, no Batel. Dormia com gente que usava drogas e bebia bem ao seu lado. De vez em quando, via gente armada, inclusive homens que se identificavam como “policiais” e levavam moradores da marquise embora num carro. Os moradores nunca mais eram vistos a partir dali. Por sobrevivência, Edimilson se enfiava debaixo de seu cobertor e fazia como os três macaquinhos: não vejo, não ouço, não falo.
Ele chegava mais cedo que todo mundo no Senac, antes das 7h, para conseguir tomar um banho e depois tomar o café oferecido aos bolsistas. Ninguém lá sabia da sua situação, mas dias depois, uma amiga pediu para fazer uma foto dele com a doma e postou no Facebook. A foto viralizou e chegou numa emissora de TV (RIC), que quis fazer uma reportagem. Ele topou contar sua história, mas sem mostrar o rosto. Não adiantou, pois os colegas de Senac reconheceram sua voz e ele enfrentou dias de olhares diferente. Sentindo-se desconfortável, Edimilson resolveu contar tudo para a professora, com medo de que perdesse a bolsa. O que ele não esperava era ouvir que a professora tinha orgulho dele. “Nossa, tirei um peso enorme das costas”, revelou ele, que depois de se formar, conseguiu emprego num restaurante e conseguiu alugar uma casinha.
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Mas pensa que a vida de Edimilson se encaminhou? Novamente em busca de um sonho (de construir um ‘boteco gastronômico’), ele tomou decisões surpreendentes. O cozinheiro já estava com 39 anos e, trabalhando como empregado, acreditava que precisaria de pelo menos mais 20 anos para juntar o dinheiro para comprar sua casinha, para nos fundos construir o boteco, onde poderia receber os amigos e cozinhar para eles. Edimilson decidiu abrir uma empresa e durante suas pesquisas viu que ela poderia ser “incubada” por um instituto de tecnologia de Curitiba. Inscreveu-se no edital e foi selecionado.
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Mas depois de ter todo o auxílio para abrir a empresa, Edimilson disse que se decepcionou com a incubadora. “Quando entreguei os documentos para concorrer ao edital, mostrei junto as reportagens que escreveram sobre mim. Depois eu fui ver que não me selecionaram pelo meu talento, mas para a mídia que eu podia promover para eles”.
“Quando me dei conta do porquê de tudo isso, que me usaram apenas de trampolim midiático, resolvi tirar minha empresa de lá. Faltou pouco para eu entrar em depressão e cometer suicídio, mas consegui ser forte”, conta o ex-morador de rua, que saiu com uma dívida de R$ 40 mil a pagar, entre contas pessoais e da empresa.
A redenção
Depois disto, várias coisas aconteceram na vida de Edimilson. Ele conseguiu um emprego num hotel, mas foi demitido depois de um tempo e enquanto pensava no que fazer, conheceu a igreja Abba, na qual se batizou e passou a ser frequentador. Ali conheceu um projeto da igreja chamado CreJer, de reabilitação de dependentes químicos, quando o pastor Roberto Carlos o convidou para dar uma palestra aos pacientes da reabilitação, contando sua história de superações.
Edimilson foi conhecer a chácara onde está o CreJer e onde daria a palestra. “Era como um telefone tocando dentro de mim e eu precisava atender aquela ligação. Eu precisava de ajuda, mas percebi que ali dentro tinha muita gente precisando de mim também”, diz Edimilson, que acabou indo morar lá, onde trabalha voluntariamente como cozinheiro e faz palestras para encorajar os pacientes a terem um sonho e nunca desistirem dele. Com a ajuda de um jornalista, está escrevendo sua biografia e pretende ajudar mais gente.
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“O boteco ficou em segundo plano, porque Deus me convocou e eu tenho que atender esse chamado. Há pessoas que me ajudaram, porque eu nunca desisti de lutar. Isso que eu preciso mostrar ao mundo. Eu agradeço a Curitiba por ter me dado essa história e a Deus por ter me dado essa chance”, diz ele. O livro está em produção por uma jornalista e deve ser lançado dentro de alguns meses.
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