Sabe aquele ditado que diz “o que a mão direita faz, a esquerda não precisa saber”? Pois foi exatamente dessa forma que os dois sócios do restaurante Anita, que fica na Avenida Anita Garibaldi, no Barrerinha, em Curitiba, fizeram por aproximadamente cinco anos, mas se viram obrigados a divulgar a ação social por medo de serem impedidos de continuar. Ao longo deste tempo todo, Sérgio e Elizângela sempre serviram, ao fim do expediente, comida a pessoas carentes e moradores de rua, mas incomodaram quem não aprova a ação.
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“Nós começamos por uma necessidade que minha sócia e eu temos em ajudar as pessoas. Sempre tivemos vontade e concluímos que não podíamos mais seguir se não fizéssemos alguma coisa, então surgiu a ideia de servirmos a comida que sobra do buffet para quem precisa, afinal de contas é uma comida que não pode ser reaproveitada no outro dia, por exemplo”, contou Sérgio Luis Todeschi, de 36 anos.
Ao longo de cinco anos, Sérgio e Elizângela, os responsáveis pelo restaurante, botaram em prática o que sonhavam: servem, todos os dias, após as 14h, comida a pessoas carentes. “Sempre que sai o último cliente, começamos a servir essas pessoas que acabamos chamando gentilmente de ‘nossos filhos’, pois são especiais pra gente”.
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Todos os dias, desde quando decidiram começar, o restaurante entrega de 30 a 40 refeições de graça, a maioria para pessoas que não teriam sequer condição de comer em outro lugar. “Destas pessoas, sabemos que pelo menos cinco são realmente moradores de rua, mas tem muita gente idosa, muitas pessoas que são só carentes, que não têm condições, que todos os dias buscam vir até o restaurante para garantir pelo menos uma refeição”, explicou Sérgio.
Ação incomodou
Durante todo este tempo, a ação social feita pelo restaurante Anita era da forma que os dois sócios entendiam que deveria ser: sem que ninguém soubesse. “Mas a presença dessas pessoas, por mais rápida que seja e que eles não incomodem ninguém, nem mesmo os clientes, que nunca reclamaram, passou a ser vista de forma negativa por algumas pessoas da vizinhança, que nos denunciaram porque estaríamos criando uma ‘cracolândia’ na região e isso não é verdade”.
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Temendo ter que parar com a boa ação, os dois sócios publicaram uma nota nas redes sociais do restaurante explicando a situação e garantindo que não iriam parar. “Não podemos garantir que todos nossos ‘filhos’ sejam de boa índole, porém, pelo o que conhecemos, eles estão querendo apenas um prato de comida e não formar uma cracolândia. Com tudo, pedimos desculpas se, por causa dessa nossa ação, geramos algum transtorno em seus pontos comercias, já avisamos a todos que quem tiver alcoolizado não ganhará mais comida, entretanto VAMOS CONTINUAR FIRMES E FORTES ajudando os mais necessitados da nossa região”, disseram os proprietários do Anita em sua página do Facebook.
Repercussão positiva
A divulgação do que faziam não era o que Sérgio e Elizângela queriam, pois sempre entregaram as refeições sem fazer propaganda disso a ninguém. “Mas nos vimos obrigados, porque não queremos parar com o nosso objetivo, que é de ajudar alguém e se tornou também o nosso principal foco”, disse o comerciante. Em contrapartida, a repercussão da nota postada nas redes sociais fez com que muita gente o apoiasse e o assunto ganhou repercussão.
“Teve realmente um retorno que não imaginávamos, atingindo mais de 600 mil pessoas só no Facebook, isso sem contar todos os veículos de comunicação que nos procuraram. Era algo que nunca buscamos divulgar, porque realmente não queríamos, mas ao mesmo tempo contar o que fazemos serviu para vermos o quanto estamos certos em seguir em frente”, comentou Sérgio, reforçando que a ideia do restaurante é continuar. “Até apoio da Fundação de Ação Social (FAS) nós tivemos, que está cadastrando as pessoas que recebem a doação, então não vamos parar. Se tiver que adequar de alguma maneira, faremos isso, mas vamos seguir”.
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Só fazer o bem
Para as pessoas que buscam a comida, o restaurante Anita é uma garantia de que pelo menos uma refeição vão comer no dia. O reciclador Alexandre Diogo de Oliveira, 43 anos, começou a frequentar o restaurante há quatro meses. “Moro em Almirante Tamandaré e tenho quatro filhos. Se eu tivesse que comprar comida enquanto estou trabalhando, faltaria dinheiro para dar alimento aos meus filhos, então eu só agradeço, porque se existisse mais pessoas iguais a eles o Brasil não estaria como está hoje. O que eles fazem não ofende ninguém, porque é uma boa ação”.
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Giovane Freitas, 49, perdeu a mãe, o pai e está afastado da família por causa da bebida. “Já trabalhei como fiscal de prevenção de perdas, mas como estou sem emprego e moro aqui perto, busco a marmita há mais de seis meses. Esse auxílio deles é muito bom. Quando eu tinha dinheiro, passava e via todo mundo almoçando, hoje em dia eu recebo ajuda deles. Converso com as pessoas e saio um pouco da situação que enfrento”.
Acompanhada do marido, a idosa Alzira Ferreira Martins, de 66 anos, foi pela primeira vez buscar comida quando a reportagem da Tribuna esteve no restaurante. Com um sorriso no rosto, a mulher disse que a situação em casa está difícil e, por isso, resolveu pedir ajuda. “Isso faz a diferença para o pessoal. Ganhamos pouco e não temos condições de pagar as contas. Como moramos perto, resolvemos vir buscar a marmita”, comentou Alzira, que mora com quatro pessoas em casa.
Muito além da comida
Com tamanha repercussão positiva, o restaurante ganhou não só mais apoio dos oito funcionários que emprega, mas também de tanta gente que sequer sabia da existência da ação social que é feita ali. Entre os funcionários do restaurante, dois deles se destacam, entre eles Elcio Krita Gomuiski, de 34 anos, que já foi uma destas pessoas que recebiam o almoço. “Passei um ano pegando comida e digo que eles me ajudaram não só a sair de onde estava, como também me deram uma nova visão de vida”.
Elcio, que é conhecido como ‘Polaco’, tinha problemas com o álcool e recebeu o incentivo de fazer um tratamento. “Quando saí do tratamento, que durou nove meses, eles me chamaram para trabalhar com eles e hoje cuido do estacionamento e também de receber os produtos para o estoque. Minha vida foi ‘do vinho, para a água’ e não é brincadeira. Me deram uma oportunidade que nem eu imaginei que um dia teria”.
Além de Elcio, que já trabalha no restaurante há seis meses, Adriano Mikosz, de 43 anos, é um funcionário que tem duas missões importantes: a de servir as refeições às pessoas carentes e, todos os anos, há 26 anos, interpreta Jesus Cristo. “Fazemos a representação da Paixão de Cristo na Barreirinha e até me emociona parar para pensar o quanto o que é feito aqui no restaurante tem a ver com o que Jesus fazia em sua vida”.
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Adriano, que todos os anos deixa o cabelo e a barba crescerem, disse que ver as pessoas receberem os pratos de comida é o que lhe motiva a apoiar que seus chefes continuem. “Estou aqui há seis anos e desde quando comecei a trabalhar eles fazem essa ação. Acho que as pessoas que reclamam deveriam, pelo menos, olhar para si mesmas. O respeito é a base de tudo e o que nós temos aqui, por essas pessoas que buscam comida todos os dias, é isso”.
Emocionado, Sérgio, o proprietário do restaurante, concluiu à reportagem que entende o que ele e sua sócia fazem como uma missão. A força disso, para eles, se faz tão importante que já entendeu os sinais de que não deve parar. “Dias atrás vieram 36 pessoas e nós só tínhamos comida para 30. Resolvi entregar a comida que eu tinha separado para mim, mas ainda assim faltaria. Acabou que encontramos no microondas uma bacia de arroz que não sabemos até hoje de onde surgiu, mas foi o que tornou possível entregarmos comida a todo mundo. Entendi isso como um sinal de Deus, me mostrando que eu devo continuar”.
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