Vivendo há mais de 25 anos em uma situação amarrada, a população da Vila Araguaia, no Capão da Imbuia, ainda corre risco de despejo. Nova decisão judicial determina que três famílias sejam retiradas de suas residências, que pertencem ao espólio de Júlio Reginato.
Para o presidente da Associação de Moradores da Vila Araguaia, Anatólio Novaes, o juiz foi induzido a erro. “Essa reintegração está sendo feita em cima de uma vitória judicial que a família Reginato teve sobre uma indicação fiscal diferente da que as famílias vivem”, defende.
Mesmo com poucos recursos para lutar pelo direito de permanecer em sua própria casa, Anatólio conta com a orientação e ajuda do advogado Luiz Fernando no processo. De acordo com o advogado, a tática do espólio é utilizar uma ordem de despejo antiga para conseguir novas desocupações em diferentes indicações fiscais das que constam no documento. “Não existe segurança jurídica neste despejo, apenas há uma ardilosa tentativa de confundir o poder judiciário”, diz o defensor.
Ele explica que em 1992 Frederico Luis Reginato entrou com pedido de reintegração contra Iduilda de Souza e outros. Na época, a reintegração foi concedida parcialmente para uma área de 75 mil metros quadrados, localizada na Avenida Vitor Ferreira do Amaral. Mas o juiz não acolheu o pedido para outros 144 mil metros quadrados, onde estariam cerca de 580 famílias, entre elas as de Jacira Ferraz Rodrigues, José Camilo e Ademir dos Santos.
Mesmo assim, segundo Luiz, esse documento está sendo utilizado para pressionar os moradores a buscar um acordo com os proprietários. Quando a família não faz isso, Anatólio conta que o espólio pede a reintegração com base na decisão de 92. “O despejo é questionável mesmo para aquela Iduilda, presente no documento que eles utilizam. Imagina para quem nem sequer foi citado no pedido e mora em outra área”, comenta.
Usados pra promoção política
O imbróglio na região até já foi utilizado para promoção política. Anatólio lembra da promessa feita durante a campanha municipal que reelegeu o ex-prefeito Beto Richa. Na época, um dos materiais de campanha estampava a promessa da titulação dos terrenos aos moradores da Vila. Mesmo com a vitória, em 2011, a promessa se transformou na regularização do terreno para o espólio.
Em 2009 tramitou no Tribunal de Justiça ação em que o presidente da associação questionava a omissão da procuradoria geral do município em cobrar os 23 anos de IPTU atrasados em nome de Frederico Julio Reginato. O processo foi arquivado após a promotoria de justiça concluir que em 2001 e 2005 existiu dações em pagamento para quitar esse débito.
O questionamento rendeu um processo de danos morais que impunha uma multa de R$ 20 mil a Anatólio. O morador da vila se livrou da multa e venceu o processo movido pelo atual conselheiro do Tribunal de Contas Ivan Bonilha, que na época ocupava a cadeira de procurador do município. Atualmente o IPTU é enviado à casa dos moradores, entretanto a conta que chega para eles está com o nome de Reginato. Para Anatólio, é um insulto. “Eles apenas viram o bairro crescer e agora querem tomar tudo que foi construído pelos moradores”, diz.
Entenda o caso
O pesadelo dos moradores do Araguaia, região que até já foi reconhecida como Reginato 1 e 2, começou em meados da década de 80. Segundo as famílias que vivem na região, Mario Ribeiro iniciou a comercialização de terrenos dessa parte do Capão da Imbuia porque obteve em primeira instância o direito dessa área através do usucapião.
Isso já foi o suficiente para que Mario loteasse o terreno e iniciasse a ocupação dessa área, com um mínimo amparo legal. Porém, no inicio dos anos 90, o real proprietário, que viria a provar isso durante os anos seguintes, reapareceu, exigindo o reconhecimento de sua propriedade e a desocupação do terreno.
Desde lá, a vida dos proprietários e dos moradores tem sido um campo de batalhas judiciais, e inclusive físicas, como ocorreu durante o cumprimento de uma das reintegrações. Desde lá, pelo menos cinco moradores já enfartaram, inclusive Alceu, que após o ataque passou a ter que andar de cadeira de rodas e morreu no início do ano passado.
Moradores devem recorrer
Ele explica que nenhum morador foi notificado da reintegração porque eles são os autores da ação. “Durante o trâmite do processo dessa propriedade do Reginato alguns moradores entraram com um embargo de terceiro para esfriar o andamento. O importante é que já foi reconhecido o direito à propriedade para o espólio. Alguns moradores buscaram realizar um acordo, outros ainda não”, afirma.
Já para Luiz Fernando, defensor dos moradores, essa situação é uma reprise do caso da família do ex-zagueiro do Iraty Sport Clube Alceu Madureira, que teve que sair sua casa e retornou após três anos pagando aluguel. “Caso seja efetivamente concretizada a reintegração e as três famílias sejam despejadas, as famílias terão margem legal para conquistar novamente o direito a suas casas. Esses despejos apenas servem para constranger as pessoas, pois obviamente a Vila Araguaia não é um caso de invasão”.