Curitiba

Calma aí!

Área Calma divide opiniões e prefeitura cogita aumentar limite pra 50 km/h

Sem a bike, a vida da funcionária pública Larissa Vatzko, 29 anos, não iria a lugar nenhum – literalmente. Há seis meses, ela decidiu abrir mão da vida motorizada, e os trajetos de todos os dias – quase todos entrecortados pela Área Calma, na região central de Curitiba – agora são feitos sobre duas rodas ou a pé. De casa até o trabalho, à academia ou ao supermercado – tudo é feito de bicicleta.

A escolha, feita por questão de praticidade e também por engajamento ambiental, fez Larissa sentir na pele a diferença que alguns quilômetros a menos na velocidade dos veículos podem fazer para quem pedala. “O ciclista que transita por vias ‘normais’ e pela Área Calma percebe muito a diferença. O limite de 40 km/h dos veículos traz mais segurança para os ciclistas e para os pedestres”, afirma.

Área Calma de Curitiba. Foto: Felipe Rosa
Área Calma de Curitiba. Foto: Felipe Rosa

Por trás do volante, o ponto de vista é um pouco diferente. Para o motorista que precisa passar pelas vias entre os 140 quarteirões compreendidos pela Área Calma, o tráfego intenso nos horários de pico – por conta do limite de velocidade determinado – incomoda. Mas não é só isso. De acordo com um ranking divulgado pela Secretaria Municipal de Trânsito (Setran), nove dos quinze radares que mais multam em Curitiba estão localizados no perímetro.

No topo da lista, o cruzamento entre as ruas João Gualberto e Luiz Leão – próximo ao Colégio Estadual do Paraná – registrou 9.833 autuações só esse ano, na pista sentido Centro Cívico. Em média, neste ponto são aplicadas 1.450 multas por mês. Outro ponto crítico fica na esquina das ruas André de Barros e João Negrão – próxima ao terminal Guadalupe -, que ocupa o segundo lugar entre os cruzamentos mais multados da capital paranaense. Ao todo, foram registradas 8.842 multas esse ano no local.

Entre quem transita pelo perímetro com velocidade limitada a 40 km/h, as opiniões se dividem. “É interessante para o pedestre e para o ciclista. A gente sente que o trânsito fica mais seguro e vê menos acidentes”, pondera o taxista Nelson Chami, 76. “Acho o projeto válido. As pessoas precisam entender que a via não foi feita somente para os carros”, concorda a vendedora Helen Silva. Já para o taxista Virmond Domingos, o limite não é “nada prático”. “Quem precisa cruzar o centro é obrigado a ir devagar e sofre com a lentidão”, considera.

Radar da Rua Luiz Leão é o campeão de multas. Foto: Felipe Rosa
Radar da Rua Luiz Leão é o campeão de multas. Foto: Felipe Rosa

Novo limite?

Mas afinal, o que torna tão difícil para o motorista respeitar o limite de velocidade da Área Calma? De acordo com o engenheiro civil Valter Fanini, especialista em transporte urbano, o motivo disso é o condicionamento dos próprios condutores e a falta de atenção aos limites reduzidos do trecho. “Acostumado a trafegar a 60 km/h, o motorista acaba ficando ‘no automático’ e, por falta de atenção, não percebe que manteve a mesma velocidade no trecho de 40 km/h”, explica.

De acordo com Valter, o limite de velocidade estabelecido na Área Calma – ao contrário do que muitos pensam – não deixa o tempo de percurso mais longo. “Todo mundo acha que trafegar a 40 km/h faz com que o trânsito fique engarrafado, quando na verdade não é isso. O que determina o tempo em trânsito é a sincronia de semáforos e o volume de veículos”, afirma.

Implementado no último ano da gestão Gustavo Fruet, o projeto da Área Calma tinha como principal objetivo, num primeiro momento, diminuir o número de acidentes de trânsito no perímetro central da cidade, aí incluídas colisões de maior gravidade e atropelamentos. Em segundo lugar, a implementação do trecho de tráfego acalmado, aos poucos, abriria mais espaço para o trânsito de modais não poluentes e incentivaria a maior circulação de pedestres na região central.

Diferente do que muitos imaginam, o projeto da Área Calma não se resume apenas em um trecho limitado por radares e ciclofaixas, mas em um projeto de reestruturação urbana e humanização do centro histórico da cidade, de acordo com dados divulgados no Caderno da Área Calma, elaborado pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc).

Limite da Área Calma está sendo revisto. Foto: Felipe Rosa
Limite da Área Calma está sendo revisto. Foto: Felipe Rosa

Menos acidentes

A exemplo de programas semelhantes aplicados em países como Holanda, Canadá e Austrália, o número de acidentes na capital diminuiu cerca de 40% após a limitação do limite de velocidade para 40 km/h no anel central. Diante das constantes reclamações em relação ao trecho, principalmente no que diz respeito ao volume de multas registradas, a atual gestão estuda aumentar o limite de velocidade na Área Calma para 50 km/h.

Procurada pela Tribuna do Paraná, a Secretaria Municipal de Trânsito (Setran) confirmou que o pedido formal para estudo da circulação viária da cidade já foi solicitado pelo prefeito Rafael Greca (PMN). A análise levará em conta as possibilidades e necessidades de alterar os padrões de velocidade e fiscalização atualmente adotados em Curitiba. Em tese, a medida atenderia à demanda imediata de uma parcela da população, porém de acordo com Valter, a alteração apenas confunde o tráfego. ”Não faz sentido subir o limite, de 40 para 50 km/h. Fica a mesma coisa, e pior, confunde o motorista, que nunca vai saber qual a velocidade correta das vias”, finaliza.

Prefeitura estuda rever limite de velocidade no trecho. Foto: Felipe Rosa
Prefeitura estuda rever limite de velocidade no trecho. Foto: Felipe Rosa

Cruzamentos campeões de multas por radar

1. Luiz Leão, esq. João Gualberto (sentido Centro Civico) – 9.833
2. André de Barros x João Negrão – 8.842
3. Inácio Lustosa x João Manoel – 6.579
4. Marechal Floriano x João Viana Seiler (sentido bairro) – 5.365
5. BR 476 (Linha Verde) – continuação Wenceslau Braz – 5.328
6. Marechal Floriano x Marechal Deodoro – 4.523
7. Mariano Torres (pista esquerda) x Marechal Deodoro – 4.340
8. Luiz Leão, esq. João Gualberto (sentido Círculo Militar) – 3.975
9. Rua Octávio Saldanha Mazza, próximo ao número, 8038 – 3.686
10. Mariano Torres (pista direita) x Marechal Deodoro – 3.584
11. Marechal Floriano x João Viana Seiler (sentido centro) – 3.558
12. João Manoel x Inácio Lustosa – 3.484
13. Av. Comendador Franco, próximo à Salgado Filho (sentido bairro) – 3.483
14. Getulio Vargas, próximo ao número 4369 – 3.267
15. Rua Tibagi x Benjamin Constant – 2.381

Fonte: Secretaria Municipal de Trânsito (Setran)

Sobre o autor

Maria Luiza Piccoli

(41) 9683-9504