Na década de 90, quando Douglas Silva, 26 anos, descobriu o HIV, ainda pouco se sabia em como lidar com a doença. Por causa disto, Douglas foi afastado do seio da família aos cinco anos, quando descobriu o vírus no seu sangue, transmitido de forma congênita, pela mãe, que provavelmente também não sabia que era portadora do HIV.
Douglas é coordenador da Associação Fênix, no Alto da Glória, em Curitiba, que lida com pessoas em situação de vulnerabilidade, inclusive portadores de HIV/Aids. Foi através de seu irmão, que vivia sempre muito doente, que descobriram o HIV. Assim, os médicos realizaram exames na família toda e descobriram que Douglas e a mãe também eram soropositivos.
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“Na época, não havia certos exames de pré-natal, muitas crianças nasciam com o HIV. Não sabiam que essas crianças iam sobreviver. Então eu e meu irmão fomos retirados de casa, isolados da família, para não transmitir o vírus a ninguém. Hoje sabe-se que não é bem assim, que pode-se beijar, abraçar, levar uma vida normal. Mas isso me afastou da família”, lamenta o jovem.
Adolescência
Depois de anos num abrigo para crianças, Douglas e o irmão foram encaminhados a outro abrigo, próprio para crianças portadoras de HIV. “Só aí fui entender a doença, o que ela fazia no meu corpo, porque eu tinha que tomar o medicamento todos os dias. Eu já estava na adolescência e comecei a me questionar por que eu tinha que ir ao médico duas a três vezes no mês”, conta Douglas.
Nessa época, ele parou de tomar o medicamento com dosagem infantil e começou com o de adulto. Em algumas pessoas, a nova dosagem causa a perda de gordura das bochechas (em outras aumenta), o que o deixava com o rosto muito “chupado”. Os colegas da escola não sabiam da condição de Douglas e o chamavam de “recaveira”. Todos estes questionamentos, a revolta com o apelido, a falta da família, misturados aos hormônios da adolescência fizeram o rapaz parar de tomar o remédio. Assim, o vírus foi atacando o sistema imunológico de Douglas, que formou um quadro de Aids, ou seja, seu corpo ficou tão fraco que ele desenvolveu outras doenças.
Vida nova depois do ‘furacão‘
Douglas conseguiu curar-se e, com a ajuda de psicólogos, entendeu a importância de continuar usando o medicamento de controle do HIV. O “inferno” que Douglas viveu fez ele entender que tinha uma missão: a de ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade, inclusive os portadores de HIV/Aids, e hoje desenvolve um trabalho muito valioso à frente da Associação Fênix.
Apesar de muitas doenças sexualmente transmissíveis serem transmitidas pela negligência no uso da camisinha, Douglas entendeu quem nem sempre se deve colocar a culpa na pessoa que foi infectada. “Ter HIV acarreta uma situação de culpa. Ao descobrir o vírus, a pessoa se coloca uma sentença de morte. Mas colocar culpa em cima de si mesmo é errado. Temos que questionar a educação que esta pessoa recebeu. Os pais orientaram? A escola também ensinou? Onde estavam estas pessoas? Onde falharam na educação desde adolescente, que o levou a ter uma relação desprotegida?”, questiona o coordenador da Fênix.
Douglas incentiva todos que tiveram relações desprotegidas a fazerem sempre as testagens das DST, disponíveis na maioria das unidades de saúde.
Síndrome do Superhomem
“Foi uma vez só, não vai acontecer nada comigo”, “É que nem chupar bala com o papel”, “Se eu usar, o negócio não vai funcionar”, “Eu sou macho, me jogo ao risco de vez em quando, não pego nada”, “Preciso provar que eu o amo, por isso farei sem camisinha”. Esse é o comportamento típico de candidatos a adquirirem uma Doença Sexualmente Transmissível (DST), como a HIV/Aids, sífilis, gonorreia, supergonorreia, HPV, hepatite e muitas outras.
Algumas destas doenças estão preocupando as autoridades, como a sífilis, que deu um salto exponencial na quantidade de pessoas infectadas, nos últimos cinco anos, ou a supergonorreia, que ainda não tem medicamento que cure. Felizmente a supergonorreia ainda não chegou ao Brasil. Já a gonorreia teve 545 casos detectados em Curitiba no ano passado. Estima-se que, diariamente, pouco mais de um milhão de pessoas adquiram alguma doença sexualmente transmissível no mundo. Ao ano, a estimativa é de 500 milhões de infectados.
Sífilis
Em Curitiba, foram detectadas 2.323 pessoas infectadas com sífilis em 2016. Um aumento de aproximadamente 440% em relação a 2010, quando a capital registrou 527 casos. Na capital, a sífilis matou cinco pessoas e gerou 54 abortos e 27 casos de natimortos (bebês nascidos mortos), de 2010 a julho deste ano.
No Paraná, o aumento de casos de sífilis foi de 1.600% nos últimos sete anos: de 508 para 8.180 casos. A epidemia da doença não é exclusividade do Paraná ou do Brasil, explica Alcides de Oliveira, diretor do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba. O surto ocorreu no mundo todo, por falta de um cuidado muito básico da população: não houve prevenção. Seja por falta de informação ou educação, desleixo ou algum preceito religioso ou cultural, faltou camisinha nas relações. E a sífilis não ocorre somente nas classes mais baixas ou grupos de riscos. Ela foi detectada em todas as camadas sociais.
HIV/Aids
O boletim epidemiológico mais recente da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) aponta o crescimento dos casos de HIV/Aids na capital paranaense, nos últimos cinco anos: de 736, em 2010, para 1.199 em 2015, ou seja, mais de três casos diagnosticados por dia. De 1984 a 2015, foram contabilizados 11.078 casos em homens (70%) e 4.831 casos em mulheres (30%). De 2010 a 2015, houve um aumento exponencial de contaminações na faixa dos 20 ao 29 anos de idade. O relatório também aponta que o grupo de homens homossexuais é o de maior incidência da doença.
Contaminação
Francisco dos Santos, coordenador da Divisão de Doenças Sexualmente Transmissíveis, da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) do Paraná, explica que não é somente pela relação sexual, com contato entre pênis, vagina e ânus que se adquire uma DST. O sexo oral também pode acarretar em contaminações. Ou o simples fato de passar a mão nas partes íntimas de uma pessoa infectada, e depois passar esta mão em seu olho ou boca, já pode ocorrer uma infecção por sífilis ou gonorreia, por exemplo.
Diferenças das DSTs
Gonorreia
Ela pode ser confundida com uma infecção urinária pois, igualmente, também causa ardência no canal da uretra e vontade de ir ao banheiro muitas vezes, para fazer pouco xixi. A diferença é que, na gonorreia, tanto a vagina quanto o pênis expelem pus, geralmente bem amarelado e com cheiro ruim e forte. A doença tem cura, utilizando-se antibióticos. Uma vez tratada, a pessoa está curada. A exceção é a supergonorreia, cuja bactéria é superresistente. A indústria farmacêutica ainda não encontrou antibiótico capaz de matá-la.
HIV
É preciso esclarecer a diferença de HIV e Aids. Portador de HIV é a pessoa que possui o vírus no sangue, mas a doença não se manifestou. É necessário que a pessoa tome o medicamento específico para o resto da vida, para que a doença não se manifeste. Caso contrário, o vírus passa a destruir as células de defesa do organismo. Sem imunidade, a pessoa fica suscetível a outras doenças, que podem matar o paciente. Esse é o quadro de Aids. É possível curar-se do quadro de Aids, mas não eliminar o vírus do organismo. Tomando os medicamentos corretamente, é possível conviver com o HIV até a velhice, com qualidade de vida.
Sífilis
A doença causa uma pequena feridinha indolor (às vezes incomoda) na vagina ou no pênis. Em duas semanas, ela some e a pessoa nem vai ao médico. O problema é que, se não tratada, a ferida vem maior. Em casos severos, causa enormes lesões em órgãos internos, pés, mãos e boca, é difícil de tratar e, conforme o tamanho da lesão e de qual órgão atingiu, pode levar a óbito. Nas crianças, a sífilis traz várias complicações e ela precisa ser acompanhada praticamente por quase todas as especialidades médicas. A sífilis congênita, transmitida da gestante para o bebê, causa na criança dezenas de complicações (cardíacas, ortopédicas, neurológicas, deficiências renais, hepáticas, mentais, além de surdez e cegueira). Ela pode até nascer acéfala. Mas boa parte dos casos de sífilis, detectados cedo (por isso a importância das testagens constantes) tem cura, que é feita com aplicações de penicilina.
HPV
HPV é um vírus que atinge a pele e as mucosas, podendo causar verrugas ou lesões precursoras de câncer (colo de útero, garganta ou ânus). É transmitido no contato pele com pele (98% através de relações sexuais). Existem 200 tipos de HPV. Eles podem causar lesões e verrugas em diferentes partes do corpo (principalmente nas partes genitais), mas apenas 14 tipos podem evoluir para um câncer. Estima-se que cerca de 80 a 90% da população já tenha tido contato com o vírus HPV alguma vez na vida, mesmo que não tenha manifestado nenhuma lesão. Não há cura para o HPV, mas em cerca de 90% dos casos, o organismo elimina naturalmente o vírus. O que se trata são os sintomas, ou seja, as lesões ou verrugas. Existem vacinas, capazes de imunizar contra alguns tipos mais comuns. Mas a forma mais eficaz de se proteger é usando a camisinha (seja para o sexo vaginal ou anal) e evitando o sexo oral.