Tribuna foi descobrir quem é o delegado que anda “assustando” pessoas que cometem crimes contra o meio ambiente na grande Curitiba
Nunca se viu na mídia da grande Curitiba tantas apreensões de animais silvestres, em situação de maus tratos ou estouro de canis clandestinos como nos últimos meses. A última aconteceu ontem mesmo, na quinta-feira (3).
Mas se a quantidade de crimes e as denúncias continuam iguais aos anos anteriores, o que mudou? A Tribuna foi “investigar” e descobriu que por trás deste trabalho da Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA), da Polícia Civil, tem um nome que está fazendo a diferença: Matheus Araújo Laiola.
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O delegado de 37 anos, natural de Cândido Mota, uma cidadezinha de 25 mil habitantes no interior de São Paulo, assumiu a DPMA no dia 21 de janeiro. Acostumado com o fluxo de centenas de boletins de ocorrências diários nas delegacias por onde passou, sentiu-se “angustiado” na DPMA, já que lá os BOs não passam de cinco ao dia. Começou a se inteirar do trabalho e percebeu que o fluxo de investigação da DPMA não estava nos BOs, e sim nas 30 denúncias que chegam todos os dias via 181 (Disk Denúncia da Secretaria de Segurança) e 156 (prefeitura de Curitiba).
“Na DFR (Delegacia de Furtos e Roubos), o fluxo é de 130 BOs por dia. É muito trabalho, muita investigação. Mas aqui, quando comecei a verificar as denúncias do 181 e do 156, passei a trabalhar muito mais do que nas outras delegacias. E não acho ruim, porque eu não gosto de ficar parado”, diz o delegado.
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Não é à toa que ele alcançou números nunca vistos antes na DPMA: apreensão de quase 700 animais silvestres ou vítimas de maus tratos (Curitiba e RMC), 110 pessoas presas e R$ 500 mil em multas, aplicadas pelos municípios ou Estado. O delegado diz que não há dados precisos de anos anteriores. Mas garante que não chegaram a nem 10% disto.
Diferenças
Laiola diz que na DPMA o resultado é muito gratificante, porque exige muito menos trabalho de investigação e geralmente os BOs são mais rápidos e simples de resolver. “Quando eu estava no Cope (Centro de Operações Policiais Especiais), coordenei a operação Alexandria. Foi uma investigação demorada, de meses, com 756 mandados de prisão expedidos. Apesar do tamanho, não despertou tanto interesse da sociedade. Na DFR, tinha investigações que demoravam mais de seis meses, exigia análise, interceptação telefônica, pra no final você conseguir prender no máximo seis ou sete pessoas. Nada disso dá tanto ‘barulho’ do que os crimes contra animais. Aqui na DPMA geralmente as investigações são muito simples, se resolvem rápido, você ainda impõe respeito contra quem comete crime ambiental e comove a sociedade”, analisa o delegado.
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Mudança
Depois de 21 anos instalada no mesmo lugar, a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA) irá mudar de endereço. Sairá da Avenida Erasto Gaertner, no bairro Bacacheri, em Curitiba, para uma casa dentro do Parque Barreirinha. Esta foi uma das primeiras medidas que o delegado Matheus Araújo Laiola tomou ao chegar lá, em janeiro.
“Entra água pelo telhado quando chove. O piso está soltando, entre vários outros problemas. Essa casa está alugada para a DPMA há 21 anos. Então solicitei que o proprietário providenciasse os devidos reparos. Como ele não se mostrou muito atencioso ao pedido, fui atrás de outro imóvel”, conta o delegado, que conseguiu com o prefeito Rafael Greca a concessão (gratuita) de uma casa dentro do Parque Barreirinha. “O aluguel aqui custa R$ 6 mil.
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Os cofres públicos vão economizar R$ 72 mil por ano”, contou Laiola.
É com esta visão administrativa e policial que ele reergueu o trabalho da DPMA. “É uma delegacia que tem muito potencial. Só estava adormecido, porque tem serviço todo dia. Meus amigos até brincam comigo que não aguentam mais ver animal silvestre ou mal tratado na TV quase todo dia”, brinca ele.
Apesar de ter “preso” 110 criminosos ambientais nos últimos meses, Laiola se queixa que a legislação ambiental é muito branda. A maioria das penas é de até um ano de prisão, o que acaba sendo convertida pelos juízes em medidas restritivas, multas e prestação de serviços comunitários. “Por isso a gente tenta trabalhar com o maior rigor da lei, tenta mexer no bolso das pessoas com multas altas”, diz ele.
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Dedicação total!
Assim que a Tribuna chegou à DPMA para conversar com Laiola, chegou junto um motoboy, para entregar medicamentos que o policial encomendou. Sem pestanejar, o delegado sacou duas notas de R$ 100 e mais duas de R$ 20 (a compra dava R$ 236) da carteira e ainda disse ao motoboy que podia ficar com o troco. O rapaz, que há tempos não via uma nota de R$ 100, ficou assustado e “louco de feliz” com a gorjeta de R$ 4, dizendo que isso é coisa rara.
Mas quem vê hoje um homem com a carteira “recheada”, carro e celular do ano, boas roupas e morando num bom apartamento, não sabe o que ele passou até chegar neste patamar de sucesso. Seus pais, a Rosa Maria e o Northon (já falecido), eram funcionários públicos do município de Assis, a cinco quilômetros de Cândido Mota. Tinham empregos simples e ganhavam pouco. Mas entendiam que um futuro bom para os filhos dependia de estudo. E ralaram muito para isso. Laiola honrou o esforço dos pais e passou no vestibular de Direito na cidade de Marília, distante 85 quilômetros de casa.
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Como a família não podia bancar o alojamento em Marília, o negócio era pegar o ônibus todos os dias. “Eu via meus amigos ficarem lá em Marília mesmo, tinha vontade também. Mas não dava. Então eu encarava três horas de viagem por dia. Eu aproveitava pra ir estudando. Outros amigos tiravam sarro de mim, ficavam no fundo do ônibus fazendo farra. E por isso também que eu uso óculo hoje. Forcei muito a vista nessa época, estudando naquela luz fraquinha do ônibus. E eu ia meio escondido, porque meus pais não podiam pagar a passagem. Na verdade, o dono da empresa sabia que um dia eles pagariam, por isso me deixava embarcar. A faculdade era a mesma coisa. Eu pagava seis meses e ficava outros seis meses sem conseguir pagar. Mas o reitor também sabia que uma hora a gente pagaria.
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E assim eu me formei em 2006”, orgulha-se Laiola, com os olhos marejados e a voz embargada. “Nas aulas de Processo Civil eu ficava estudando processo Penal e Medicina Legal”, explica ele. Obstinado em ser delegado, assim que se formou foi aprovado num concurso em Minas Gerais. Passou em 3º lugar, entre 12 mil inscritos, e foi comandar a delegacia de Varginha (a cidade do ET) entre 2007 e 2008. Depois passou no concurso da Polícia Civil do Paraná, onde “fincou o pé”. Já administrou as delegacias de Toledo, Realeza, Castro, Foz do Iguaçu, além de mais algumas na capital. “Sempre fazendo barulho, porque eu gosto do que faço”, diz o delegado.
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Fama
E o “barulho” que Laiola tem feito nestes nove meses de DPMA já alcançou “fama” nacional. Ele já foi reconhecido em alguns eventos que participou em outras cidades fora do Paraná, além de também receber a visita de uma veterinária de uma prefeitura de São Paulo, que queria conhecer o trabalho do delegado para implantar em sua cidade. “Já passei por 10 delegacias aqui no Paraná. Nunca vi repercussão igual”, assusta-se.
Quem avisa amigo é
Uma notícia em primeira mão que Laiola deu à Tribuna é que, em breve, a DPMA também fiscalizará as ONGs de proteção animal, para ver em que estado estão sendo mantidos os animais. “Estou divulgando porque não queremos mesmo o fator surpresa. Nosso objetivo é o bem estar animal. Ficaremos felizes de ver que os bichinhos estão sendo criados em boas condições, saudáveis e felizes”, diz o delegado.