Ter mais tempo para os filhos. Ocupar a mente para tratar a depressão. Buscar uma renda extra. Dar uma guinada na vida profissional e buscar nova fonte de renda (seja opcional ou forçado, por conta da crise e do desemprego). Estes são, em geral, os motivos que levam as pessoas a pegarem uma habilidade manual e empreenderem, transformando o hobby em fonte de renda principal ou complementar da família.
Não foi diferente com a artesã Emília Aoki, de Curitiba, que profissionalizou a sua habilidade em patchwork de tal forma que hoje tem empresa, organiza eventos e é internacionalmente conhecida pelo seu trabalho. Há 15 anos trabalha só com isto, 11 deles de maneira formal.
Emília conta que teve uma filha temporã. Na época, ela era dona de uma fábrica de chocolates, que produzia brindes para empresas. Era bem sucedida, tinha uma boa rentabilidade, mas era algo que lhe tomava muito tempo. Dormia apenas quatro horas por noite e vivia com enxaqueca. Para conseguir dar atenção à filha que ia nascer, a empresária decidiu fazer algo que tivesse como parar o trabalho para cuidar da criança, amamentar, e depois retomar. “Na linha de produção do chocolate, se você para, o chocolate desanda”, analisa ela, que passou a se dedicar a dar aulas de patchwork uma tarde por semana, para distrair a cabeça.
Desafio
Emília enxergou no artesanato um novo campo a explorar. “Havia pouquíssimas pessoas trabalhando com isto, era pouca a concorrência. Vi a brecha de mercado, que exigiria muito da minha criatividade. Me senti desafiada”, diz.
Em dois meses, as aulas fizeram tanto sucesso, que a demanda não era suficiente. Ela deixou a empresa nas mãos dos funcionários e passou a dar aulas de segunda a sábado, de manhã à noite. Eram até 30 alunas por dia. Foram dois anos levando as atividades em paralelo, até que ela decidiu deixar a empresa para viver só do patchwork. Alugou uma sala, cresceu e precisou contratar colaboradores, tudo na informalidade. E assim foram quatro anos, até ela decidir se formalizar, abrindo empresa, pois com o CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), conseguia comprar insumos com preço melhor do que com CPF (Cadastro de Pessoas Físicas).
Em dois anos, sua empresa era conhecida no Brasil todo. No terceiro ano, ela organizou o primeiro festival nacional de patchwork. Ano seguinte, já era internacional. No último final de semana prolongado, devido aos feriados da Independência e Padroeira de Curitiba, ela organizou a sétima edição do Quilt & Craft Show (Festival Internacional de Patchwork), que faz intercâmbio com artesãos do mundo todo, trazendo-os para o festival e enviando artistas brasileiros para eventos lá fora.
Autoestima lá em cima
Emília conta que, enquanto tinha a fábrica de chocolates, não lidava muito com gente, vivia trancada num escritório e tinha um pouco de depressão. Era tímida e retraída. “Dedicar-se ao artesanato foi uma terapia. Você está colocando a sua essência naquilo. Isso me tornou mais sociável. Eu saí do casulo, venci a barreira de oferecer meu produto, de fazer compras, de negociar”, diz.
Ela conta que uma parcela enorme das pessoas começa algum trabalho manual como terapia, para desestressar. “O bordado, por exemplo, é uma yoga. Você ‘apaga’ tudo ao redor. A autoestima das mulheres [a grande maioria do público artesão é feminino] cresce muito, pois elas começam a contribuir financeiramente com a casa. Ela passa a ser o centro da empresa. Tem as ideias e realiza projetos, desenvolve o design, lança coleções, vira a principal peça da família”, garante.
A artesã recorda que, em dois meses se dedicando exclusivamente ao artesanato, sua renda já era maior que a do marido, alto funcionário de uma empresa. Na maioria dos casos, a renda da mulher artesã começa a ficar tão alta, que muitos maridos largam seus empregos para auxiliar a esposa. “O negócio começa a crescer, surge a necessidade de ajuda para administrar. Aí entra o marido, os filhos, a família toda”, mostra.
Os jovens, principalmente os filhos, colaboram muito com a divulgação digital, pois grande parte do negócio é movimentado pela internet. “Eles ajudam na venda da imagem, a produzir e editar vídeos que vão para as redes sociais, alguns possuem até produtoras de vídeos específicos para trabalhos manuais e há até canais de assinatura na internet, que as pessoas assinam mensalmente para assistir a uma quantidade definida de aulas”, relata Emília, mostrando o quão grande e especializado se tornou o mercado das artes manuais.
Quando e como viver das artes manuais?
– Primeiro passo: use o seu círculo de amizades para adequar o produto. Presenteie, peça opiniões, trabalhe em melhorias.
– Tenha bom senso e olhar crítico sobre o seu trabalho, se é cafona ou bonito.
– Atente-se à qualidade dos acabamentos. É um diferencial.
– Pesquise muito na internet, assista tutoriais no You Tube, olhe o Pinterest.
– Ofereça seus produtos pela internet e esteja sempre conectado.
– Entre em comunidades nas redes sociais, não só de artesãos, para divulgar, adquirir conhecimento, saber as novidades, as necessidades das pessoas e vender.
– Para crescer, nem sempre é necessário investir num ponto comercial. A internet é um ótimo campo de vendas.
– Participe de projetos e feiras da prefeitura.
Abrir ou não empresa?
– Com o tempo, a própria pessoa deve decidir se continua atendendo só o seu círculo de pessoas, informalmente, ou se a demanda cresceu e precisa ter um CNPJ.
– A compra de máquinas e materiais é mais barata com CNPJ, porém é caro formalizar uma empresa. Analise bem.
Quando me dedicar só ao artesanato?
– A grande vantagem do artesanato é poder leva-lo paralelamente a um emprego.
– Só dedique-se exclusivamente ao artesanato quando perceber que ele pode sustentar a casa.
– Não seja imediatista. Tenha paciência de levar as coisas em paralelo até que seja vantajoso largar uma delas.
– A exceção à “paciência” é para quem, por exemplo, perdeu o emprego ou está “de saco cheio” com o trabalho atual.