Ao abrir a janela todas as manhãs, Eudália Vieira Cardia, 44 anos, se depara com um jardim repleto de girassóis e outras flores que colorem seu dia. “É tão lindo que eu até já fotografei e enviei as fotos para minha irmã que mora na Alemanha”, conta. No entanto, esse jardim não fica dentro de seus portões e nem é cultivado por ela. “Tudo foi feito por um senhor de 83 anos, que decidiu transformar um terreno público abandonado e cheio de lixo no bairro Cajuru em algo maravilhoso. É lindo o que ele faz e a maneira que ele cuida desse pedacinho de terra que pertence a todos”, afirma.
O responsável por esse jardim é Seu Misael de Oliveira Braz. Aposentado há 17 anos, ele nasceu em um sítio na cidade de Joaquim Távora, município de 10 mil habitantes localizado no Norte Pioneiro Paranaense. Lá, cresceu ajudando seu pai a cultivar a terra, plantar e colher. “Trabalhei na lavoura dos meus pais até comprar minha própria chácara e começar a plantar feijão. Eu carregava sacos e sacos pra cima e pra baixo, e sempre gostei de trabalhar com a enxada”, recorda.
A situação ia muito bem e ele se tornou um comerciante conhecido na cidade. Porém, não imaginava que teria que enfrentar uma forte crise econômica nos anos 70. “A situação ficou tão difícil, que meu pai e minha mãe Conceição perderam tudo o que tinham e precisaram se mudar para Curitiba em 1980”, conta o filho Meujael de Oliveira Braz, primogênito do casal.
Aqui, eles começaram a vender frutas e verduras em uma Kombi, se estabilizaram financeiramente e conseguiram se aposentar. Só que a saúde não colaborou. “Descobri que eu estava com enfisema pulmonar leve e tive que começar a me tratar”, lembra Misael. Para piorar, Dona Conceição recebeu o diagnóstico de doença de chagas, cisticercose e ainda começou a ter dificuldades para caminhar. “Isso tudo foi muito difícil pra mim e eu quase fiquei louco”, recorda Misael, ao se referir a vários problemas emocionais que passou a ter.
Guinada na rotina
De acordo com seu filho, a situação começou há quatro anos e seguiu até o primeiro semestre deste ano, quando algo mudou no dia a dia do pai. “Ele começou a reparar em um terreno abandonado na esquina da Rua Alzira Neves Garês, que tinha mato com um metro de altura e acumulava muito lixo, então teve a ideia de fazer um jardim ali”.
A família apoiou a iniciativa e logo o trabalho começou. “Eu ia um pouquinho, aí ficava com falta de ar e voltava pra casa. Depois ia de novo e fui tirando todo o mato e o lixo”, conta Misael. Só que para preparar a terra e plantar as mudas era necessário investimento.
Por isso, os moradores da rua também decidiram apoiar “o velhinho da enxada”. “Eu e meu marido achamos maravilhoso o que ele estava fazendo, então ajudamos com vários sacos de adubo”, afirma a vizinha Eudália. Assim como ela, a equipe da creche localizada ao lado do terreno também colaborou, outros moradores doaram mudas e logo o jardim começou a tomar forma.
Fonte de inspiração
Ainda que a iniciativa colorisse o bairro e tivesse apoio de muitas pessoas, a ideia incomodou alguns. “Para fazer o jardim eu precisei fechar uma trilha que passava ali no meio. Então, quando coloquei a cerca, algumas pessoas começaram a reclamar porque tinham que dar a volta. Elas chamaram a prefeitura para acabar com o jardim e até fizeram um abaixo-assinado contra”, indigna-se Seu Misael.
No entanto, quando o fiscal da prefeitura e um vereador visitaram o local, eles somente elogiaram a iniciativa. “Até disseram que vão colocar o meio-fio pra nós. Então, vou aproveitar pra pedir uma tela ao redor e uma torneira com água. É só o que eu preciso porque a manutenção eu faço com prazer”, garante o aposentado.
Enquanto esses detalhes não são finalizados, ele continua o trabalho e garante que a atividade transformou sua saúde. “Hoje estou muito bem, os médicos apoiam o que eu faço e eu gosto do resultado”. Além disso, ele serve de inspiração para outras pessoas. “Pra mim, o Misael é um exemplo de vida porque decidiu cuidar do que era público, transformou completamente esse lugar e continua cuidando do jardim com muita alegria. Todos deveriam fazer o mesmo!”, finaliza o morador Edson Luiz de Lima.