Por Fernanda Makino
Depois de ser baleado durante um assalto em Curitiba, em 2004, Anderson Kaiss perdeu os movimentos das pernas e dos braços. O que ele não esperava, nove anos após o ocorrido, era se tornar um atleta profissional de rúgbi em cadeira de rodas. O que começou apenas como uma nova etapa na pós-reabilitação levou de Anderson à seleção brasileira, junto com outros quatro atletas paranaenses.
“Eu já praticava esgrima, mas abandonei para investir no rúgbi. Me identifiquei de imediato por ser um esporte bacana e de impacto. Muita coisa mudou depois disso, pois tive a oportunidade de conviver com outras culturas e deu uma elevada na minha auto estima”, relata o atacante. Na Paralimpíada Rio 2016, a seleção de Anderson não conquistou medalha, mas o jogador afirma que o time conseguiu conquistar o objetivo. “Tivemos que jogar com seleções de países que já tem o esporte como tradição há 20 anos, mas conseguimos fazer disputas bem jogadas e forçar os outros times a utilizarem os titulares na maior parte do tempo”, comemora.
Incentivo
Assim como Anderson, outros 20 atletas encontraram motivação no esporte por meio do trabalho da ONG Saúde Esporte Sociedade Esportiva. A instituição começou a trabalhar com a modalidade em 2011, quando as cinco primeiras cadeiras foram adquiridas. Desse projeto, surgiram dois times paranaenses: o Titans Colombo Quad Rugby, atualmente na segunda divisão, voltado para atletas com lesão recente; e Gladiadores Curitiba Quad Rugby, da primeira divisão, com jogadores de alto rendimento sendo cinco deles entre os 12 da seleção brasileira.
As primeiras conquistas vieram em pouco tempo. A equipe coordenada por Carlos Kamarowski Junior subiu rapidamente para a primeira divisão e, em 2013, se tornou campeã brasileira, além de ter ocupado a vice-liderança no ano seguinte.
Entre outras conquistas,cinco curitibanos do projeto participaram pela seleção de um campeonato no ano passado em Toronto, no Canadá; outros três jogaram na Rio 2016; os Gladiadores foram campeões invictos, há poucos dias, da Taça Internacional de Clubes da Colômbia; daqui a duas semanas dois atletas paranaenses vão com a seleção para a Áustria, assim como a médica da instituição, Karyna Lucena; e ainda há mais duas competições brasileiras para o resto do ano.
Custos muito altos
Chegar ao patamar atual de equipe campeã não foi nada fácil. O projeto do rúgbi em cadeira de rodas se mantém com uma verba anual da Secretaria de Esporte e Lazer, Lei de Incentivo ao Esporte e empresas particulares para pagar também professores, fisioterapeuta e enfermeiros. As cadeiras utilizadas atualmente pela ONG custam quase R$ 7 mil, mas os jogadores da seleção utilizam uma importada, ao custo de R$ 25 mil cada. A divulgação é por meio do site (saudeesporte.com.br) e boca a boca, através de uma parceria com o Hospital de Reabilitação de Curitiba, onde os organizadores fazem uma palestra a cada três meses.
“No comecinho do projeto, encontramos os primeiros jogadores enquanto saíamos pela rua ou shoppings, buscando tetraplégicos que pudessem se interessar pelo esporte, mas em pouco tempo começamos a ser procurados quando as pessoas têm alta do hospital ou é indicada para fazer conosco a pós-reabilitação”, conta o coordenador Carlos Kamarowski.
E foi assim que o atacante do Titans, Ricardo Franchini, eleito o melhor atleta de ataque pela 2ª Copa Bebedouro de Rugby em Cadeira de Rodas, conheceu o esporte. Ele sofreu uma fratura na cervical após um mergulho malsucedido em uma praia no dia 25 de dezembro de 2012. “Eu nunca tinha ouvido falar sobre o esporte, mas meu fisioterapeuta me encaminhou para cá após seis meses de reabilitação e depois nem pensei em fazer outra modalidade. No primeiro omento você fica impressionado ao saber o que aconteceu com cada jogador e aprende muito com a dificuldade dos outros. O rúgbi serviu para mostrar para muita gente que a vida continua após a cadeira de rodas”.
Como funciona o jogo
O rúgbi é o único esporte paralímpico misto, onde podem jogar homens e mulheres nos mesmos times. Presos a uma cadeira toda blindada, os jogadores precisam cruzar a linha de gol adversária e marcar pontos, tudo em meio a jogadas que, na primeira impressão, parecem ser violentas. As cadeiras de rodas encantam o público com os choques, como de carrinhos
de bate-bate. O show também conta com atletas jogados ao chão e cadeiras voando com os impactos.
Cada jogador recebe uma pontuação de 0,5 a 3,5 de acordo com a capacidade motora, sendo que cada time pode somar até oito pontos em quadra somando os quatro jogadores. A regra é para que as equipes sejam equilibradas e o jogo seja justo para os dois lados. A bola utilizada é semelhante às de vôlei e as quadras são do tamanho das de basquete.