Azul, verde, amarelo, laranja ou vermelho. Se você utilizou o serviço de alguns prontos-socorros nos últimos 7 anos, deve ter uma ideia do significado dessas cores. O Protocolo de Manchester, que serve para classificar a gravidade do quadro de saúde de cada paciente que busca as unidades de pronto atendimento é aplicado desde 2011 em várias unidades de saúde públicas e privadas no Paraná. Enquanto alguns ficam em dúvida sobre o funcionamento do sistema, outros se incomodam com a ordem de prioridades, afinal, quem sofre tem pressa.
Para ajudar a esclarecer algumas dúvidas relativas à classificação de riscos e à implementação do sistema no estado, a Tribuna foi entender melhor o funcionamento do Protocolo de Manchester e a aceitação da ferramenta por parte do público. O ritual é conhecido: enquanto o termômetro, posicionado debaixo do braço, mede a temperatura corporal do paciente, a frequência cardíaca é auferida. “Respire fundo”, diz a enfermeira enquanto posiciona o estetoscópio no peito do doente. Passada a triagem, uma pulseirinha de papel é colocada no pulso do paciente, indicando a gravidade do estado de saúde e consequentemente, a prioridade de atendimento.
Prós e contras
Na fila de uma unidade de pronto atendimento de um hospital particular localizado no bairro Batel, as opiniões divergem. Para a empresária Gabriela Lopes, 31, o protocolo não inspira confiança. “Se eu não dissesse que tenho diabetes e que estava prestes a ter uma crise de hipoglicemia eles não teriam me encaminhado ao atendimento emergencial porque os sintomas iniciais não acusam. Acho superficial demais determinar que alguém pode esperar apenas com base numa triagem simples”, diz.
Já para o engenheiro Leonardo Reis, 30, a ferramenta é válida, contanto que o tempo máximo de espera seja respeitado. “Me deram pulseira verde por entenderem que meu caso não é tão grave, mas eu tive que esperar mais de duas horas pelo atendimento. O protocolo é justo, mas pra quem não está aparentemente muito mal, o tempo de espera é extrapolado”, desabafa. O contador Jean Rossato, 26, acabava de passar pela triagem. No pulso, a pulseira verde: “não sei quanto tempo vou que esperar, mas respeito a triagem. Tem que ter paciência”, afirma.
Para quem precisou ser atendido às pressas, o sistema faz diferença. É o caso de Fernando Alves, 39, que sabe bem sobre a importância do atendimento prioritário uma vez que, há alguns meses, precisou correr ao pronto socorro por conta de uma crise renal. “Passei pela triagem e recebi pulseira vermelha. Se eu tivesse que esperar pra ser atendido eu teria desmaiado na sala de espera”, lembra. Já a bióloga Marina Cordeiro, 28, não liga de esperar. “Todo mundo está no mesmo barco, mas pacientes mais graves merecem e precisam de atendimento prioritário. Da mesma forma que numa emergência eu gostaria de ser atendida antes, entendo que pacientes em situação mais grave que a minha necessitam passar à frente”, diz.
Triagem de risco
Criado em 1997, o Protocolo de Manchester surgiu como um método eficaz para a gestão de riscos clínicos a partir da identificação de prioridade entre pacientes que buscam os serviços de emergência. Implantado com o objetivo de organizar os fluxos de atendimento hospitalar, o sistema estabelece uma linguagem comum para organizar a ordem das consultas nas instituições que recebem grande volume de pacientes. Ao contrário do sistema de ordem de chegada no qual o critério para priorização é simplesmente uma fila, no Protocolo de Manchester o atendimento é definido de acordo com o quadro de saúde inicial e os riscos em cada caso.
De acordo com o secretário-geral do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRMPR), Luiz Ernesto Pujol, a utilização do Protocolo de Manchester é vantajosa tanto para os pacientes, quanto para os hospitais. “O sistema de triagem por classificação de riscos, além salvar vidas, poupa tempo e evita a repetição de falhas no atendimento, priorizando quem está pior e passando à frente os pacientes que apresentam risco de vida”, explica.
Empatia
Mesmo podendo ser considerado “democrático”, o Protocolo de Manchester ainda levanta polêmica, uma vez que, independente da dinâmica do serviço, ninguém gosta de ser passado para trás no momento do atendimento. Ainda mais nos casos em que a dor é tão aguda, que chega a ser insuportável. Para Pujol, nessas horas, deve-se lembrar de duas boas e velhas virtudes: empatia e solidariedade “Não se pode menosprezar o sofrimento de ninguém, mas a população tem de estar ciente de que casos de emergência sempre serão passados à frente. As equipes médicas são treinadas para identificar situações de risco imediato que precisam ser priorizadas”, afirma.
Para Pujol, a solução do problema está além da distribuição de senhas e da adoção de métodos eficazes de atendimento. “É uma questão de saúde pública. A demanda é grande demais, mesmo quando se fala em casos urgentes e isso gera uma sobrecarga em qualquer sistema hospitalar. É preciso implementar ferramentas ágeis de diagnóstico, investir na qualificação das equipes que já operam e aumentar o número de locais de assistência. Só assim veríamos mudanças efetivas”, finaliza. Enquanto isso não acontece, o jeito é recorrer diretamente ao significado literal da palavra e incorporar o papel: “paciente”.