Consórcio de Curitiba vai à falência e estraga sonhos Brasil afora

Foto: Gerson Klaina/Tribuna do Paraná
Foto: Gerson Klaina/Tribuna do Paraná

Você sonha comprar uma casa ou um carro e decide que a melhor forma é através de consórcio. Paga mensalmente, sonhando, mas depois de meses você recebe a notícia: a empresa de consórcio está indo à falência e não tem dinheiro para devolver o que você já pagou. Esta é a realidade de clientes do consórcio Unilance, que teve a sua liquidação extrajudicial decretada pelo Banco Central em 5 de outubro do ano passado.

O empresário lotérico Auxílio Suguimoto é um dos prejudicados, com uma carta de crédito de R$ 92 mil a receber. “Na época, comprei para ajudar um amigo, que era vendedor de consórcios. Fui pagando e acabei planejando a compra do imóvel. Meu consórcio já estava liquidado e pediram seis meses mais 20 dias para receber. A data coincidiu com a liquidação extrajudicial. Cheguei lá e dei com a cara na porta”, lamentou.

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O lotérico diz que não faz ideia se um dia receberá o dinheiro. “Eu confiei, porque é uma empresa daqui, já existia há muitos anos. Falavam de forma transparente, transmitiam honestidade. Agora mandam uns e-mails vazios, não falam quando nem quanto vão pagar. Isso é praticamente um roubo, fiquei muito chateado”, lamentou.

Apesar do Unilance ter sede em Curitiba, possuía filiais em todo o Brasil. O porteiro José Antônio da Cruz, 55 anos, que mora em Belo Horizonte, entrou num dos grupos do consórcio há quatro anos, sonhando em comprar a casa própria. Na sétima parcela, foi contemplado e tinha quase R$ 50 mil a receber.

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“Mas colocaram vários empecilhos para eu tirar a carta de crédito. Inclusive, depois da contemplação, me obrigaram a pagar um seguro junto com a parcela, que subiu de R$ 686 para R$ 978. Olha, a vida da gente é tão difícil. A gente sua pra realizar um sonho. Nem sei se um dia vou receber esse dinheiro de volta”, se entristece o porteiro.

Números incertos

O funcionário público Rodolfo Cardoso, 34 anos, que também é um dos prejudicados, criou uma página no Facebook, chamada ‘Vítimas do Consórcio Unilance‘, para reunir os consorciados. Já tem 60 lesados num grupo de WhatsApp, vindos de todo o Brasil. “Fizeram um levantamento dos bens da empresa e não deu nem R$ 16 mil. Era um carro velho, uns móveis e computadores. Eles alegaram que na crise de 2014 muitos clientes deixaram de pagar o consórcio e isso deu início às dificuldades. Olha, o povo tá bem desanimado. Tem gente que entrou até em depressão, porque tem 80, 100 mil a receber”, analisa Rodolfo.

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Funcionários

Cerca de 120 funcionários foram demitidos e receberam apenas o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). A rescisão trabalhista que competia à empresa pagar, não foi depositada para ninguém. Há até caso de um funcionário que havia recém sacado o FGTS, justo para investir no consórcio. Todos foram pegos de surpresa, pois a empresa pagava os salários corretamente e em dia, e o sócios não demonstravam problemas.

Como está a situação?

Gilmar Bocalon, o liquidante do Consórcio Unilance, explicou que após a intervenção ninguém mais recebeu. Todos foram incluídos num quadro geral de credores e o crédito ficou pendente. ‘Agora estou administrando somente aqueles que viraram devedores, ou seja, que já foram contemplados no consórcio e estão pagando o restante devido‘, disse Gilmar.

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A quantidade de pessoas a receber o valor devido pela Unilance não é divulgado. Mas o professor de Direito Ademar Nitschke Júnior acredita que a quantia devida deve ser muito alta, já que depois que foi aberto o procedimento de liquidação judicial, o liquidante abriu duas vezes um edital em busca de empresas que aceitassem assumir os grupos de consórcio em aberto. Não apareceram interessados. ‘Isso mostra que a dívida é tão grande que ninguém quis assumir‘, diz.

Investigação

Na segunda-feira da semana passada (18), o Banco Central nomeou uma comissão de inquérito para apurar as causas que levaram o Consórcio Unilance a ‘quebrar‘ e qual a responsabilidade de seus administradores e membros do Conselho Fiscal. O inquérito tem 120 dias para ser concluído, prorrogáveis, se necessário, por igual prazo. Sendo assim, o prazo máximo é 16 de outubro.

E agora?

A grande pergunta dos clientes é: será que vão receber de volta o dinheiro pago? Quando e quanto irão receber? A Tribuna foi ouvir um profissional do Direito, especialista na área de liquidações judiciais, para explicar como funciona esse procedimento.

Ademar Nitschke Júnior, professor de graduação em Direito e pós em Direito Empresarial da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), explica que empresas como os consórcios podem sofrer intervenções em caso de problemas. A intervenção, feita pelo Banco Central (BCB), decretou a liquidação extrajudicial da Unilance ano passado. Esse procedimento apura o tamanho do rombo financeiro, o patrimônio, as pessoas com créditos a receber , valores, e quais motivos levaram a empresa àquela situação.

Enquanto o consórcio está em liquidação, o BCB afasta os dirigentes e nomeia um novo administrador (chamado de liquidante), para administrar o que ainda precisa funcionar. No caso, o liquidante é a empresa Gilmar J. Bocalon Assessoria e Consultoria Empresarial.

Consórcio de imóveis e automóveis faliu e deixou inúmeras pessoas no prejuízo. Foto: Arquivo/Tribuna do Paraná
Consórcio de imóveis e automóveis faliu e deixou inúmeras pessoas no prejuízo. Foto: Arquivo/Tribuna do Paraná

No caso dos consórcios, explica o professor, o liquidante deve levantar a situação de todos os clientes. Aqueles que estavam pagando as cotas do consórcio, mas ainda não tinham sido contemplados com a carta de crédito, deixam de pagar as cotas e entram numa lista de credores, para receber de volta o que já pagaram. O mesmo funciona para quem já tinha sido contemplado, mas ainda não tinha recebido a carta de crédito. Foi por este motivo que vários consorciados receberam de volta o dinheiro das cotas que pagaram de outubro para cá, visto que os grupos de consórcio não vão mais funcionar.

Já os consorciados que receberam a carta de crédito devem continuar pagando as prestações até o final, pois o dinheiro servirá para a Unilance pagar suas dívidas. Cabe ao liquidante administrar essas prestações restantes e manter a empresa funcionando minimamente.

E o professor alerta: os credores devem ficar atentos ao que está acontecendo, ver se o seu nome será listado corretamente na lista de credores, participar de assembleias que forem convocadas, etc.

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Mas vamos receber?

Ademar diz que é muito difícil encontrar casos de liquidação que quite todos os credores. Tudo o que a empresa ainda tiver de patrimônio será usado nos pagamentos. Se o dinheiro acabar, o processo se encerra e os credores ficam ‘a ver navios‘. Conforme a lei, a prioridade de pagamentos são as dívidas trabalhistas.

Se no processo de liquidação judicial verificar-se que a empresa ‘quebrou‘ por motivo criminoso, pode-se dar início a uma investigação criminal e os sócios administradores serão obrigados a dispor de seus bens pessoais para pagar os credores. Quando eles não tiverem mais bens pessoais, o processo se encerra. Parecido com isto aconteceu com o antigo consórcio Garibaldi, em Curitiba, nos anos 2000.

Ademar ainda explica que não adianta os credores entrarem agora com ações judiciais individuais para receberem o dinheiro, pois é o processo de liquidação que vai determinar quanto e quando cada credor irá receber.

A investigação que vai explicar porque a empresa ‘quebrou‘ tem que ser concluída em seis meses, com possibilidade de ser prorrogada por igual período. Quanto ao prazo de pagamentos dos credores, diz Ademar, pode acontecer em um ano, como pode demorar mais de 10 anos. Depende de cada processo.

https://www.tribunapr.com.br/cacadores-de-noticias/pinhais/policiais-da-rone-salvam-bebe-que-se-afogava-na-grande-curitiba/

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