Cultura em escombros

Foto: Felipe Rosa

Da obra que um dia seria o Centro Cultural Multiuso da Vila Nossa Senhora da Luz, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), resta uma carcaça abandonada. A estrutura em construção na Rua Davi Xavier da Silva, atrás da Escola Municipal Albert Schweitzer, foi abandonada pela metade, e virou ponto de consumo de drogas, descarte de lixo e abrigo para pessoas em situação de rua.

O local foi pensado para ser uma espécie de teatro, que receberia diferentes eventos artísticos, de acordo com o presidente da Associação Beneficente Voluntariado da Cidade Industrial de Curitiba (ABVCIC), José Ney da Silva, conhecido como “Faísca”. Liderança comunitária e morador da vila, ele fez parte da concepção do projeto, em 2010.

“O governo Lula lançou vários projetos culturais para comunidades carentes. Para o Centro Multiuso foi destinada uma verba do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) mas, durante o governo Luciano Ducci, nada saiu do papel. Em 2012, na gestão Gustavo Fruet, conseguiram R$ 2,1 milhões pra essa obra. Foi contratada uma empresa para iniciar a construção, mas uns seis meses depois ela abandonou”, conta.

Segundo ele, que na época foi buscar informações junto com vereadores, “a construtora pediu subsídios do contrato, e como não dava pra fazer, a firma foi embora”. “Ninguém soube me explicar direito, e tudo tem que ter uma justificativa. Cadê esses milhões que foram destinados para essa construção?”, questiona.

Depósito de entulho

Foto: Felipe Rosa
Moradores reclamam da proliferação de ratos e baratas. Foto: Felipe Rosa

Há cerca de dois meses, os moradores da vila organizaram um protesto, com gritos de ordem e faixas, pedindo providências para o local, que estava repleto de lixo. “Tinha tanto entulho que não dava nem pra entrar. Chamamos emissoras de televisão e fizemos barulho por causa da epidemia de dengue. Vieram uns dois vereadores aí, e então a prefeitura limpou”, relata Faísca.

A obra abandonada, no entanto, já acumula detritos de novo. Além de sacolas com dejetos domésticos, há restos de material de construção, colchões e até sofás deteriorados. A situação é uma ameaça sanitária para a comunidade. A comerciante Dirce Santos Silva, de 58 anos, tem um restaurante bem em frente à construção. “Daí sai rato, sai barata, tudo quanto é bicho. E entra uma maloqueirada pra usar droga”, lamenta.

Saudosa quadra

Foto: Felipe Rosa
Cancha está há mais de 10 anos abandonada. Foto: Felipe Rosa

Anexo ao terreno que abrigaria o Centro Cultural Multiuso, há outra carcaça de construção sofrendo com a ação do tempo. Um ginásio que era utilizado pela Escola Municipal Albert Schweitzer e movimentava a vila virou “criação de pombo”. “Já tem 10, 12 anos que a cancha está parada, fechada, desde que a escola a entregou para a regional da CIC. A manutenção saía muito cara, e como ganhamos uma outra quadra, cedemos aquele espaço para a comunidade. Desde então, está abandonado”, diz o vice-diretor da instituição, Emídio Nicodemos Angelotti.

A dona de casa Iracema Abreu lembra com nostalgia dos tempos em que o ginásio recebia alunos de fora para disputar com os estudantes da comunidade. “Era maravilhoso. Os filhos da gente faziam esporte, e como os filhos jogavam, a gente acompanhava. Era muito gostoso. Hoje em dia não tem o que fazer, está muito triste a nossa vila”, diz a idosa de 75 anos.

Nova licitação

Foto: Felipe Rosa
Iracema: “Hoje em dia não tem o que fazer, está muito triste a nossa vila”. Foto: Felipe Rosa

A Companhia de Habitação Popular (Cohab) de Curitiba informou que as obras foram interrompidas após a construtora ter rescindido o contrato e abandonado a obra, em março de 2014. “O projeto precisou de ajustes estruturais e um novo orçamento está sendo atualizado para ser enviado à Caixa Econômica. Após aprovação, será aberta nova licitação para definir a empresa que realizará a construção”, detalhou, em nota. Mas não há prazo para a realização do procedimento.

Após concluído, o espaço contará com auditório, área para exposições e salas para a realização de oficinas. O órgão explica que cercou a área com madeirite logo que a obra parou, mas o material foi destruído por vândalos. A promessa é que, em até 30 dias, o local será cercado com muro de tijolos.

O contrato com a Cohab para a construção do centro cultural foi de R$ 2,2 milhões – R$ 1,17 milhão de recursos próprios da prefeitura e R$ 1,025 milhão do Ministério da Cultura, liberados pela Caixa Econômica. O órgão esclareceu que o pagamento é realizado segundo medição de obra, não há liberação de recursos antecipadamente. Após o término das obras, o espaço será gerenciado pela Fundação Cultural de Curitiba.

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